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Publicado em O Jornal da Tarde,04/01/1996

Aparência e competência

O verão é o tempo das dietas, caminhadas e malhação. é a busca da boa forma. A praia, a piscina e o esporte exercem forte pressão para cada um de nós se apresentar na sua melhor linha.

Mas, será que o visual das pessoas tem algum peso na hora delas conseguirem um emprego? Esse é o tema de pesquisas recentes nos campos da sociologia do trabalho.

Os estudos à respeito partem da concepção popular segundo a qual o que é bonito é bom. Nesse contexto, as pessoas mais atraentes seriam percebidas de maneira mais favorável quando comparadas com as menos atraentes. A beleza, o charme e a simpatia teriam um forte peso na avaliação dos candidatos e na conquista de um emprego.

Examinando trabalhos anteriores e estudando uma amostra de quase 7.000 informantes, Linda A. Jackson e seus colegas da Michigan State University, procuraram testar essa hipótese (Physical Attractiviness and Intellectual Competence, Social Psychological Quarterly, Vol. 58, nº 2, 1995) tendo chegado às seguintes conclusões.

De fato, os indivíduos de boa aparência, especialmente os homens, são percebidos como mais competentes do que os de má aparência. Não há dúvida que o visual do candidato tende a afetar a percepção que as pessoas têm sobre a sua competência.

Leslie Martel e Henry Biler (Stature and Stigma, D. C. Heath, 1995), dizem que a mesma coisa acontece com a estatura das pessoas. Eles pesquisaram várias centenas de estudantes universitários que foram solicitados a associar qualidades pessoais à altura. Para a maioria dos entrevistados, os seus colegas com menos de 1,55 mts., em relação aos mais altos, foram percebidos como menos maduros, menos positivos, menos seguros, menos masculinos, menos capazes, menos confiantes, menos independentes, mais inibidos, mais tímidos e mais passivos. O pior é que, numa auto-avaliação, os próprios baixinhos revelaram-se descontentes com seu corpo.

O último número da Revista Economist, tocando nesse assunto, diz que o ideal ocidental é uma altura de 1,80 mts. Os mais altos teriam mais chances na vida. A Revista cita o caso da política. Na esmagadora maioria das eleições presidenciais americanas, por exemplo, os candidatos mais altos venceram facilmente os mais baixos. A mesma matéria revela que a maioria dos alto-executivos americanos tem mais de 1,80 mts. e que a maior parte das mulheres associa os homens mais altos com competência, vivacidade e vigor sexual ("Short Guys Finish Last", The Economist, 23-12-95).

O assunto é fascinante mas os resultados iludem um pouco. Em todas essas pesquisas, há duas importantes qualificações a fazer. Em primeiro lugar, elas mesmas mostram que o favoritismo dos mais charmosos começa a declinar na medida em que os avaliadores vão colhendo informações objetivas sobre competência dos avaliados. Em segundo lugar, os dados revelam inexistir evidências que apóiem a concepção popular de que o bonito é o bom. Na verdade, não há nenhuma relação, por exemplo, entre um bom visual e inteligência ou grande estatura e alto QI.

Isso, porém, não desmente o fato de que uma boa aparência cria uma disposição inicial positiva do avaliador em relação ao avaliado. Esse favoritismo ocorre não só na hora de se recrutar um candidato como até mesmo nos primeiros dias de aula na escola. Os resultados dos estudos resenhados indicam, inequivocamente, que a primeira impressão das pessoas tende a favorecer inconscientemente crianças e adultos mais atraentes.

Mas, nem tudo são rosas para essas pessoas. Na medida em que o avaliador vai observando a competência real do avaliado, através de provas mais objetivas, o favoritismo inicial vai desaparecendo. Isso cria um problema sério para o avaliado. Ou seja, as pessoas de boa aparência têm, durante um longo período, o pesado ônus de demonstrar que a sua aparência é responsável pela sua competência, o que não é fácil - para não dizer, impossível.

Se os mais belos e os mais altos têm esse ônus, os mais feios e os mais baixos, por sua vez, têm a difícil missão de impedir que os seus avaliadores formem uma opinião precipitada sobre a sua competência na base de sua aparência - o que me faz concluir que, nos dois casos e por linhas tortas, o visual conta muito. Por isso, utilize o verão para caprichar na sua aparência mas não esqueça um só minuto de cuidar - muito bem! - da sua competência. Aproveite as férias para estudar um pouquinho e tenha um Feliz Ano Novo!