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Publicado no O Estado de São Paulo, 12/09/00

Como ampliar o mercado formal?

Uma das questões mais desafiadoras na área trabalhista é como formalizar o enorme mercado informal das micro e pequenas empresas que contratam milhões de trabalhadores sem registro em carteira.

O Brasil fez duas experiências nesse campo: a opção pelo SIMPLES e a Lei 9.601 que trata do contrato por prazo determinado.

Ambas proporcionam às empresas uma economia de aproximadamente 19% nas despesas de contratação formal. A primeira pegou, a segunda falhou. Por que?

1. A opção do SIMPLES foi adotada em janeiro de 1997. Em estudo cuidadoso (“Boletim Informativo GFIP - Avaliação dos Dados”, Brasília: MPAS, Ano 1, no. 2, 2000), José Cechin e Alexandre Z. Fernandes acompanharam cerca de 1.130 mil empresas existentes em janeiro de 1996, e que se ajustavam à opção do SIMPLES.

Naquele ano, tais empresas empregaram 773 mil trabalhadores com registro em carteira. Em 1998, depois de um ano de enquadradas no SIMPLES, elas já estavam empregando 1.314 mil trabalhadores - quase o dobro. E em 1999, passaram a empregar 3,5 milhões de pessoas - quase cinco vezes mais.

Os autores mostram que a maior parte desse espetacular incremento não foi devida à geração de novos postos de trabalho e sim à formalização dos empregados existentes. Ou seja, o SIMPLES está ajudando formalizar o nicho que mais precisava ser formalizado, o das micro e pequenas empresas. Por isso, vem cumprindo o seu papel.

2. A Lei 9.601, que trata da contratação por prazo determinado, entrou em vigor em janeiro de 1998. Entre 21 de janeiro de 1998 até 11 de janeiro do ano 2000, o Ministério do Trabalho e Emprego estima que apenas 17 mil trabalhadores foram contratados na nova modalidade através de 605 acordos ou convenções coletivas.

O Brasil inteiro observa que essa lei não pegou. Os dirigentes sindicais costumam apontá-la como retumbante exemplo de fracasso no terreno da flexibilização do trabalho.

Se os dois mecanismos propiciam a mesma economia de despesas para as empresas, como explicar o sucesso de um e o insucesso de outro?

Muito simples. O SIMPLES é simples e a Lei 9.601 é complicada.

No primeiro caso, além da redução de despesas, o SIMPLES diminuiu substancialmente a infernal burocracia contábil. No terreno trabalhista, os donos das micro e pequenas empresas é que decidem quem contratar e quando contratar. São eles também que deliberam assinar a carteira de trabalho dos seus (atuais) empregados informais.

No caso da Lei 9.601 deu-se o inverso. Havendo o interesse em contratar um empregado com registro em carteira, o dono de uma pastelaria, barbearia ou papelaria, por exemplo, tem de chamar o sindicato correspondente, fazer com ele uma negociação, assinar um acordo coletivo e provar para o fiscal do trabalho que o novo contratado não alterou a média de empregados do quadro de pessoal e a folha salarial que a empresa tinha no segundo semestre de 1997.

Além da assustadora complicação, nada disso faz parte do repertório das micro e pequenas empresas. Elas não estão acostumadas a negociar e firmar acordos coletivos com entidades sindicais. Nem têm “know how” para isso.

Ademais, é estranho que uma lei tenha dado aos sindicatos o direito de decidir quando e quantos empregados podem ser contratados pela empresa. Com esse extraordinário poder de veto, eles podem impedir a contratação de empregados até mesmo numa grande empresa.

Bem diferente é a opção do SIMPLES. O micro ou pequeno empresário contrata e assina a certeira, e o contador faz os cálculos e cuida dos recolhimentos. Tudo é feito de maneira expedita, sem interferência de terceiros.

Com base nesse sistema, o Brasil vai dando um grande salto na formalização de pessoas que ficaram anos a fio trabalhando de modo precário.

Isso prova que mais importante do reduzir despesas é simplificar a contratação dos trabalhadores.

Prova também que, reduzindo outras despesas, (que podem até aliviar a renúncia fiscal provocada pelo SIMPLES), o Brasil tem condições de formalizar uma grande parcela dos 60% de brasileiros que formam o mercado informal. A informalidade castiga os trabalhadores pela desproteção, e prejudica a previdência social pela sonegação. Precisa ser reduzida.