ABL - Academia Brasileira de Letras, 04/10/2016.
Palestra na Academia Brasileira de Letras
Há pouco tempo minha neta perguntou:
- Vô, quantos anos você tem?
- Mariana, eu sou do tempo em que não existia avião a jato. Nem televisão. Sou do tempo em que não havia computador, fax, Internet ou e-mails. Telefone celular, nem pensar...
Ela tomou um susto e exclamou:
- Vô! Você deve ter uns 200 anos!
- Pois é Mariana, tudo isso apareceu nos últimos sessenta anos e a maioria nos últimos vinte. Por aí você vê a espantosa velocidade de mudança que marca os tempos atuais.
A velocidade das mudanças
Vivemos em uma era em que a história corre muito depressa. Já houve outros tempos assim. Lembro aqui a entrada dos teares tocados à máquina a vapor inventada por James Watt em 1763 e a criação do motor elétrico inventado por Werner von Siemens em 1886. A cada inovação desse tipo, as transformações dispararam.
Nos dias atuais, a velocidade com que as novas tecnologias entram no processo produtivo é simplesmente espantosa. As grandes transformações baseiam-se na revolução digital que vêm provocando profundas mudanças na produção e na vida cotidiana, marcadas por inúmeras rupturas dos padrões atuais. O Google, o smarthphone, o Uber e os gigantescos sites de busca que se baseiam na inteligência artificial, que hoje dominam as relações comerciais e pessoais, eram desconhecidos há 10 anos.
Dentro em breve, as novas tecnologias estarão presentes em áreas jamais imaginadas e substituindo os seres humanos por máquinas como é o caso da atividade de tradução simultânea. Quem diria que um robô pudesse fazer o trabalho de um profissional que passou anos a fio em uma faculdade de letras para ter o domínio de uma ou mais línguas e ganhar a vida com isso!
Mas, essa é a nova velocidade da história. E, cada vez que a história dá uma arrancada, novas competências são demandadas.
É o que está acontecendo nos dias atuais. Ao entrarem no mundo do trabalho, as novas tecnologias estão abrindo inúmeras oportunidades profissionais e, ao mesmo tempo, colocando enormes incertezas para o sistema educacional. A escola está sendo desafiada a inovar e a se ajustar a um ritmo que não é próprio da (lenta) cadência educacional.
As demandas do mundo do trabalho
No mundo do trabalho de hoje cresce a demanda por conhecimentos, flexibilidade e versatilidade. Aumenta a necessidade de se contar com pessoas que sabem pensar e não apenas que têm informações.
As transformações têm sido imensas. Alan Greenspan, ex-presidente do Federal Reserve, escreveu um interessante artigo mostrando que o PIB tem um valor monetário e tem um peso físico que reflete o peso de tudo o que é produzido por um país. Ele mostra que o valor do PIB está explodindo e o peso físico está diminuindo. Nos últimos 50 anos, o PIB dos Estados Unidos quintuplicou em valor, ou seja, aumentou 500%, enquanto que o seu peso físico se manteve praticamente constante. De fato, há 50 anos os rádios e as calculadoras pesavam muito. Hoje, graças aos chips, eles são miniaturas levíssimas. Os carros de hoje e os próprios aviões são proporcionalmente muito mais leves. A fibra ótica substituiu toneladas de cobre nas linhas de transmissão. As transações financeiras dispensaram toneladas de papeis, pois são realizadas on line nos computadores.
O que isso tem a ver com o tema desta palestra? Tudo.
O fenômeno apontado por Greenspan indica que a produção está se baseando cada vez mais em elementos intangíveis, ou seja, nas idéias, e cada vez menos na musculação, ou seja, na força física. Na produção industrial moderna participa muito mais o abstrato do que o concreto. E o abstrato é o que se aprende na escola. Numa palavra, a educação de boa qualidade tornou-se uma peça fundamental para acompanhar a evolução tecnológica, para os processos produtivos e para as pessoas.
No mundo do trabalho dos dias atuais, a capacidade de pensar é crucial. A empresa moderna busca profissionais que tenham bom senso, lógica de raciocínio, competência para se comunicar, que sejam capazes de apreender continuamente e preparados para trabalhar em grupo e, por fim, que conheçam bem o seu ofício.
