Publicado no Estado de São Paulo, 20/11/2012.
Uma injeção de ânimo
O meu dia a dia envolve o acompanhamento de muitas situações amargas no campo trabalhista, como o são o cipoal da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), os sobressaltos da Justiça do Trabalho, a terrível burocracia e várias outras. É frustrante ver a lentidão do processo de mudança nesses campos.
Para lavar a minha alma e encontrar motivos de esperança no futuro do Brasil, visito anualmente a Olimpíada do Conhecimento, promovida pelo Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai). São cinco dias de provas. É a maior competição profissional das Américas.
Neste ano o certame se realizou em São Paulo, no Anhembi. Estive lá com a minha mulher e ficamos muito comovidos. É um espetáculo deslumbrante. Mais de 600 jovens brasileiros, previamente selecionados em seus Estados, foram ali desafiados a executar as mais difíceis tarefas nas áreas de mecânica, eletricidade, eletrônica, construção civil e panificação - em 50 profissões diferentes. No campo da mecânica de automóveis, por exemplo, cada candidato recebia uma ficha de serviço, como se fosse uma reclamação do proprietário, e, no menor tempo possível, tinha de solucionar o problema. Resolvido esse problema, recebia outra ficha para fazer o mesmo, até completar 7 provas - uma mais desafiadora que a outra. É importante notar que ali não se testa só o conhecimento. Igual valor têm a criatividade, a disciplina, o zelo, o cuidado com as ferramentas, a limpeza da bancada e tantas outras condutas que são essenciais para vencer no mundo do trabalho.
Para o leitor que nunca visitou essa competição, sugiro que a coloque na sua agenda. A disputa é elegante, amigável e contagiante. Ali se observa uma combinação engenhosa de conhecimentos teóricos com destreza manual, fruto de uma educação que ensina a pensar, coisa rara na maioria de nossas escolas, que, na melhor das hipóteses, ensina os alunos a passarem nas provas. É o bem pensar que dá maleabilidade de raciocínio e permite à pessoa transformar informações em respostas práticas. No mundo atual, as empresas não estão interessadas em "canudos" e currículos enfeitados. Elas buscam quem tem capacidade de dar respostas bem fundamentadas.
Foi o que eu vi em todos os setores que visitei. Foi um dia diferente, cheio de alegrias. Alimentei ali a minha fé no futuro do Brasil. Vi que nem tudo está perdido. Há uma parcela expressiva da nossa juventude que, felizmente, está longe da droga e da preguiça. São jovens que amam o que fazem, denotando um comprometimento que é essencial para o sucesso profissional.
Para coroar, visitei o setor de nanotecnologia e vi ali as maneiras atraentes de ensinar e aprender o que há de mais avançado no campo da ciência - as soluções do dia de amanhã. Foi um show. Animador é saber que, dentro em breve, as crianças brasileiras estarão dominando os conhecimentos do futuro. Mas a parte mais comovente foi apreciar a participação dos portadores de deficiência, disputando em pé de igualdade com os demais competidores. Igualmente tocante foi ver a competição de estudantes do Sesi (11 e 12 anos de idade) no campo da robótica - uma destreza espetacular. Saí desses stands com os olhos cheios d'água. Quanto empenho! Quanta dedicação!
Mais uma vez, o Senai, seus administradores, funcionários e professores estão de parabéns pelo alto nível do certame. O Brasil precisa aumentar muito o número de jovens nas escolas profissionais - hoje são menos de 7%, enquanto nos países avançados são mais de 40%.
Tenho certeza de que a garotada que passou pelas difíceis provas da semana passada brilhará na Olimpíada mundial, que será realizada em Leipzig. No evento de 2011 (Londres), os brasileiros ficaram com o 2.º lugar, atrás apenas da Coreia do Sul - esse fantástico exemplo de revolução pela educação - e na frente da Alemanha, Suíça, EUA e muitas outras nações avançadíssimas. Neste ano, estou seguro, eles brilharão novamente. Isso é Brasil - um país que dá certo quando a educação é levada a sério.
José Pastore é professor de relações do trabalho da FEA-USP e membro da Academia Paulista de Letras. |