Publicado em O Jornal da Tarde, 21/06/1995
Papagaios no trânsito
Existe coisa pior do que o trânsito de São Paulo? Sim, existe.
Em 1994 estive na Tailândia. Viagem cansativa: São Paulo, Johanesburg, Bangkok. Quase 25 horas de vôo, sem sair do avião. O aeroporto distava do meu hotel não mais do que dez quilometros. Tomei um taxi. Sabe quanto tempo levei? Três horas!
O trânsito de Bangkok é simplesmente infernal. O congestionamento é a regra e dura horas. Pequenas viagens levam séculos. Tanto que, nos postos de gasolina, o motorista compra não só combustivel para encher o tanque mas também "papagaios" hospitalares para esvaziar a bexiga. Não é piada. Motoristas previdentes em Bangkok dirigem com seu cinto de segurança apertado e com o papagaio preparado para urinar no meio do trânsito parado. Aliás, não vi nos referidos postos nada para atender às necessidades das mulheres. Não pode ser o mesmo papagaio, é claro..., a menos que as tailandesas sejam todas treinadas em tiro ao alvo.
O que dizer de São Paulo num quadro desses? Embora o trânsito seja bem mais pesado no sudeste asiático, a situação é mais grave em São Paulo. Isso porque tanto a Tailândia como Coréia, Cingapura e outros países que sofrem de congestionamento crônico estão tomando medidas muito efetivas para resolver o problema enquanto que nós, em São Paulo, estamos enjaulados dentro de orçamentos anêmicos que impedem os necessários investimentos em infra-estrutura urbana. Em Bangkok, por exemplo, está em plena construção um sistema de vias elevadas que custará aos cofres públicos nada mais nada menos do que 20 bilhões de dólares. Os números à respeito dos investimentos na infra-estrutura de trasporte na Ásia são impessionantes, quase inacreditáveis. Ao longo dos próximos dez anos, a Tailandia, investirá US$ 57 bilhões no setor; a Indonésia, 62; A Coréia do Sul, 132; e a China, 302 bilhões de dólares! (Ver FarEastern Economic Review, 06/04/95, p. 42).
Ao lado de investimentos tão pesados, os países do sudeste asiático declararam uma verdadeira guerra contra os veículos privados. A principio, estabeleceram taxas e impostos de licenciamento tão altos o que restringiu o uso dos carros àpenas aos que têm dinhero para jogar fora. Em Cingapura, o preço da lacração chegou a custar quase o preço do carro! Isso causou muito mal estar.
A política foi tachada de discriminatória e acabou sendo modificada. Aqueles países concluíram ser mais eficiente controlar o uso do que a propriedade dos automóveis. As áreas centrais das cidades passaram a ter pedágio e uso restrito. Os automóveis que transportam grupos de pessoas pagam menos. Em muitos casos, os carros são usados em dias alternados. Os "ôlhos mecânicos" nas ruas e nas estradas cobram mais de quem usa intensamente as vias públicas.
Ou seja, a combinação de investimentos em infra-estrutura com um pouco de racionalidade no uso dos veículos está acendendo uma luz no fundo do túnel nas regiões de trânsito mais congestionado. Entre nós, não há nem uma coisa, nem outra. O nosso futuro é sombrio. Em São Paulo, o congestionamento parece ter vindo para ficar. Felizes serão os produtores de papagaios. O mercado está aí, é só se preparar...
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