O uso do bom senso é fundamental. O trabalhador que decide colocar as peças defeituosas ou as frutas apodrecidas no fundo da caixa, achando que o consumidor não vai perceber rema contra o bom senso, prejudica a empresa e a si próprio. Sim porque, hoje em dia, o verdadeiro dono do seu posto de trabalho é o consumidor. Se não estiver satisfeito, o consumidor pára de comprar daquela empresa que, por sua vez, pára de crescer e pode até morrer, fazendo desaparecer os empregos. Ou seja, o consumidor passou a ser o grande protagonista da criação ou destruição de empregos.
A empresa moderna espera que os seus profissionais conheçam o seu ofício e sejam comprometidos com o seu trabalho, que tenham zelo naquilo que fazem.
O mercado de trabalho está se tornando cada vez mais exigente. Hoje, passar nos exames de recrutamento de muitas empresas é mais difícil do que ser aprovado em exames vestibulares. Os recrutadores buscam profissionais que tenham um bom domínio dos conhecimentos básicos e das especificidades de sua profissão.
Como assim? O mercado quer um Descartes? Devem ser generalistas e especialistas? É isso mesmo. A empresa moderna espera que seus empregados dominem a linguagem, a matemática, os conhecimentos gerais, a ética do trabalho e a sua profissão.
Nesse mundo, já não basta ser adestrado. É preciso ser educado, e bem educado porque, as mudanças, por ocorrerem em velocidade meteórica, exigem que os trabalhadores estudem e apreendam continuamente. Isso depende de boa educação e não apenas de adestramento.
Se a concorrencia é alta nos dias que correm, ela será muito mais alta nos próximos anos. Estamos mal colocados no campo da competitividade. Nos últimos anos, o Brasil caiu da 32ª para a 57ª posição, num total de 61 países estudados pelo IMD da Suíça. Ao desagregar os componentes da competitividade da economia brasileira, verifica-se que a maior fragilidade está na precária qualidade da educação.
Educação e novas formas de trabalhar
Quando se analisam as transformações tecnológicas dos dias atuais concluímos estarmos apenas no começo de uma fantástica revolução. Para participar dela, os profissionais terão de ser polivalentes. Já entramos na era da multifuncionalidade. Veja o caso da secretária. No passado, esperava-se dessa profissional ser uma boa datilografia e certo senso de organização. Hoje, ela precisa dominar os processadores de texto que evoluem a cada dia; ter boa redação; conhecer um pouco de contabilidade; ajudar a controlar custos; organizar viagens; manusear máquinas sofisticadas de xerox, fax, modem; ter habilidade para persuadir pessoas e ter outras habilidades, muitas vezes, o domínio de língua estrangeira.
O novo mundo do trabalho vai exigir estudo permanente. Tradicionalmente, a teoria econômica dividia o tempo dos seres humanos em duas partes: trabalho e lazer. Ao diminuir o tempo do trabalho, aumentava o tempo do lazer e vice-versa.
Hoje em dia – e mais no futuro - o tempo dos seres humanos divide-se em três partes: trabalho, lazer e aprendizagem. O constante avanço da revolução tecnológica exige dos homens e mulheres a dedicação de uma grande parcela de seu tempo para apreender e dominar as inovações. Nesse mundo só haverá lugar para quem for capaz de apreender continuamente. Não haverá lei, sindicato ou partido que possa tornar atrativa aos empresários a mão-de-obra despreparada.
Por isso, recomendo aos jovens: estudem continuamente e bem além do que é demandado pela escola. Utilizem o seu reconhecido talento para bem explorar as facilidades da Internet. Nela estão disponíveis centenas de curso de grande valia e todos grátis. Aproveitem e estudem continuamente! Só assim poderemos vencer o atraso educacional do Brasil.
Se o problema é grave no momento, será muito mais grave se o Brasil não elevar substancialmente a qualidade de ensino que oferece às crianças e aos jovens. As projeções sobre mercado de trabalho indicam que, em 2050, cerca de 60% das pessoas estarão sendo demandadas para exercer profissões desconhecidas e que não existem nos dias atuais. Explorando as facilidades da educação à distancia você que é jovem poderá se manter atualizado e chegar junto com as novas profissões.
Educação: corrida em direção a um ponto móvel
Tenho muito esperança na capacidade dos jovens apreenderem por conta própria porque as escolas, na maioria dos casos, estão sempre atrasadas em relação às novas demandas do mercado do trabalho. E não é para menos. Elas enfrentam uma corrida em relação a um ponto móvel. Quanto chegam à capacitação exigida, descobrem que as novas tecnologias requererem outras competências. Quando se eleva o nível de conhecimento em 5%, descobre-se que os nossos concorrentes aumentaram sua capacidade em 10% ou 20%. Assim é o mundo da globalização. Vence a competição quem chega mais rápido com quadros capazes de produzir mais, diversificar produtos, atender desejos, ganhar mercado, acumular lucros e aumentar os investimentos.
