Publicado em O Jornal da Tarde,18/12/1996
Conhecimento e sucesso
Muita gente confunde conhecimento com escolarização. Nada mais falso. O conhecimento é produto de um processo que ocorre ao longo de toda a vida. A escolarização é a aprendizagem que se concentra nos anos de escola.
No mundo do futuro, o sucesso no trabalho vai depender de muito conhecimento. Quem tiver conhecimento terá cacife para competir. Quem não tiver, dançará.
A Organização para a Cooperação Econômica e Desenvolvimento (OECD) acaba de publicar duas pesquisas realizadas em seis países superdesenvolvidos (Alemanha, Holanda, Suécia, Suíça, Canadá e Estados Unidos) e um em fase de transição (Polônia). Elas examinaram o nível de conhecimento (baixo, razoável, médio e alto) das pessoas em três áreas: linguagem; uso de documentos; e matemática. O domínio desses conhecimentos é considerado como o "kit de sobrevivência" para o mundo do futuro (OECD, Literacy, Economy and Society, 1995; OECD, Measuring what People Know, 1996).
Qual é o seu palpite? Será que a maioria das pessoas ficou no nível alto? Nada disso. Os resultados, resumidos abaixo, foram surpreendentes.
1. Cerca de 50% dos adultos pesquisados ficaram entre os níveis fraco e razoável.
2. O nível de conhecimento vem apresentando um impacto crescente sobre a produtividade, a renda e o sucesso profissional. Muitas carreiras são retardadas por falta de conhecimento.
3. O número de anos que as pessoas ficam na escola é apenas um dos indicadores do seu nível de conhecimentos. A escolarização dá uma enorme vantagem, sem dúvida. Mas, muitas coisas são aprendidas depois dela - no trabalho. No mundo do futuro, não será suficiente ser escolarizado e possuir um diploma. Será necessário conhecer.
4. Os conhecimentos são como os músculos: precisam ser exercitados continuamente. A escola produz a matéria prima para as pessoas praticarem esses exercícios o resto da vida.
Os pesquisadores concluíram que a maioria dos americanos, canadenses, ingleses, alemães, holandeses, suecos, suíços e poloneses, não possui os conhecimentos básicos para progredir no futuro. Logo pensei: e os brasileiros?
Mas o grande choque veio quando examinei os testes usados para medir o nível de conhecimentos. Um dos mais fáceis é a leitura e interpretação de uma bula de remédio (aspirina). Outro, é a compreensão de um gráfico que relaciona a produção de fogos de artifício com o número de vítimas de queimaduras. Há exames que envolvem conversões de graus centígrados para farenheite; projeções de consumo de energia à partir de crescimento demográfico; análise de mapas metereológicos; e cálculos de calorias dos alimentos que comemos.
Parece mentira, mas esses são os conhecimentos considerados essenciais para as primeiras décadas do próximo milênio. O que antes era conhecimento especializado, no futuro, será considerado conhecimento básico.
Ao pensar na situação brasileira onde nossa força de trabalho possui apenas 3,5 anos de escola e má escola, confesso que perdi o sono. Esse ponto de partida é muito precário para a aprendizagem de conhecimentos adicionais.
Às vezes começo a pensar: não seria melhor desconhecer esses fatos? Não há dúvida que, ignorando-os, qualquer um de nós dormiria melhor. Só que não poderia nunca mais acordar.
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