Publicado no Jornal da Tarde, 23/02/00
Salário mínimo: Cr$ 4.639.800,00
José Pastore
Não se espante. Esse foi o valor do salário mínimo no Brasil em Julho de 1993: quatro milhões, seiscentos e trinta e nove mil e oitocentos cruzeiros.
É difícil acreditar que isso aconteceu há menos de sete anos. Um número fenomenal e que, ao mesmo tempo, indicava o apodrecimento da nossa moeda. O poder de compra dos salários chegou a variar diariamente. Triste memória.
Com o advindo do real, muita coisa melhorou. Mas não se pode dizer que R$ 136,00 seja um salário mínimo decente. Ao contrário, é uma das piores remunerações da América Latina. No Uruguai, o salário mínimo eqüivale a US$ 110; na Argentina, US$ 200; no Paraguai, US$ 212. No Brasil, não chega a US$ 77 (US$ 1.00 = R$ 177,00). Mesmo subindo para o equivalente a US$ 100.00, ainda assim, permaneceremos na rabeira do Mercosul.
A elevação do salário mínimo para R$ 177,00 destoa da intenção do governo que planeja chegar a, no máximo, a R$ 146,00 (7,35% sobre o atual). Trata-se de uma diferença de R$ 31,00. Uma quantia irrisória para acalentar tanto debate. É o preço do "couvert" que dois parlamentares pagam nos restaurantes de Brasília onde tratam do salário mínimo.
É doído viver em um País que não consegue pagar R$ 31,00 a mais para quem ganha tão pouco. Mas, qual é o problema real? Afinal, no setor privado formal há apenas 853.000 trabalhadores que ganham um salário mínimo.
O problema crônico e grave está no setor público. A previdência social paga salário mínimo para 14 milhões de aposentados e pensionistas. Uma elevação do salário para R$ 177,00 acrescentaria cerca de R$ 7 bilhões ao rombo atual da previdência, que já ultrapassou a casa dos R$ 8 bilhões.
R$ 15 bilhões comprometeria severamente o equilíbrio das finanças públicas; aumentaria o déficit da União; forçaria o governo a tomar mais dinheiro emprestado; provocaria a elevação dos juros; inibiria os investimentos; e dificultaria a geração de empregos – agravando, assim, a situação dos trabalhadores. O fardo sempre recai sobre os seus ombros. Por isso, não se pode aumentar o seu salário mínimo.
É revoltante a idéia de se garantir o equilíbrio das contas públicas com o sacrifício de quem ganha uns míseros R$ 136,00. Revoltante e inaceitável!
E por que é assim? Simplesmente, porque os mesmos parlamentares que agora jogam para a platéia, não fazem as reformas que precisam ser feitas – tributária, previdenciária, trabalhista. Simplesmente, porque diante de tanta urgência para melhorar o social, os parlamentares aprovaram menos de um quarto dos projetos que deveriam ter aprovado durante a convocação extraordinária que se encerrou dia 14 de fevereiro. Simplesmente porque, terminada a convocação, eles desapareceram de Brasília, em lugar de iniciar imediatamente o novo legislativo que começou dia 15 de fevereiro. Simplesmente porque eles só voltarão a trabalhar – três dias por semana apenas - depois do Carnaval.
Essas são as razões reais do porque somos obrigado a assistir a presente tripudiação em cima dos mais pobres – tripudiação essa que parece ser de grande utilidade para políticos demagogos que usam uma causa justa para encobrir sua conduta injusta.
Ora, vamos resolver esse problema de uma vez por todas. Este País tem tudo para se transformar numa grande usina de empregos, e pagar um salário mínimo de US$ 300, US$ 400 ou US$ 500 em pouco tempo. É para isso que servirão as reformas constitucionais. É para isso que elegemos e pagamos os parlamentares. Está na hora deles atacarem as causas do problema e não de se aproveitar das feridas do doente. A gravidade do quadro social exige um trabalho intensivo do Congresso Nacional, juntamente com os demais Poderes, durante 365 dias do ano. Chega de demagogia.
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