Isso tem também importantes reflexos a empregabilidade dos jovens. Tem mais chance de se empregar quem pensa bem. Tem mais chance de se manter no emprego quem apreende rapidamente. E continuamente! Peter Drucker diz que, nos dias de hoje, a segurança no emprego depende basicamente da capacidade de aprender de modo rápido e contínuo.
Na corrida em direção ao mundo em evolução constante, contam muito o ponto de partida e a velocidade de aprendizagem. Robert Foegel descobriu que em 1850, 90% dos americanos eram alfabetizados. Naquele ano, no Brasil, 90% dos brasileiros eram analfabetos. O ponto de partida nos foi muito desfavorável.
Recentemente, foi aprovada a Lei no Brasil que obriga os pais a matricularem seus filhos na escola a partir dos quatro anos de idade. Nos Estados Unidos, essa lei foi aprovada em 1650!
Se o ponto de partida conta muito, a velocidade com que se procura tirar a diferença conta muito mais. Também nessa comparação, os americanos foram mais rápidos do que os brasileiros. Eles investiram muito mais do que nós ao longo dos últimos 150 anos e, mesmo assim, estão sendo desbancados pela Coréia do Sul, Cingapura e Finlândia nos testes do PISA.
Não há dúvida de que o grande diferencial das empresas nos dias atuais está na capacidade de aprendizagem da sua força de trabalho. Sim porque as máquinas se tornaram relativamente baratas, acessíveis e bastante "inteligentes". O que faz a diferença é quem opera essas máquinas.
Certa vez perguntei ao Ministro do Planejamento da Índia: o que explica o fato de seu país se destacar tanto no campo da tecnologia da informação se os computadores são igualmente baratos e acessíveis no mundo inteiro? Ele me disse:
- O nosso sucesso é devido à combinação de três "e": english, engineering and education!
Educação e produtividade
Fica cada vez mais claro que a educação só faz diferença na produtividade e nos ganhos pessoais quando é de boa qualidade. Isso explica, em grande parte, porque bons profissionais de nível médio ganham mais do que diplomados em faculdades de má qualidade.
Educação de baixa qualidade não traz benefícios. Os trabalhadores não ganham, não produzem, não inovam e não geram lucros. As empresas não evoluem, não lucram e não crescem.
Na outra ponta, profissionais bem preparados colaboram com a empresa no processo de inovar, no bom uso dos insumos e na redução dos desperdícios. Isso é essencial para a produtividade e para a competitividade e, em última análise, para o crescimento do país.
Os exemplos da história mostram que os países que passaram por fortes crises conseguiram se recuperar pela via da boa educação. Vejam o que ocorreu com a Europa e com o Japão depois da Segunda Guerra Mundial. Observem o que ocorreu com os Estados Unidos depois da recessão dos anos 30. Vale a pena relembrar.
A depressão de 1929 teve efeitos devastadores naquele país. Da noite para o dia boa parte da riqueza virou pó. A produção industrial caiu 50% e o comércio internacional encolheu 70%. Mais de cinco mil bancos faliram. Agravadas por uma impiedosa seca, as safras fracassaram por completo. O desemprego disparou, chegando à casa dos 25%.
Para dar uma ocupação a milhões de pessoas que estavam sem ter o que fazer, o governo americano, em meio de tantos cortes nos orçamentos, decidiu expandir as bibliotecas públicas para ali acomodar os que estavam desempregados. Assim foi feito. Os acervos aumentaram, os espaços e os horários de funcionamento se ampliaram. Surgiram nessa época as bibliotecas circulantes para atender os leitores das pequenas cidades e da zona rural.
Qual foi o resultado daquela iniciativa? Importantíssimo. Durante quase dez anos de recessão, milhões de desempregados se ocuparam com a leitura. Leram todos os dias. Leram o tempo todo. Com isso, o país enriqueceu o seu mais precioso ativo - o capital humano - estando preparado para enfrentar os desafios da retomada do crescimento a partir dos anos quarenta.
Escassez de profissionais qualificados
O Brasil vive hoje uma grave crise de emprego. São quase 12 milhões de desempregados. Mas, a recessão haverá de passar. Nesse momento voltará o problema da escassez de profissionais qualificados em praticamente todos os setores da economia. Pesquisa realizada quando o Brasil ainda crescia (2011) indicou que dois terços dos empresários se ressentiam da falta desses profissionais. O quadro da precariedade da educação perdura até hoje. Apenas 17% dos empregados brasileiros completaram o curso universitário completo e menos de 50% têm o curso médio completo. Para enfrentar os desafios da sociedade do conhecimento, isso é muito pouco.
