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Publicado em O Jornal da Tarde,12/04/1995

Como se aposentar bem?

Nesta época em que se busca um novo modelo para a previdência social brasileira, a velhice aparece como um grande estorvo. Isso contrasta com outras partes do mundo.

A cidade americana de Fort Collins, no Colorado, por exemplo, está fazendo uma campanha agressiva para aumentar o número de idosos como moradores permanentes. O movimento já é um sucesso. Em 1994, cerca de 25% dos recém-chegados àquela cidade tinham mais de 65 anos e para ali se mudaram para poder esquiar, jogar tênis, golfe, bocha e até escalar as Montanhas Rochosas. Gente que ainda dispõe de muita energia e boa renda para consumir.

A medicina moderna tem conseguido não só prolongar a vida mas, sobretudo, melhorar a produtividade e a qualidade de vida dos seres humanos. Nos Estados Unidos, é cada vez mais comum encontrar-se pessoas de 70 anos com um desempenho de 50 (Ray C. Fair, How Fast do Old Men Slow Down?, 1994). A informática e outras inovações ajudam a prolongar a vida produtiva das pessoas (Christopher Farrell e outros, The Economics of Age, 1994). Por isso, muitos técnicos já desconfiam que os atuais sistemas de seguros e aposentadorias estão baseados em pressupostos errados.

O leitor dirá que essas são histórias de Primeiro Mundo e que nada tem a ver com a nossa realidade. Errado. Esses fatos provam que uma aposentadoria digna na velhice depende de boas contribuições que os idosos fizeram ao longo da sua vida ativa. Por sua vez, boas contribuições dependem de bons empregos, da pujança da economia e do progresso da nação. Em outras palavras, sem desenvolvimento, a discussão sobre previdência cai no terreno das superficialidades.

No meio desse debate, apareceu uma curiosa novidade. Os historiadores descobriram que os seres humanos estão parando de trabalhar muito cedo. Na Inglaterra, por exemplo, a proporção de pessoas com 65 anos e mais que ainda estão na ativa é de menos de 10%; há 115 anos, em 1881, ela era de 73% (Paul Johnson, The Employment and Retirement of Older Men, 1994).

Ou seja, a medicina prolonga vida, a tecnologia eleva a produtividade mas os homens param de trabalhar cedo - sobrando para a sociedade a tarefa de encontrar apoio para uma velhice cada vez mais longa. Os sistemas previdenciários atuais, Brasil inclusive, não foram desenhados para isso. Ao contrário, eles partiram do pressuposto de que a maioria das pessoas morreria logo e trabalharia até o momento de morrer.

Um crítico irônico do atual caos da previdência me disse: "Temos duas alternativas: Ou encontramos um novo modelo de aposentadoria ou convencemos as pessoas a morrer mais cedo". No Japão, como foi difícil viabilizar a segunda alternativa, o país elevou a idade de aposentadoria de 60 para 65 anos. No Brasil, para os políticos que não querem o limite de idade de 60 anos, sobra a segunda alternativa...

No mundo inteiro, a população que mais cresce é a dos velhos. E, isso vem se acelerando. Na França, por exemplo, o grupo de pessoas com 65 anos e mais, que em 1835 representava 9% da população total, levou 150 anos para chegar a 22%. Nos dias atuais, a China dará esse salto em apenas 35 anos (Asia Yearbook, 1995). Quase o mesmo ocorrerá no Brasil.

Como manter toda essa gente com uma boa aposentadoria? Pelos resultados de pesquisas, vê-se que o mecanismo mais eficiente para enfrentar tal problema é o que se baseia na poupança das próprias pessoas. Ou seja, a "dolce vita" de Fort Collins só é possível porque os velhinhos pouparam bastante nos fundos de pensão que hoje sustentam sua aposentadoria.

Essa é a realidade. De nada adianta apoiar a discussão sobre previdência em lances de demagogia e frases de efeito. A emotividade não nos leva a lugar algum nesse campo. A questão é de uma frieza brutal. Quem não tem condições de acumular bons recursos enquanto trabalha será fatalmente condenado a uma velhice precária.