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Publicado em O Estado de S. Paulo, 09/12/2008

O dinheiro compra confiança?

Sim e não. Se depositarem na minha conta bancária um montante que equivale a duas ou três vezes a minha renda anual, o meu otimismo subirá vários tons na escala da confiança e, nessas condições, considerarei seriamente comprar um imóvel, reformar a minha casa ou montar num automóvel zero.

Se eu receber, porem, apenas uma promessa de que isso vai acontecer, a história é outra. O máximo que farei é pesquisar os preços dos meus sonhos.

Se eu não tiver pela frente nem a promessa, o bom senso me indica não ser esta a hora de tentar aventuras. Mesmo que um banco me acene com um empréstimo atraente, relutarei em assumir dividas. Afinal, não sei se eu e os que trabalham em minha casa estarão empregados.

Confiança é um ingrediente fundamental para a ação do consumidor. No Brasil a regra para comprar a crédito sempre foi a de saber se a prestação cabe no salário. O mesmo bom senso indica que antes do salário, é preciso saber se haverá emprego.

O que vale para o consumidor, vale para o investidor. Para se lançar em novo empreendimento ele precisa confiar na possibilidade de vender sua produção. Ele também observa com atenção a situação dos consumidores. Se estes perderem o emprego, sua produção ficará encalhada e a quebra é inevitável.

O emprego é um dos elementos centrais para gerar a necessária confiança no mundo dos negócios.

E como se constrói a confiança? Sabemos que confiança é um sentimento frágil. Pode ser destruída da noite para o dia. E é demorada para ser construída. Muito mais tempo leva para ser reconstruída.

A formação da confiança baseia-se em observações demoradas de pequenos e importantes detalhes. Tome o caso da confiança inter pessoal. Para surgir, avalia-se o comportamento da pessoa, seus valores, suas atitudes, suas manifestações verbais e não verbais, suas respostas a estímulos sociais, etc. No caso dos casais, é infindável a lista de itens que os parceiros observam antes de adquirirem a confiança para casar.

Na economia é igual. A confiança é construída por uma miríade de componentes – o que leva tempo para se formar. Quando se trata de "reconstrução" da confiança o processo é mais longo. Como ocorre entre as pessoas, depois do vaso trincado, é difícil uma restauração perfeita. Trincou, trincou.

Essa é a situação atual na economia brasileira e mundial. Os consumidores e investidores estão na fase de observar com lente de aumento os pequenos e importantes sinais que formam a confiança. O que eles estão vendo, no momento, são fatos de incerteza. É assustador verificar que os Estados Unidos destruíram mais de dois milhões de empregos em apenas um ano. Da mesma forma, é preocupante verificar que o Brasil criou em outubro passado apenas 61 mil postos de trabalho quando em setembro ultrapassou a casa dos 280 mil. Em 2008, serão cerca de 2,5 milhões de empregos novos.

A abrupta anemia na criação de empregos que apareceu em outubro, vai desembocar em desemprego. Com uma taxa esperada de apenas 3% de crescimento, o país vai gerar não mais do que 1,5 milhão de vagas que serão insuficientes para atender os 2,5 milhões de candidatos, sem contar o "carry over" de desempregados de 2008 para 2009.

A crise mostrou sua feia cara no mercado de trabalho. A confiança dos consumidores e dos investidores estará comprometida. Os R$ 150 bilhões que já foram injetados pelo governo na economia serão insuficientes – além de demorados – para comprar a confiança dos brasileiros nos próximos meses. Esta terá de ser reconstruída palmo a palmo, com base na observação de muitos pequenos e importantes fatos. Os consumidores estarão querendo saber como ficará o seu emprego em 2009; o que acontecerá com o trabalho do seu parceiro ou parceira; o que já ocorreu com seus familiares, vizinhos, amigos e colegas de trabalho. O que se ouve na empresa em que trabalham. E assim por diante.

Os investidores, igualmente estarão na mesma trilha, dando uma prioridade para a observação do comportamento do mercado de trabalho. Afinal, o emprego é a alma dos negócios e do bem estar.

Ao contrário dos países que já mergulharam na recessão, o Brasil tem boas chances de crescer em 2009. Mas não terá condições de manter o nível de emprego dos anos de 2007 e 2008. Só quando isso mudar, a confiança voltará.