Artigos 

Publicado no Revista SINDENERGIA, 23/11/2015.

Entrevista para Revista SINDENERGIA

Entrevista com José Pastore, professor Ph. D. em Sociologia, autor do livro "Terceirização: Necessidade para a Economia, Desafio para o Direito"

23/11/2015 às 09:00 - Por: Juliana de Moraes e Renan De Simone

Lançada neste ano pela editora LTR, a obra assinada por José Pastore, Ph. D. em Sociologia pela Universidade de Wisconsin (EUA) e professor da Faculdade de Economia e Administração e da Fundação Instituto de Administração da USP (Universidade de São Paulo), aborda o tema da Terceirização baseando-se em inúmeros exemplos da realidade brasileira e internacional, com fundamentação teórica da Sociologia e do Direito do Trabalho.

Escrito em conjunto com José Eduardo G. Pastore, membro do Conselho Superior de Assuntos Jurídicos e Legislativos da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) e mestre em Direito das Relações Sociais, o livro reserva um capítulo especialmente para a análise do caso do setor elétrico brasileiro, apontando os desafios para contratantes e contratadas.

José Pastore, que também é pesquisador da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas, conversou com o SindiEnergia Comunica e disse que, "primarizar ou terceirizar é uma decisão que cabe às empresas" e o estabelecimento de critérios para a eventual linha de corte dará ensejo a dúvidas quanto à aplicação de uma legislação que regule a relação do trabalho terceirizado.

A seguir, confira a íntegra desta entrevista exclusiva do acadêmico:

SindiEnergia Comunica:

Entre os representantes de sindicatos dos trabalhadores, algumas frentes defendem a proibição completa da Terceirização, enquanto outras acreditam que deve haver um critério mínimo de "primarização" para as empresas. Como o sr. avalia esta segunda proposta? É viável estabelecer uma "linha de corte", regrando o que pode ou não ser terceirizado?

José Pastore:

Ocorre que, como qualquer linha de corte, isso dará ensejo a dúvidas quanto à sua aplicação. E, pela nossa tradição, as dúvidas são encaminhadas à Justiça do Trabalho.

Como não há base objetiva para linhas de corte, as decisões continuarão sendo arbitrárias, como são hoje, se assim for estabelecido na proposta de legislação que está tramitando.

SindiEnergia Comunica:

O sr. propôs a criação de um Fórum Nacional para a Terceirização por ramos de atividades durante apresentação em uma audiência pública do TST (Tribunal Superior do Trabalho). Como seria organizado esse Fórum? E, a título de exemplo, quais medidas práticas essa organização poderia promover?

José Pastore:

Penso que as regras básicas deveriam ser estabelecidas na lei, como o que pode ser terceirizado, as proteções a serem garantidas, a responsabilidade dos parceiros, etc.

Dali para frente, tudo deveria ser estabelecido por negociação entre as partes envolvidas. Mas, as partes poderiam organizar voluntariamente um Fórum para estabelecer normas específicas, por exemplo, sobre Saúde e Segurança na terceirização, regras para quarteirização, exigências de treinamento, e outras questões relacionadas às relações do trabalho. b

SindiEnergia Comunica:

Para o setor elétrico, o sr. elenca uma série de desafios tanto para contratantes quanto contratadas, destacando o desenvolvimento de atividades especializadas. Quais seriam, em sua avaliação, os principais impactos de uma necessidade de "primarização" das atividades nesse setor?

José Pastore:

Primarizar ou terceirizar é uma decisão que entendo caber às empresas – não importando o ramo de atividade.

Há casos em que pode ser mais útil primarizar. Outros, terceirizar. Cada empresa deve pesar os prós e contras dos dois sistemas e optar por um deles, ou ainda combinar os dois – primarizando uma parte e terceirizando outra, aliás, como já é feito em muitas organizações.

SindiEnergia Comunica:

Considerando que uma (ao menos) distribuidora do país optou pela internalização de todo seu pessoal da área de manutenção (eletricistas), extinguindo no âmbito da companhia a terceirização dessa atividade, qual deve ser a avaliação que legisladores devem fazer deste caso particular para um eventual aprimoramento da regulamentação da Terceirização (no segmento)?

José Pastore:

Novamente, é preciso considerar cada caso individualmente. Conheço bem essa empresa. Trata-se de uma decisão baseada em uma avaliação – aparentemente acertada – de primarizar para reduzir os problemas que estavam incomodando àquela empresa.

O investimento foi alto, especialmente em treinamento e formação de pessoal. Tenho dúvidas que a maioria das empresas do Brasil esteja nessa condição no momento. Para elas, a terceirização parece ser a solução mais adequada.

SindiEnergia Comunica:

Segundo a avaliação dos senhores, por que, quando há o debate da matéria da Terceirização, sempre se alardeia de que a regulamentação desse processo resultará em precarização das condições para trabalhadores?

José Pastore:

É claro que a ameaça de precarização é o melhor argumento para mobilizar a opinião pública quando se está contra a terceirização!

Ainda há muita precarização no mercado de trabalho e é isso que deve ser reduzido pela implantação de uma lei clara, objetiva e que impõe punições severas para quem precariza por meio da terceirização.

Os que são a favor da terceirização precisam desenvolver um repertório de argumentos que seja tão convincente como o amedrontamento da precarização. E, garanto, há dezenas de argumentos nesse campo.

SindiEnergia Comunica:

É possível, de acordo com a avaliação dos senhores, garantir a proteção e direitos aos trabalhadores de empresas terceirizadas por meio da regulamentação de tema? Por quê?

José Pastore:

O PL 4.330/2004 e o PLC 30/2015 fazem isso ao estabelecer uma série de proteções que não existem para os empregados celetistas de empregos diretos como, por exemplo, alimentação no restaurante da contratante, atendimento de acidentes no seu ambulatório, uso do transporte da contratante, responsabilidade compartilhada entre contratante e contratada pelas proteções trabalhistas e previdenciárias, etc.

Vale destacar que nada disso existe na CLT e muito menos na Súmula 331 do TST.

SindiEnergia Comunica:

O projeto de lei 4.330/04, em sua versão final, dispõe que será permitida a Terceirização de "parcela de qualquer atividade da contratante". Qual o risco que traz esta descrição, caso a proposta para legislação do tema venha a ser efetivamente aprovada nesses termos?

José Pastore:

O risco de insucesso da proposta nos atuais termos é grande, pois, havendo dúvida, o assunto terá de ser dirimido pelo TST, que poderá muito bem dizer que a permissão aludida se refere à parcela relativa à atividade meio.

E, sendo assim, ficaremos no mesmo lugar...