Artigos 

Publicado no Jornal da Tarde, 13/12/00

Confiança, casamento e negócios

Seria exagero dizer que casamento e negócio têm ingredientes comuns? Afinal, o que faz um casamento prosseguir? A resposta é simples: satisfação e confiança entre os cônjuges.

É verdade que no casamento o amor é a alma do sucesso. Mas, tanto a relação matrimonial como a relação empresarial são contratos voluntários, firmados entre pessoas livres, que têm o mesmo objetivo. Nas duas relações o êxito só aparece quando os cônjuges e sócios empenham-se seriamente no empreendimento. Quando isso não ocorre, eles passam a sofrer e, com freqüência crescente, a relação termina. Isso é acelerado quando surgem novas oportunidades ou as preferências pessoais se alteram.

Há pessoas que temem o casamento e, por isso, evitam casar. Há outras que, apesar de casadas, jogam na defensiva, afastando todo tipo de ação que possibilite a exploração do outro. É o que acontece também com o empresário que teme a traição do sócio ou o que evita investir no treinamento dos empregados por medo de perdê-los para os seus concorrentes - às vezes, para o sócio desgarrado. Nessas condições, em lugar de fortalecer a confiança, o casamento e o negócio acabam gerando insegurança e a probabilidade de se desfazerem aumenta.

No casamento, com a crescente facilidade para as pessoas quebrarem o compromisso inicial, a insegurança vem aumentando. Observe que não há dispositivo legal ou sanção que obriguem os cônjuges a cumprir o prometido ou a reparar os danos causados ao companheiro. As leis de divórcio que permitem a separação sem motivo apavoram muitas pessoas e desestimulam o casamento.

É evidente que a confiança não surge pelo simples de se proibir a separação. Mas, é inegável que a insegurança é grande quando é fácil sair de uma relação.

No Brasil, a lei do divórcio tem quase 25 anos (Lei 6.515, 26/12/77). Na década de 80, o número médio de casamentos era de 1 milhão por ano. Na de 90, apesar do crescimento demográfico, esse número caiu para 760 mil. Ao mesmo tempo, cresceram os rompimentos. Entre 1984 e 1996, as separações judiciais saltaram de 63 mil para 180 mil (sem e com direito ao recasamento) (IBGE, População Jovem no Brasil, 1999; Estatísticas do Registro Civil, 2000). Lembre-se que esses números não levam em conta as separações informais, que são a maioria em nosso País.

Os economistas que gostam de estudar tudo, dizem que, com o divórcio unilateral, sem motivo e sem penalidade, instiga o oportunismo de um cônjuge, criando um ambiente de graves injustiças psicológicas, sociais e econômicas para o outro, (Robert Rowthorn, "Marriage and trust", Cambridge Journal of Economics, Vol. 23, 1999).

É essa injustiça que levou muitos países a exigir uma razão plausível (e um certo tempo de separação) para a promulgação dos divórcios. Vários estados americanos já implantaram tais requisitos, além de exigirem, do oportunista, uma compensação econômica expressiva, em benefício da parte danificada. Na Inglaterra e na Escócia, igualmente, os institutos legais estão restringindo o divórcio imotivado.

Tais institutos, ao penalizar os que causam danos ao parceiro e premiar os que cumprem suas promessas, dão um tratamento legal e econômico às juras de amor. Quem segue as regras, é gratificado. Quem as viola, é penalizado.

O que você acha disso tudo? Não é racionalidade demais para casos de amor de menos? Francamente, não sei como os seres humanos conseguirão manter o romantismo sincero, expressivo e gostoso quando cercados por tantos regulamentos, prêmios e penalidades.

Mas... talvez esse romantismo esteja morrendo junto com a gente da minha geração. Quem sabe já morreu para a maioria dos homens e mulheres da atualidade. Porém, o regramento proposto pode ser atraente para os mais jovens. É possível que, através dele, o mundo venha a construir relações mais sólidas... São muitas hipóteses. É melhor eu parar por aqui e deixar essa decisão para o leitor.