O Brasil ainda mantém cerca de 1,7 milhões de jovens de 15 a 17 anos fora da escola. Cerca de 14 milhões de brasileiros de 15 anos ou mais não sabem ler ou escrever. Dos que terminam o ensino fundamental, apenas a metade conclui o nível médio. O pior é que mais de dois milhões de jovens com ensino médio completo não estão nem estudando, nem trabalhando e nem procurando emprego. Com um quadro tão precário, não surpreende o fato dos empresários reclamarem da baixa produtividade dos empregados.
Por isso, caros jovens, procurem superar as deficiências das escolas. Vocês apreenderam rapidamente a dominar as tecnologias da informação, a Internet. Está aí um enorme manancial de cursos para enriquecer os seus conhecimentos, tornando-os profissionais preparados para o mundo das inovações. Usem bem essa ferramenta. Afastem-se das superficialidades do piadismo e da pobreza das falsas informações que muitas vezes dominam a Internet.
O papel da linguagem
Quando se fala em educação de boa qualidade, há que se destacar o papel da linguagem. O bom domínio da linguagem é essencial para qualquer profissão. No recrutamento de um profissional, as empresas buscam os candidatos que revelem um bom potencial para apreender novos conhecimentos, que gostem de estudar continuamente, que tenham obsessão pela leitura, enfim, que foram inoculados com o vírus da curiosidade.
As empresas sabem que é o bom domínio da linguagem que garante a capacidade de pensar adequadamente. As nossas escolas ensinam os alunos a passarem nas provas. São raras as que esmeram no ensino da linguagem que prepara as pessoas para pensar.
Em 2012, assisti a um seminário organizado conjuntamente pelas Academias Brasileira e Paulista de Letras cujo foco foi a defesa de língua portuguesa. Nas exposições apresentadas, fiquei chocado com deturpação que vem ocorrendo com o vernáculo. Uma ala crescente de professores insiste em enaltecer o uso das corruptelas em lugar de ensinar as regras fundamentais da língua portuguesa. Para esses professores, falar certo é elitista e escrever corretamente é esnobe. "Para ser do povo, é preciso falar e escrever de costas para as regras da linguagem". Virou politicamente incorreto seguir a gramática.
Trata-se de um cenário falsamente democrático que se destaca pelo cultivo do erro cujo resultado final é catastrófico. Isso não bom para as pessoas e menos ainda para o trabalho. É isso que leva muitos recrutadores a submeter candidatos a profissões de nível médio e superior a uma prova de ditado. Isso mesmo. Ditado. Fiquei arrasado quando um head–hunter de respeito me contou que de 30 palavras ditadas, os candidatos erraram 20 em média.
O menosprezo pela linguagem afeta o desempenho dos alunos nas demais disciplinas. Ninguém consegue pensar bem, se não manejar corretamente a palavra escrita e oral. Nos exames da OAB, 90% dos candidatos são reprovados, a maioria por não saber se expressar e não entender o que lê. Deficiência de linguagem e de pensamento mina a produtividade de toda a força de trabalho e o próprio crescimento do País.
Quantidade vs. Qualidade
Quando se fala em melhorar a qualidade da educação surge logo o argumento de que qualidade não casa com quantidade. Não é verdade. O que seria das montadoras de automóveis se, para produzir mais carros tivessem de sacrificar a qualidade?
No início de 2012 estive na Coréia do Sul. Quando me informaram que todas as crianças estudavam com a ajuda de um notebook pessoal, não me impressionei porque lá essa maquineta é barata e acessível. Mas quando me contaram que todas as professoras sabiam adequar os recursos daquela tecnologia às necessidades de cada idade e de cada grupo de crianças – fiquei maravilhado. Bem diferente é o caso das escolas públicas brasileiras que possuem computadores nas quais 96% deles estão na diretoria e não nas salas de aula.
Mas o problema mais grave da educação brasileira não está na falta de máquinas e sim na falta de programas e talentos bem preparados para administrar as escolas e educar os alunos. Isso se reflete na produtividade do trabalho, na eficiência das empresas, no custo de produção e no alto preço dos bens e serviços. Conseqüência: baixa capacidade de gerar empregos e pagar bons salários.
