Publicado em O Jornal da Tarde,24/04/1996
Sexo no trabalho
O assédio sexual está se tornando um problema trabalhista grave nos países mais avançados. Os assediadores ofendem os assediados, abalam a harmonia, afetam a produtividade e destróem a imagem da empresa e dos assediados. Além disso, as empresas tendem a ser envolvidas como "solidárias" em longas e custosas batalhas judiciais.
Em 1995, estima-se que, nos Estados Unidos, mais de 700 mil mulheres foram vítimas de agressão sexual incluindo-se aqui desde a simples insinuação até a violência física. Cerca de 10% dos casos geraram reclamações e 2% transformaram-se em ações judiciais. Só o setor público gastou US$ 267 milhões com despesas de honorários advocatícios, transferências e demissões de funcionários.
O mesmo vem ocorrendo no setor privado onde os processos também se multiplicam. Em meados de Abril de 1996, Mike Tyson voltou a ser denunciado por uma freqüentadora de um "night-club" de Chicago. Daniel Carleton Gaddusek, Prêmio Nobel de Medicina de 1976 - vejam só! - foi declarado ter assediado seus estudantes no laboratório de Bethesda.
As indenizações por assédio sexual têm sido gigantescas. Empresas condenadas (por negligência ou solidariedade) estão pagando verbas que variam entre US$ 100 mil e US$ 3 milhões. Na Mitsubishi de Illinois, 700 mulheres pleiteam indenizações individuais de US$ 300 mil cada uma (total de US$ 210 milhões) alegando terem sido vítimas de assédio sexual por parte dos seus chefes.
No Brasil, o problema está longe dessas proporções, mas cresce aceleradamente. O ex-Ministro do Planejamento, Alexis Stepanenko, respondeu uma ação judicial movida por funcionária do ministério, avaliada em cerca de US$ 1 milhão. Foi absolvido, aliás. Ações no valor de US$ 100-200 mil começam a aumentar de forma rápida, em especial, nos grandes centros urbanos.
No campo médico, várias reclamações vem sendo encaminhadas aos Conselhos de Medicina e às Delegacias de Polícia. No final de 1995, o Conselho Federal de Medicina condenou por unanimidade e cassou o diploma do médico ginecologista Vasco Rodrigues da Cunha, de Brasília, por ter assediado a estudante e cliente Daisy Nogueira dos Santos.
O Sindicato das Secretárias do Estado de São Paulo (SINSESP) afirma que 30% de suas filiadas já foram assediadas no trabalho. A maioria não reclama, mas o quadro começa a mudar. Está crescendo o numero de moças que apresentam queixas formais na Delegacia da Mulher.
O que fazer para se evitar a disseminação dessa prática e a instalação de uma nova indústria advocatícia?
Nos ultimos 5 anos, os países mais avançados começaram a tratar desse assunto dentro do campo das relações do trabalho. Os resultados são animadores. Tem-se conseguido uma redução substancial do assédio sexual e dos conflitos dele decorrentes através da implantação de procedimentos reclamatórios de fácil operação.
Tais procedimentos variam conforme a empresa e a categoria profissional em tela. Mas, a sua lógica é a mesma. Os regimentos internos das empresas, regulamentos de conduta, códigos de ética ou, em casos excepcionais, o contrato coletivo estabelecem que, qualquer tentativa de assédio deve ser inicialmente reportada, de forma oral, pela assediada ao próprio assediador. Espera-se apenas que a pessoa molestada advirta o molestador: "Olha, não gostei. Pare com isso. Se você não parar vou seguir a rotina reclamatória".
Persistindo no assédio, a pessoa assediada tem de fazer a sua reclamação por escrito. Continuando o problema, este será relatado, oralmente, à administração superior. Não resolvido, o caso poderá ser levado ao sindicato ou à arbitragem.
Os estudos mostram que 90% dos casos são resolvidos no primeiro estágio. Raros são os assediadores que têm coragem de prosseguir depois da advertência oral da assediada. Com isso, evitam-se batalhas judiciais, garante-se um ambiente de respeito mútuo entre as pessoas e assegura-se a privacidade.
Em suma, assédio sexual virou um tema importante na área trabalhista, sendo tratado, com sucesso, por procedimentos bem conhecidos no campo das relações do trabalho. Tais procedimentos permitem praticar a política de prevenir antes de remediar. No Brasil, convém começar a pensar em tais procedimentos antes que o assédio sexual vire uma indústria advocatícia.
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