Publicado no Estado de São Paulo, 25/09/2012.
Educação e negociação coletiva
Muitos empresários me procuram para pedir ajuda com relação aos seus profissionais de recursos humanos e de relações do trabalho, argumentando que eles não estão preparados para negociar nos tempos modernos. Alegam que eles foram acostumados a conceder aumentos salariais generosos, quando as firmas podiam passar tudo para os preços, bem diferente da época atual, quando a pressão da concorrência exige o máximo rigor no desempenho das empresas.
Ainda que em muitos casos isso se justifique, resisto a aceitar o argumento. Conheço muitos negociadores de grande preparo que se estão vendo em apuros com as pressões que vêm dos sindicatos laborais e dos próprios trabalhadores. Os dados do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) revelam que, na prática, todos os brasileiros estão recebendo aumentos de salários e benefícios superiores à inflação.
Fundamento a minha descrença na hipótese da incompetência dos negociadores com dados do mercado de trabalho. Apesar da propalada desaceleração da economia, as empresas continuam encontrando enormes dificuldades para contratar profissionais competentes. O desemprego está abaixo de 6%. O emprego formal segue aumentando. A empresa que ameaçar conceder aumentos irrisórios não só deixa de contratar, como perde seus bons profissionais para a concorrência.
Em clima de escassez de talentos, é natural que negociadores escolados fiquem impotentes para resistir a pedidos de aumentos reais de salários e benefícios - bastante expressivos -, como ocorre agora com várias categorias. O governo federal conseguiu segurar o ímpeto dos sindicatos. Mas, bem diferente da empresa que tem de entregar o seu produto com qualidade e pontualidade, sob risco de pagar multas e perder mercado, o governo, infelizmente, tem pouco compromisso com os cidadãos. Se hoje não há aula, paciência, amanhã haverá reposição (acredite se quiser). Se hoje não há atendimento hospitalar, amanhã se vai tirar o atraso (idem).
Ou seja, as empresas que têm concedido aumentos expressivos não deveriam culpar os negociadores por isso. É claro que há exceções. Mas, no geral, o atual modelo de consumo ainda está gerando forte demanda sobre a maioria das firmas que não podem deixar de atender aos seus compromissos. Para agravar a situação, o País assiste a uma redução da oferta de trabalho como reflexo das quedas das taxas de fertilidade do passado e do prolongamento dos anos de estudo no presente, o que adia a entrada dos jovens no mercado de trabalho.
Se isso, de um lado, justifica a dificuldade de conter a explosão de salários e benefícios, de outro, chama a atenção para as graves consequências do descasamento entre produtividade e custo do trabalho. Na ânsia de contratar e reter os que aparentam ser os melhores empregados, as empresas elevam as ofertas, aumentam os pisos salariais e alteram toda a sua estrutura salarial. Como na maioria dos casos os aumentos concedidos são superiores à produtividade do trabalho (em razão da precária formação dos profissionais e do baixo nível de inovação), a diferença tem de ser buscada no lucro, o que afeta o investimento e o desenvolvimento futuros.
É isso que está ocorrendo. A má qualidade da educação está comprometendo a sustentabilidade do crescimento do País. Esse problema não se resolve trocando os negociadores, e exige, isso sim, um programa sério de melhoria dos professores e gestores das escolas; a pressão generalizada dos pais por melhor ensino; o maior envolvimento das empresas na capacitação de seus empregados; e a expansão dos investimentos em inovações, pesquisa e desenvolvimento. Temos de nos convencer. O Brasil deixou de ser um país de mão de obra farta e barata. Nessas condições, o que se impõe é tudo fazer para elevar a produtividade dos trabalhadores que custam mais caro.
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