Publicado em O Jornal da Tarde,25/09/1996
Despesas inúteis
Você tem seguro de automóvel? Eu tenho. E cerca de 70% dos brasileiros também têm. As seguradoras faturam R$ 5 bilhões por ano com esse tipo de seguro. A apólice cobre, dentre outras coisas, a responsabilidade por danos pessoais.
Por quê, então, você e eu que possuímos seguro voluntário - e que cobre praticamente tudo - temos de pagar o seguro obrigatório? A única resposta é porque ele é obrigatório (Lei 6.194 de 19 de Dezembro de 1974). Para constatar que estamos pagando esse seguro inutilmente, há 22 anos, responda as perguntas abaixo:
1. Você alguma vez usou o seguro obrigatório? Sim Não
2. Você conhece alguém que usou? Sim Não
3. Se você precisar usar, sabe como fazer? Sim Não
4. Você conhece a seguradora desse seguro? Sim Não
5. Você sabe como obter informações sobre ela? Sim Não
Se você respondeu "sim" a todas as perguntas, estou escrevendo para um gênio! Eu só consegui um "sim" na quarta pergunta. Isso porque, muito recentemente, aprendi que existe um consórcio de seguradoras para "bancar" o seguro obrigatório. Não me pergunte quem faz parte desse consórcio e muito menos seu endereço ou telefone.
Essa é apenas uma das centenas de leis criadas para beneficiar terceiros, e não a quem paga. O assunto está brilhantemente tratado no trabalho de José Luiz Carvalho (Usos e Abusos da Regulamentação Econômica, 1996). Ele estimou quanto é pago para o seguro obrigatório por quem já tem seguro voluntário: R$ 362 milhões por ano!
Trata-se de um custo colossal e absolutamente desnecessário. é um seguro sem benefício, uma vez que a própria lei impede usar as duas apólices em caso de sinistro. O pagamento desse seguro é uma mera transferência de recursos às seguradoras. Ao longo dos 22 anos, elas embolsaram R$ 8 bilhões dos que possuem o voluntário e o obrigatório, sem contar os juros acumulados - o que dá uma fábula!
Esse é um belo exemplo dos chamados "custos de transação". O tema foi objeto do seminário organizado pela Confederação Nacional da Indústria e Instituto Liberal na semana passada. Vários outros casos foram apresentados. Geoffrey Shepherd tratou do custo da burocracia. Ele me disse que nos países avançados gasta-se de 3 a 5 dias para se abrir uma nova empresa enquanto que, no Brasil, isso toma mais de 90 dias.
Roberto Fendt e Amaury Temporal mostraram que para julgar R$ 1.000, a Justiça do Trabalho gasta R$ 1.000. Ao incluir as despesas com advogados e outros custos, para dirimir uma ação naquele montante, verifica-se que a sociedade paga muito mais de R$ 1.000. Ou seja, a taxa de retorno da Justiça do Trabalho é negativa.
Se calcularmos todos os custos de transação que castigam o Brasil e que têm retorno negativo - a ineficiência dos portos, as rodovias mal conservadas, a degradação das ferrovias, os impostos em cascata, os custos dos cartórios e tabelionatos, a lentidão da justiça em geral e tantos outros, isso nos levaria a um número alucinante. Mas, ele tem de ser calculado; gradualmente reduzido; e, por fim, eliminado. Afinal, o nosso futuro depende de custear apenas as coisas úteis e necessárias, acabando-se com as perdas e detonando os custos que beneficiam apenas os protagonistas do corporativismo.
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