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Publicado em O Estado de S. Paulo, 01/05/2007.

1º de maio: o que está faltando?

Com o avanço das tecnologias e com a globalização dos negócios e do próprio mercado de trabalho, tornou-se mais fácil fazer crescer o PIB do que expandir o emprego.

Muitos falam na agonia do emprego. Outros antecipam a sua morte. São expressões fortes que provocam uma profunda angústia. No entanto, são propaladas com uma inusitada frieza.

É verdade que os tempos mudaram. Há 50 anos, predominavam empresas gigantescas, verticalizadas e que abrigavam dezenas de milhares de empregados.

Hoje, as movas tecnologias permitem às unidades menores produzirem com eficiência e de forma descentralizada. Em torno das empresas, circulam como satélites, outras empresas e profissionais de todos os tipos.

Muitas das atuais formas de trabalhar eram inexistentes há 50 anos – os autônomos, os prestadores de serviços na condição de pessoa jurídica (PJs), os associados de uma cooperativa de trabalho, os que executam projetos, os que trabalham à distância (tele-trabalhadores) e tantas outras.

A produção de hoje é realizada por uma constelação de empresas e profissionais muito bem articulados entre si e que formam redes de colaboradores. São as redes – e não as empresas – que competem no mercado. Vence a melhor rede.

Nessa nova divisão do trabalho, não se pode querer enquadrar todos os trabalhadores como empregados. Já foi o tempo em que o mundo do trabalho se dividia entre empregados e empregadores. Hoje, as novas modalidades de trabalho crescem numa velocidade meteórica. Infelizmente, para tais modalidades não há proteções porque a nossa CLT protege apenas os empregados.

A Constituição Federal, no seu artigo 7º pretende proteger a todos ao dizer: "São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais..." – ao que segue uma lista de 34 incisos (direitos). A CLT, com seus 922 artigos, é mais realista e promete proteção apenas aos empregados.

No frigir dos ovos, a Constituição e a CLT acabam protegendo uma minoria (35 milhões de empregados) e desprotegendo a maioria (46,5 milhões de trabalhadores) que estão no mercado informal. A informalidade tornou-se sistêmica.

Embora a Constituição Federal se refira a trabalhadores (como gênero), como aplicar os direitos trabalhistas aos trabalhadores que não têm vínculo empregatício? Como garantir o FGTS para quem trabalha por conta própria e não tem empregador? Como cumprir a jornada de 44 horas por semana por quem não tem patrão?

A velha CLT, que foi feita para proteger os empregados, deveria se chamar Consolidação das Leis do Emprego - CLE. É por isso que se vê essa confusão em torno dos PJs, da Emenda 3, das cooperativas de trabalho, dos que trabalham para várias pessoas – todos sem vínculo empregatício.

Longe de mim advogar a elaboração de um cipoal tão complexo quanto a CLT para o caso do trabalho sem vínculo empregatício. Mas, parece urgente estabelecer-se de modo claro que esses dois mundos – o do emprego e o do trabalho – precisam ser protegidos por leis diferentes.

O que não pode continuar é a tentativa infrutífera de muitas autoridades que tentam enquadrar todas as modalidades de trabalho na situação de emprego. Isso é irreal.

Fiscalizar é necessário. Punir os que burlam a lei é essencial. Mas não se pode punir um profissional que trabalha por conta própria só porque não é empregado. E nem se pode admitir que esse profissional trabalhe sem proteções.

Em muitos casos, esse profissional foi empregado até ontem. Se ele for penalizado por não ser empregado ou se a empresa for punida pelo fiscal por utilizá-lo como prestador de serviços na forma de PJ, esse o profissional será forçado a entrar no pior dos mundos. Não podendo ser empregado e não sendo aceito como PJ, ele vai trabalhar na informalidade, sem nenhuma proteção e com grandes prejuízos às finanças públicas, em especial, à Previdência Social.

A confusão criada em torno da Emenda 3 escancarou a necessidade de regras de proteção para quem trabalha sem vínculo empregatício. Aliás, os PJs já estão protegidos. Falta agora proteger quase 20 milhões de brasileiros que trabalham por conta própria. Eles são seres humanos e não podem ser abandonados pelo Estado ou submetidos às interpretações pendulares de fiscais e magistrados.