Publicado no Jornal da Tarde, 19/04/00
Salário mínimo baiano
José Pastore
O Brasil nasceu na Bahia. Isso dá aos baianos um legítimo sentimento de orgulho nacional. Os baianos são falantes, entusiasmados, extrovertidos. Dizem que baiano não nasce, estréia...
Foi com base nesses traços que a Bahia saiu na frente na questão do salário mínimo. O Governador César Borges acaba de sancionar uma lei aprovada pela Assembléia Legislativa que fixa o valor do salário mínimo para o Estado da Bahia em R$ 180,00, valendo a partir do dia 3 de abril, para os setores público e privado.
Está aí um primeiro resultado da confusão instigada pelo Governo Federal quando lançou a idéia de, através de uma Lei Complementar, passar para os estados a competência de fixar pisos salariais estaduais.
A Bahia foi mais longe e decidiu fixar um salário mínimo estadual, afrontando a Constituição Federal, segundo a qual o salário mínimo é nacional e unificado, ou seja, um valor único para todo o Brasil, inclusive, a Bahia.
É claro que a medida vai suscitar as mais acaloradas controvérsias jurídicas e pode ser anulada pelo STF.
Ao propor a criação de pisos estaduais, o governo federal, no meu entender, não chegou a avaliar a desorganização que isso gera no mercado de trabalho. Veja o caso do Rio. O Governador Anthony Garotinho anunciou, no início de abril, que iria propor R$ 400,00 como o valor do piso salarial para aquele Estado.
Sua principal providência foi a de instalar uma comissão mista de representantes dos setores público e privado para "sancionar" esse valor ou propor outro. Na primeira reunião, os empresários do comércio informaram que os pisos salariais do setor são negociados com base na realidade de cada município. Por isso, variam bastante, de R$ 148,00 (noroeste fluminense) a R$ 234,00 (Petrópolis).
Há alguns poucos municípios nos quais não há piso negociado e para os quais o Estado fixaria um valor. Mas, diante de tal variação, a comissão não soube o que propor.
O Governador, embaraçado, decidiu limitar os R$ 400,00 aos servidores públicos. Mas, os representantes das prefeituras mostraram que a variação entre os municípios é igualmente grande e que pouquíssimos prefeitos têm condições de pagar aquele valor como piso.
O caso é aqui relatado para ilustrar a dificuldade de se fixar pisos salariais por lei. Esse é um assunto de negociação, e não de legislação.
É interessante verificar que são os Estados do nordeste que acenam com aumentos substanciais no valor dos pisos estaduais – a Governadora Roseane Sarney promete R$ 200,00 – quando se sabe que cerca de 37% dos servidores municipais daquela região recebem salários iguais ou inferiores ao salário mínimo. No Maranhão, essa proporção supera os 40%. O mesmo ocorre no Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte e Paraíba – enquanto que no sudeste, a proporção é de 2%.
Portanto, a elevação do piso estadual (ou salário mínimo) para um valor muito superior aos R$ 151,00, ocasionará um forte impacto nas finanças públicas e agravará ainda mais o problema da informalidade no mercado de trabalho que, no nordeste, já é enorme.
Talvez tenha sido a Bahia, o Estado escalado por Deus, nestes dias de comemoração do descobrimento, para dar ao Brasil a fórmula mágica para se contornar esses problemas. Oxalá, assim seja. Mas volto a insistir, piso de categoria profissional é matéria de negociação e salário mínimo é matéria de legislação federal.
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