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Publicado em O Estado de S. Paulo, 13/04/1999

Salário-Maternidade

Pela Portaria 4.883/98 do Ministério da Previdência Social, os empregadores estão obrigados a pagar o que exceder a R$ 1.200,00 dos salários das mulheres durante a licença-maternidade. Ou seja, uma funcionária que ganha R$ 2.000,00 por mês, recebe R$ 1.200,00 da Previdência Social e R$ 800,00 do seu empregador.

O tema suscitou fortes debates. O próprio Supremo Tribunal Federal está sendo provocado a declarar a inconstitucionalidade daquela Portaria. De que forma esse tema é tratado no resto do mundo?

Em praticamente todas as nações de expressão econômica, há leis que obrigam as empresas a conceder às mulheres, e às vezes também aos homens, um período de licença por ocasião do nascimento de um filho.

Os Estados Unidos e a Nova Zelândia constituem duas exceções nesse campo. Pela lei, as americanas que trabalham em empresas com mais de 50 empregados dispõem de 12 semanas de licença e as neozelandesas, 14 – mas, nos dois casos, o afastamento é não-remunerado.

Entretanto, os países variam bastante em relação à extensão da licença, proporção do salário pago e fonte pagadora (Ver Quadro).

Licença Maternidade em Países Selecionados

Países
Licença em Semanas
Salário Pago
Fonte Pagadora

Alemanha

14

100%

Seg.Social/Empregador

Argentina

13

60%

Seguridade Social

Áustria

16

Salário Médio do Ano

Seguridade Social

Bélgica

15

82%

Seguridade Social

Brasil

16

100%

Seguridade Social

Canadá

17

57% para 15 semanas

Seguro Desemprego

Chile

18

100%

Seguridade Social

Colômbia

12

100%

Seguridade Social

Cuba

18

100%

Seguridade Social

Espanha

16

75%

Seguridade Social

Estados Unidos

12

0%

----

Finlândia

15

80%

Seguridade Social

França

16

84%

Seguridade Social

Holanda

16

100%

Seguridade Social

Israel

12

75%

Seguridade Social

Itália

14

80%

Seguridade Social

Japão

14

60%

Seguridade Social

México

12

100%

Seguridade Social

Noruega

18

100%

Seg.Social/Empregador

Nova Zelândia

14

0%

-----

Paraguai

12

50%

Seguridade Social

Portugal

12

100%

Seguridade Social

Uruguai

12

100%

Seguridade Social

Fonte: United Nations, The World's Women: Trends and Statistics, New York, 1995.

1. Os 120 dias previstos na Constituição Federal (16 semanas), colocam a mulher brasileira em boa posição no cenário mundial. Na lista dos 23 casos selecionados, o Brasil está acima de 14 países; está em igualdade com 5 outros; e abaixo de 4. O Brasil está acima também da Convenção 95 da OIT que prescreve 12 semanas (OIT, Trabajo y Maternidad, 1998).

2. O pagamento 100% do salário, da mesma maneira, posiciona o Brasil acima de 13, entre os 23 países listados. Há 10 casos de remuneração inferior a 100%.

3. Quanto à fonte pagadora, dos 21 países que remuneram a licença-maternidade, 19 o fazem através da seguridade social (previdência, saúde ou seguro-desemprego). Em apenas 2 casos, essa responsabilidade é rateada com os empregadores - que pagam menos à seguridade.

Há nações em que a seguridade social é inexistente ou atrofiada, nas quais a licença-maternidade é paga, em bases variadas, pelos empregadores que, é claro, não têm nenhum encargo previdenciário nesse campo. Estão nesse caso o Afganistão, Bagladesh, Cambodja, Indonésia, Jordânia, Kwait, Malásia, Nepal, Quatar, Arábia Saudita, Cingapura, Sri Lanka e Tailândia.

O Brasil segue o modelo dos países que possuem sistemas previdenciários consolidados. Orienta-se ainda pelas Convenções 3 e 103 da OIT que atribuem ao Estado a responsabilidade por aquele pagamento.

Como se vê, a Portaria 4.883/98 destoa de importante parcela do mundo e da própria lógica da seguridade social. Sim porque, em última análise, quem paga efetivamente o salário das mulheres licenciadas são os empregados e empregadores que, afinal, durante anos a fio, contribuem para os cofres da seguridade social.

A pesquisa comparativa mostra que, em nenhum país do mundo, o empregador é obrigado a pagar novamente o que já pagou à seguridade social para a licença maternidade.

é difícil acreditar que os parlamentares que aprovaram a Emenda Constitucional no. 20 (que reformou a previdência social) tenham desejado adicionar tamanho fardo na longa lista de encargos trabalhistas e previdenciários que gravam as empresas brasileiras, comprometendo a sua competitividade e capacidade de empregar.

O assunto, como se vê, ultrapassa as fronteiras da ciência jurídica. Ele tem profundas conseqüências econômicas e sociais. Em lugar de ajudar, um dispositivo como esse, contribuirá para aumentar as demissões, dificultar as admissões, e acentuar o achatamento salarial das mulheres. é disso que elas precisam?