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Publicado em O Jornal da Tarde, 04/01/1995

O custo da morte

O ex-Deputado Amaral Netto foi autor de um polêmico projeto de lei em 1994 que visava realizar um plebiscito sobre a pena de morte no Brasil. Diante de tanto crime e tanta violência, era bem provável que a maioria da nossa população optasse pela pena capital.

é claro que, durante a campanha, surgiriam muitos argumentos contra a idéia baseados na desumanidade e na ineficiência de tal radicalismo. Estudos recentes, porém, estão adicionando uma razão nova contra a pena de morte: matar legalmente é muito caro.

Os inúmeros recursos interpostos pelos advogados do condenado à morte, estão elevando o custo da morte de maneira astronômica. Nos Estados Unidos, gasta-se cerca de US$ 2,5 milhões para matar um infrator. Essa cifra surpreende até mesmo os defensores da pena de morte. O estado da Florida, por exemplo, gastou no ano passado cerca de US$ 60 milhões para matar 18 criminosos - o que dá mais de US$ 3 milhões per capita.

Nisso tudo, porém, há um perverso paradoxo. Se a morte legal está cada vez mais cara, a morte ilegal está cada vez mais barata. Em um estudo sobre o custo do crime na Grande São Paulo, encontrei um resultado assustador. A probabilidade de um infrator ser (1) preso em flagrante; (2) ser indiciado pela polícia; (3) ser julgado pela justiça; (4) ser condenado; (5) e cumprir a pena estabelecida pela sentença é de apenas 0,001483 (José Pastore e colaboradores, Crime e Violência Urbana, São Paulo: FIPE).

Traduzindo em palavras mais simples, isso significa que, entre nós, para cada mil delitos praticados, apenas um chega à reta final. Ou seja, o risco do criminoso é irrisório. O crime compensa. E compensa bastante.

é irônico verificar, assim, que matar na cadeira elétrica está se tornando proibitivo enquanto que matar nas ruas da cidade é extremamente convidativo. Uma série de interessantes reportagens publicadas pelo Jornal da Tarde no mês de Novembro de 1994, revelou que, só na capital de São Paulo, ocorriam 550 mortes por mês! Como se vê, era muito fácil matar ilegalmente.

O que fazer? é claro que os fatores econômicos e sociais tem um grande peso na determinação do crime. A desigualdade social, em especial, é altamente criminogênica - muito mais do que a pobreza. Sociedades pobres e homogêneas como a China apresentam taxas de crime bem inferiores do que sociedades ricas e heterogêneas como é o caso dos Estados Unidos.

Mas, além da desigualdade, a vitalidade dos aparelhos policial e judicial. A Revista The Economist de Abril de 1994 publicou uma pesquisa demonstrando que o grande segredo da segurança das ruas do Japão reside exatamente da presença visível e eficiente de policiais que se plantam nos locais de alto risco, equipados com mapas, rádio, e até mesmo com dinheiro para ajudar a pagar a condução daquele que bebeu o seu último tostão. Os policiais japoneses são super-equipados. O Japão possui um banco de dados com fotografias que permite identificar um suspeito em questão de segundos. Possui também um sistema de células fotográficas que contrasta o carro que passa com um arquivo de carros roubados.

Mas, não é só a polícia que funciona bem. O Japão leva às grades cerca de 96% dos homicídios e 76% dos roubos. Isso é muito mais alto do que na maioria dos países adiantados. E nem se compara com o que ocorre no Brasil onde a probabilidade de aplicação de uma pena para um criminoso preso em flagrante é de apenas um por mil.

O Japão nos ensina uma coisa muito importante. Vale mais a pena prevenir o crime do que calcular o custo das cadeias e das cadeiras - elétricas. Não há dúvida de que o alto índice de desenvolvimento humano daquele país (IDH) e o baixo nível de desigualdade têm uma grande responsabilidade pela baixa criminalidade. Mas, quando se compara o Japão com outros países igualmente adiantados como é o caso da Alemanha, França, Itália e Estados Unidos verifica-se que ali o uso de drogas é mínimo; o número de homicídios é irrisório; os roubos são muito raros.

De tudo isso concluí-se que, ao lado de pesados investimentos em educação e desenvolvimento, é imperioso a aplicação de grandes somas de recursos no aperfeiçoamento da polícia e da justiça no Brasil. A estratégia é clara: Temos de elevar consideravelmente o custo do crime neste país.