Artigos 

Publicado em O Liberal, 01/10/1992

Desenvolvimento sustentado na Amazônia

A explosão das denúncias de corrupção em junho passado ofuscou, entre nós, o significado da ECO-92 para o Brasil e para o mundo. Os que estão mais longe do nosso incêndio político, entretanto, não se cansam de valorizar a importância daquele encontro. O presidente George Bush e o ministro Celso Lafer, na Assembléia Geral da ONU, na semana passada, destacaram os enormes avanços que a ECO-92 proporcionou para o entendimento dos problemas ambientais em nosso planeta.

As melhores universidades do mundo vêm alocando consideráveis recursos no campo da ecologia. Um exemplo eloqüente é o que faz a Universidade de Wisconsin, dos Estados Unidos, que, em colaboração com a EMBRAPA, estuda seriamente os problemas e as perspectivas da Amazônia.

O professor Archibald O. Haller, daquela universidade, juntamente com o Dr. Ramom Torrecilha, da Universidade da Califórnia, acabam de concluir um extraordinário trabalho mostrando os avanços realizados e sugerindo alternativas para o atingimento do desenvolvimento sustentado na região ("The Future of Amazônia: Sociology of the Brazilian Frontier", Madison, Wisconsin, Setembro de 1992).

Em resumo, o referido trabalho sugere duas coisas para se explorar adequadamente toda a potencialidade da Amazônia: respeito e conhecimento. Os autores, sem mesuras, criticam os estrangeiros desavisados que tratam pretensiosamente a Amazônia como "parte do patrimônio mundial". É uma atitude de quem se sente herdeiro daquilo que legitimamente pertence aos brasileiros – como se tivessem escritura passada que lhes assegurasse o direito de decidir sobre o que fazer nessa vasta região.

Esse tipo de postura denota, antes de tudo, uma profunda falta de respeito. Os próprios autores indagam: será que os americanos gostariam que os brasileiros viessem a reclamar ingerência nas terras do Meio-Oeste e dos Grandes Lagos por serem parte do patrimônio mundial? É claro que não. A soberania é um valor mais alto para o qual toda nação exige respeito.

Mas, além do respeito, Haller e Torrecilha enfatizam que a exploração adequada da Amazônia Legal requer muito apoio das ciências da natureza e também das ciências sociais, lembrando que esse é um campo em que os países mais ricos poderiam dar uma extraordinária colaboração ao Brasil. Não se trata meramente de injetar recursos financeiros deste ou daquele banco internacional. Isso não é suficiente para deter e reorientar a exploração atual. O desenvolvimento sustentado demanda, sobretudo, a montagem de uma eficiente rede de talentos que seja capaz de compreender adequadamente a natureza dos fenômenos e propor soluções respeitosas para os problemas atuais.

É animador descobrir-se pesquisadores estrangeiros decididos em conduzir estudos sobre a questão ambiental com respeito e competência. O Brasil precisa tirar proveito disso e estabelecer fortes vínculos com gente que assim pensa. Os autores têm razão: estamos muito longe da riqueza da Europa e dos Estados Unidos no âmbito das ciências e da tecnologia. É claro que a Amazônia tem suas peculiaridades, mas não podemos subestimar a força das ciências básicas para o entendimento dos problemas ambientais. Por isso, nossa política externa deveria ser muito mais agressiva na busca de uma aproximação séria com as instituições estrangeiras que têm competência técnica e cultivam os valores do respeito ao próximo.

Essa "joint venture" entre a EMBRAPA e a Universidade de Wisconsin merece ser muito ampliada, incluindo-se outras entidades, para, com isso, aumentarmos no curto prazo, a nossa capacidade de intervir adequadamente nos problemas ambientais. Por isso, toda vez que os estrangeiros reclamaram a Amazônia como patrimônio do mundo, nós, brasileiros, deveríamos convocá-los para ajudar a desvendar os mistérios da região pela via da ciência e da tecnologia.