Publicado em O Jornal da Tarde, 08/10/1998
Proteções que discriminam
Os americanos fazem uma nítida distinção entre leis trabalhistas e leis do emprego. As leis trabalhistas são muito poucas, e estabelecem parâmetros e regras em apenas cinco áreas: salário-mínimo, previdência social, seguro-desemprego, saúde e segurança, e treinamento.
As leis do emprego referem-se aos direitos humanos, impedindo discriminar por sexo, idade, raça, religião, escolha sexual, opção política, veteranos de guerra, etc.
Essas leis têm protegido bastante mas, ao mesmo tempo, têm gerado inúmeros exageros. Muitas empresas, por exemplo, estão sendo obrigadas a proibir o uso da Internet porque, na tela, pode aparecer uma figura que transforma um ambiente sadio em ambiente hostil para as moças - passível de processo judicial sobre assédio sexual. Muitos recrutadores evitam perguntar aos candidatos onde foram criados porque isso pode denotar um interesse em tentar descobrir a sua origem racial – o que é interpretado como discriminação.
Esses exageros estão transformando o ambiente de trabalho num espaço de suspeição e desconfiança. Os administradores de empresa são instruídos para "nada falar pois, toda vez que abrirem a boca ou escreverem algo, estarão atraindo uma enorme carga de responsabilidade".
As leis anti-discriminação foram inicialmente introduzidas para superar a brutalidade racial que imperava no país desde a Guerra da Secessão. Mas, depois da aprovação das leis dos idosos (1967), "deficientes" (1990) e direitos civis (1991), as ações judiciais decorrentes passaram a crescer na base de 15% ao ano, estendendo-se para as áreas das doenças mentais, paraplégicos, gays, lésbicas, obesidade, etc., criando um dos campos de trabalho mais promissores para os advogados.
Perdendo ou ganhando, as custas para levar avante uma defesa na área de assédio sexual chegam, em média, a US$ 100 mil; no caso de deficientes, 130 mil; na área da discriminação racial, US$ 150 mil; e na discriminação por idade, US$ 200 mil (Walter Olson, The Excuse Factory, 1997).
As indenizações, são estonteantes. Um tribunal de New York multou uma empresa de telecomunicações em US$ 7 milhões porque substituiu dois executivos idosos por outros mais jovens e ganhando menos. Discriminação de idade!
Além das leis, os tribunais passaram a gerar uma enorme jurisprudência que, para o administrador não especialista, se tornou um desafio impossível de entender. Um policial admitido na polícia de Boston, disse na sua entrevista de recrutamento que nunca fora hospitalizado. Depois de algum tempo, a polícia descobriu que ele havia sido internado várias vezes por alucinação e outros problemas mentais e, por isso, o demitiu. Levado o caso ao tribunal, este decidiu pela reintegração do policial, pois a lei dos deficientes proíbe aos empregadores utilizarem a história pregressa sobre a saúde dos candidatos.
Uma mulher exageradamente gorda não foi aprovada pela loja de produtos dietéticos que tentava recrutar uma balconista. O tribunal da California deu ganho de causa à reclamante por considerar a negativa como discriminação à uma deficiência involuntária – como o diabetes.
Essas leis são tema de debate público mesmo porque, estudos recentes, mostram que o número de deficientes caiu de 34% para 30% e os gastos do governo federal com os programas especiais cresceram de US$ 27 bilhões para US$ 37 bilhões (entre 1990-95). Os discriminados vem sendo empregados de maneira marginal. Esse parece ser mais um caso em que o excesso de proteção vira discriminação. Convém meditar sobre o assunto.
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