Publicado em O Estado de S. Paulo, 29/09/1998
Métodos de reduzir jornada de trabalho
Os países da Europa são freqüentemente citados para ilustrar os casos de jornadas de trabalho reduzidas. Os advogados da tese esquecem-se de esclarecer, porém, que, com exceção da França, as jornadas semanais de trabalho vem sendo encurtadas pela via da negociação e não por lei.
São poucos os países no mundo que possuem, na lei, uma jornada semanal menor do que a do Brasil - 44 horas(ver tabela).
Jornada Semanal Legal (em horas)
Países |
Jornada Legal |
França |
39,0 |
Áustria |
40,0 |
Bélgica |
40,0 |
Espanha |
40,0 |
Japão |
40,0 |
Suécia |
40,0 |
Canadá |
44,0 |
Portugal |
44,0 |
Coréia |
44,0 |
Alemanha |
48,0 |
Argentina |
48,0 |
Chile |
48,0 |
Holanda |
48,0 |
Irlanda |
48,0 |
Itália |
48,0 |
Paraguai |
48,0 |
Uruguai |
48,0 |
África do Sul |
---- |
Austrália |
---- |
Egito |
---- |
EUA |
---- |
Hong Kong |
---- |
Inglaterra |
---- |
México |
---- |
Noruega |
---- |
BRASIL |
44,0 |
União Européia |
48,0 |
Fonte: R. Blanpain e outros, Legal and Contractual Limitations to Working Time in the European Union, Leuven: Peter Press, 1997; OIT, Working Time Around the World, Genebra: ILO, 1995
A tabela mostra um número apreciável de países que possuem jornadas legais iguais ou maiores do que a brasileira e várias nações que não têm nenhum regramento legal, ficando a fixação das horas de trabalho a inteiro critério da negociação.
é claro que as jornadas praticadas são bem inferiores às jornadas legais acima indicadas. Por exemplo, na Bélgica, a jornada média é de 32,6 horas por semana; na Alemanha, 35,0; na Itália, 38,5; e assim por diante.
Mas essa redução é fruto de negociação e não de legislação. Ademais, essa média tende a ser artificialmente deprimida devido à grande incidência do trabalho em tempo parcial. Quando se leva em conta apenas os que trabalham em tempo integral, a distância entre as duas jornadas diminui.
A França é uma exceção. O país reduziu a jornada em 1982 para 39 horas e reduzirá para 35 horas à partir do ano 2000 - ambas por lei. Para estimular a adoção da nova jornada, a lei concederá isenção de impostos e encargos sociais às empresas que aderirem antes do ano 2000.
A lei aprovada visa reduzir o desemprego. é interessante, porém, que ela não cria uma só hora suplementar de trabalho. O desemprego de 12% da França é devido não aos empregos que são destruídos, mas à falta de geração de novos postos de trabalho.
A proporção de pessoas que perdem seus empregos nos Estados Unidos é quase cinco vezes maior do que na França e, no entanto, o desemprego americano é apenas um terço do francês.
Como explicar esse aparente paradoxo? Muito simples: a proporção dos que são reempregados nos Estados Unidos é doze vezes maior do que na França (Pascal Salin, Estado Francês Prejudica o Emprego, 1998).
Se a nova lei não cria horas adicionais, ela conseguirá, na melhor das hipóteses, distribuir melhor o desemprego. Isso é muito pouco. Além do mais, ao reduzir tributos e encargos, a nova lei forçará os que trabalham mais a pagar pelo custo dos que trabalham menos. Ou seja, as pessoas serão punidas por trabalhar mais.
A França é o berço da democracia. é estranho que, nesse caso, o país tenha suprimido a liberdade das pessoas escolherem o quanto querem trabalhar, o que seria preservado se a redução da jornada fosse realizada por negociação. Como a redução de jornada é imposta e, por cima, premiada, fica difícil para os que desejam trabalhar mais aceitar que o princípio da liberdade de escolha tenha sido valorizado pelos legisladores franceses.
Em resumo, a redução da jornada de trabalho como estratégia de aumentar empregos pode ser uma boa idéia desde que não seja obrigatória, nem subvencionada e muito menos punitiva. A verdadeira solução do problema do desemprego está na geração de mais trabalho e facilitação da contratação, descontratação e remuneração dos seres humanos.
|