A escassez de pessoal qualificado faz disparar o custo do trabalho. Aumentar salário é bom para o trabalhador e para a economia. Mas, isso precisa ser acompanhado pela elevação proporcional da produtividade. Nao é o caso do Brasil. Em muitos países, em especial na China, Malásia, Cingapura, Coréia do Sul e também no Leste Europeu, os aumentos salariais têm sido generosos, mas a produtividade tem aumentado em proporção superior ao aumento dos salarios. Isso faz muita diferença para o crescimento dos países. É com esses países que o Brasil está tendo de competir e de maneira acirrada.
Educação, trabalho e cidadania
O papel da boa educação não pára no mercado de trabalho. Além da demanda do setor produtivo, o Brasil tem necessidade de construir gerações de bons cidadãos e de reduzir fortemente o grande atraso nas áreas sociais, como é o caso da saúde, justiça, segurança, previdência e da própria educação.
Também nesse campo a defasagem é preocupante. O exercicio da cidadania só ocorre depois da incorporação adequada do sistema de direitos e deveres.
A democracia só prospera em regimes que dispoem de mecanismos de equilíbrio. Estamos longe disso. Basta ver que na propria Constituição Federal, a palavra direito aparece 76 vezes enquanto que a palavra dever aparece apenas quatro vezes. A palavra produtividade, duas vezes e eficiência uma vez. Como construir uma democracia com 76 direitos, quatro deveres, duas produtividades e uma eficiência?
A caminhada em relação ao equilíbrio depende também de educação de boa qualidade.
Poucas são as escolas que transmitem os valores comumente praticados no mundo do trabalho, onde o equilíbrio entre direitos e deveres é fundamental. Há casos eloqüentes, é verdade. Mas são poucos. As escolas do Sistema S, em minha opinião, estão dentre eles. Vejo nelas o cultivo do ethos do trabalho. Essa impressão decorre de inúmeras visitas que realizei nessas escolas por mais de 50 anos. Nunca vi entre os alunos do SENAI, por exemplo, o desrespeito pelos professores, a depredação das instalações, o descaso pelas ferramentas, o descuido pelos valores morais.
Porque isso não ocorre com escolas da rede pública? Penso que os valores do ethos do trabalho vêm da interface das escolas do Sistema S com as empresas industriais. Nunca vi uma empresa bem sucedida que seja suja, descuidada e desleixada com seu equipamento e ferramentas. É dessa interface que surge a o ethos que é transmitido pelo SENAI. Isso ocorre, é verdade, com inúmeras outras escolas da rede privada e poucas da rede pública (infelizmente) onde a ética do estudo e do trabalho é diariamente cultivada. Para o trabalho moderno, esta dimensão é tão importante quanto a cognitiva.
Conclusão
Parece claro que os avanços quantitativos no campo da educação e da formação profissional precisam ser urgentemente atendidos por melhorias na qualidade e por inovações nos programas e nos métodos de administrar e transmitir a educação. O Brasil precisa ampliar os bons exemplos nesse campo.
Mas, sejamos realistas, isso não acontece da noite para o dia. Vai demorar um bom tempo. Por isso, não me canso de recomendar aos jovens que adquiram o hábito da leitura, que estudem continuamente e que explorem todas as oportunidades oferecidas gratuitamente pelo ensino à distância nas centenas de cursos de boa qualidade que são oferecidos pela Internet.
Anima-me saber que muitas empresas brasileiras se mostram dispostas a fazer investimentos próprios na preparação dos seus empregados em todos os níveis, até mesmo, no nível superior por meio das universidades corporativas. Mais animador ainda é ver essas empresas colaborando como setor público na educação da população nas comunidades em que atuam. As parcerias público privadas no campo da educação são muito saudáveis e já provaram dar bons resultados.
É animador também observar que os próprios trabalhadores adquiriram a consciência da importância da boa educação e buscam cursos de reforço da educação básica e em escolas profissionais. São milhões de jovens e adultos que combinam o trabalho com o estudo em escolas noturnas e com grande sacrifício - por reconhecerem que no mundo moderno o capital mais precioso é a posse de conhecimentos.
Neste oportunidade devo dizer que a Academia Brasileira de Letras presta um grande serviço à causa da boa qualidade da educação ao abrir suas portas para um debate bem fundamentado sobre políticas públicas, dentro das quais a educação ocupa um lugar central. Cumprimento a iniciativa dos nobres acadêmicos da Academia Brasileira de Letras e desejo pleno êxito no desenrolar deste ciclo de debates.
|