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Publicado em O Jornal da Tarde,28/08/1996

Desemprego e Criminalidade

Não há dúvida que a deterioração social contribui para o crime. O quadro do emprego no Brasil é grave. Em 1995, a força de trabalho aumentou mais de 3% e o emprego formal, apenas 1,5%. Para equilibrar a situação, o país precisaria investir uns 25% do PIB e crescer mais de 6% ao ano. Estamos investindo 16% e crescendo a 4%. Isso é insuficiente. Além disso, a qualidade da educação é baixa e a rigidez da legislação trabalhista é alta. Tudo isso conspira contra a geração de postos de trabalho e agrava a situação social.

Mas, o crime não pode ser reduzido a esses fatores. Os que assim fazem acabam tratando os criminosos como vítimas sociais. Por essa teoria, eles precisariam de sanatórios e não de cadeias quando se sabe que os criminosos são "experts" em enganar os psiquiatras e os membros dos júris.

O seu jogo predileto é exatamente o de convencer os outros que eles são doentes resultantes de injustiças sociais. Os criminosos, entretanto, são seres racionais e calculistas. Eles sabem muito bem como distinguir o certo do errado. Muitos conhecem melhor as leis do que seus advogados.

O que confunde as pessoas é que certos crimes ocorrem com tamanha rapidez que parecem ser fruto de compulsão. Nada disso. A velocidade é sinal de que os criminosos são bons no que fazem. Trata-se de habilidade e não de compulsividade.

Não há dúvida que as instituições pesam. As pessoas são produto de suas famílias; das escolas; do ambiente em que vivem, etc. Todavia, nada justifica exagerar a sua importância. é muito fácil dizer que "a família não cuidou da criança"; que "a televisão é criminogênica"; que "o Estado não favorece o emprego". Mas, o crime não se reduz a isso. Essas "teorias" estão erradas. Se fossem certas, a maioria da população era criminosa.

Culpar as instituições é tão cômodo quanto falso. Tudo é justificado. Quando o pai é severo, diz-se que o jovem se tornou delinqüente como resposta ao excesso de rigor. Quando o pai é permissivo, o crime foi produto da indulgencia. Quando ele pratica um meio-termo democrático, a violência resultou da sua indiferença. E quando é um pouco de cada estilo, a criminalidade é fruto da sua inconsistência.

As pesquisas mostram que os criminosos, apesar de terem diferentes origens, têm uma concepção muito semelhante do mundo em que vivem. Eles tendem a encarar a sociedade como um tabuleiro de xadrez sobre o qual pensam ter controle total para dispor de seus semelhantes de acordo com sua vontade.

Os criminosos acreditam possuir direitos para invadir a propriedade dos outros, tocarem nos seus corpos, liquidarem suas vidas - do modo que lhes parecer mais prático - pouco ligando para as perdas, a dor e o sofrimento das verdadeiras vítimas. Confiança, amor e solidariedade são conceitos incompatíveis com seu "estilo de vida". Eles têm uma lógica própria; uma inteligência especial.

Durkheim dizia que mais importante do que a severidade da pena é a sua visibilidade. A sociedade precisa mostrar aos criminosos potenciais que a vida após o crime é mais dura do que antes do crime. Toda vez que a televisão apresenta imagens de presidiários tomando sol, batendo bola e jogando cartas, ela faz o inverso. E quando os criminosos potenciais percebem que polícia, justiça e presídios são insuficientes e ineficientes, isso passa a ser um verdadeiro convite ao crime.

Em um estudo sobre o custo do crime na Grande São Paulo, verifiquei que a probabilidade de um infrator ser (1) preso em flagrante; (2) ser indiciado pela polícia; (3) ser julgado pela justiça; (4) ser condenado; (5) e cumprir a pena estabelecida pela sentença é de apenas 0,001483 (José Pastore e colaboradores, Crime e Violência Urbana, São Paulo: FIPE). Ou seja, para cada mil delitos praticados, apenas um chega à reta final. O risco do crime é irrisório.

é claro que os criminosos não lêem os meus estudos. E, nem precisam. Eles percebem na prática o que é detectado por pesquisas trabalhosas. Sabem muito bem que o crime está compensando nos dias atuais.

O que fazer? é vidente que os fatores sociais têm um grande peso na determinação do crime. Mas, a precariedade dos aparelhos policial e judicial precisa ser urgentemente superada. é isso que foi feito em New York onde a sociedade continuou a mesma; o desemprego não se alterou; e as famílias seguiram criando as crianças da mesma maneira. E, por meio de medidas eficientes na área policial e judicial, o crime despencou 30% nos últimos dois anos.