Publicado no Jornal da Tarde, 03/04/2002.
Tatuagem no trabalho
No Congresso Nacional há vários projetos de lei que se referem a tatuagens. Um deles, de autoria da senadora Luiza Toledo (PSDB/ES) proíbe as tatuagens em menores de 18 anos. Outro, de autoria do Deputado Bispo Rodrigues (PL/RJ) visa regulamentar os ateliês que fazem tatuagens, por razões de saúde pública.
Na área do trabalho, há um projeto de lei do Deputado Luiz Antônio Medeiros (PL/SP) que busca coibir a discriminação de pessoas tatuadas nos concursos públicos.
Por que tanta preocupação com tatuagens? Porque essa moda está crescendo, incluindo não só a gravação de desenhos, símbolos ou inscrições na pele, como também a colocação de brincos, argolas, alfinetes, adornos de madeira - "piercing" em geral. Nos Estados Unidos, um em cada seis adultos têm ou já tiveram tatuagem ou piercing em seu corpo.
O que leva as pessoas a se tatuarem ou pendurarem piercings pelo corpo? Cerca de 67% dos americanos fazem isso por rebeldia; 49%, por experiência vivencial; 38% porque gostam de ser "alternativos"; 21% por razões artísticas; e 15% por modismo. Naquele país, um dos tatuadores mais procurados, em New Orleans, colocou piercings em 5.000 pessoas em 2001, incluindo 1.272 no umbigo; 822 na língua; e 708 na auréola do peito ("Ink me, stud", in American Demographics, dezembro de 2001).
Cerca de 85% das pessoas que portam esses adornos sabem que sofrem discriminação na sociedade e no trabalho. E no Brasil, há esse tipo de discriminação? O deputado Medeiros cita que no Espírito Santo, o candidato tatuado a qualquer cargo da Polícia Militar recebe parecer de incompatibilidade provisória; depois de melhor avaliação, se constatado que a tatuagem fica coberta pela farda e não faz apologia ao crime, o candidato é aprovado. Em Goiás, a Polícia Militar simplesmente não admite pessoa tatuada no curso de formação de sargentos. Da mesma forma, a Polícia do Distrito Federal não contrata quem tem tatuagem no braço, mesmo que não apareça.
Medeiros argumenta, com razão, que todos são iguais perante a lei. Nos concursos públicos, o que se busca é a competência e não a aparência. Ademais, por que condenar uma pessoa ao ostracismo pelo fato de ter implantado na pela uma figura que não sái mais?
Como se vê, há razões para atacar os discriminadores. Mas será que uma lei desse tipo impedirá os empregadores em geral de estabelecerem certos limites para a arte corporal?
Convenhamos, há situações delicadas. Será que o dono de restaurante se sente à vontade para admitir como maître um homem que tem o rosto tatuado dos dois lados e vários piercings nos lábios e na língua? Há alguma emissora de televisão que coloque em seus programas educativos um professor com essa aparência? O que dizer da patroa que dispensa a empregada doméstica que decide encher-se de tatuagens, argolas e alfinetes pelo corpo inteiro?
É claro que todos têm o direito de se embelezar - e gosto não se discute. Mas essas pessoas sabem que vão enfrentar barreiras no mercado de trabalho. O exagero na auto-expressão cria obstáculos para tatuados e "espetados" no relacionamento com outras pessoas e no ambiente de trabalho. Mas, como o motivo principal é a rebeldia, quanto mais resistências encontram, mais eles se satisfazem, vendo na atitude dos outros inúmeros motivos para acioná-los na justiça.
Trata-se de um problema complexo. Diz o bom senso que há limites para tudo. O difícil é estabelecer esses limites na lei.
Medeiros tem razão ao enfatizar a importância da competência e não da aparência. Mas o que dizer ao dono do restaurante quando ele argumenta que o rosto daquele maître afasta a sua freguesia? Ou à emissora de televisão que perde alunos no telecurso quando o professor se apresenta cheio de ppriercings? Ou quando a dona de casa diz que o exagero da arte corporal da empregada assusta seus filhos pequenos?
Enquanto o posto de trabalho for de propriedade do empregador, o assunto é insolúvel. Ele sempre vai achar algum motivo para evitar empregar quem não deseja. É claro que campanhas de esclarecimento sobre infrações legais ajudam os empregadores a serem mais flexíveis. Mas as mesmas campanhas têm de sinalizar aos candidatos a empregos a necessidade de limitar seus impulsos artísticos se de fato querem trabalhar em companhia de outras pessoas e em ambientes nos quais a aparência é parte da competência. Essa é a chave do problema. No mundo atual, competência não se restringe a conhecimentos. Ela inclui apresentação, atitudes e comportamentos.pequenos?
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