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O ESTADO DE S. PAULO
25 de julho de 2019
A proteção do trabalho fora do emprego
José Pastore
Ao se aproximar a aprovação da nova Previdência Social, o Brasil precisa se preparar
para garantir proteções aos que trabalham fora da relação de emprego.
Durante muito tempo o emprego convencional, subordinado, com habitualidade,
assalariado, por prazo indeterminado e em tempo integral, será o predominante. Mas, ao
lado dele, cresce o trabalho atípico, flexível, casual, independente, autônomo, por
projeto, em plataformas digitais e outras que se afastam do vínculo empregatício.
Na Europa e nos Estados Unidos um quarto das pessoas trabalha dessa maneira. A
tendência é de um crescimento acelerado. Na Inglaterra, entre 2016 e 2018, a incidência
do trabalho independente dobrou. No Brasil, são mais de 20%. Como proteger esse
tipo de trabalho? Afinal, o trabalhador independente também adoece, acidenta-se,
envelhece e morre. E o sistema de Previdência Social precisa arrecadar receita para
poder proteger essas pessoas.
Uma das características dos trabalhadores independentes é o constante ziguezague ao
longo da vida. Com frequência, eles passam do emprego para a independência e vice-
versa. profissionais que são empregados nos horários regulares e freelancers no
tempo livre.
Para esse tipo de trabalho, as proteções precisam acompanhar as pessoas e não os
empregos. Portabilidade e customização são conceitos-chave.
Nos países avançados, a aposentadoria dos autônomos baseia-se em contribuições
individuais aos planos de previdência social e de seguros. Em certos casos, a
contribuição é obrigatória; em outros, é voluntária.
Quando as contribuições ficam inteiramente por conta dos profissionais, as alíquotas
são muito altas. para aposentadoria, os autônomos da Europa pagam, em média,
18,8% dos seus rendimentos. Na República Checa, são 28%; na França, 23%; na
Áustria, 22,8%; na Grécia, 20%; na Bélgica, 19,6%; na Alemanha, 19,5%. Nos Estados
Unidos, 15,3%.
Alíquotas exageradas provocam pouca adesão. Isso tem levado muitos países a adotar o
compartilhamento entre prestadores e tomadores dos serviços e também governo. A
Alemanha tem um modelo interessante. Os autônomos podem trabalhar por conta
própria em profissões certificadas (cerca de 300). No caso dos artistas, por exemplo,
eles contribuem com 10% de sua receita; os promotores dos espetáculos, com 6%; e o
governo, com 4%.
países que têm programas integrados de aposentadoria, planos de saúde, seguros de
acidentes, proteção contra a desocupação e licenças-maternidade e paternidade, com
frequência, com a referida coparticipação.
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A proteção do trabalho independente é crucial, não apenas para os próprios
trabalhadores, mas também para a Previdência Social, que nos dias atuais depende
quase que inteiramente das contribuições de empregados e empregadores categorias
em declínio.
No Brasil, as proteções para o trabalho independente caem nos campos da assistência
social e da Previdência Social. No primeiro, tem destaque a proteção garantida pelo
Sistema Único de Saúde (SUS), pelo Programa Bolsa Família e pelo Benefício de
Prestação Continuada.
No campo previdenciário, quatro programas para proteger o trabalho fora do
emprego: 1) o que é garantido pelo INSS mediante recolhimento da contribuição
previdenciária pelo tomador dos serviços e por meio de Recibo de Profissional
Autônomo (RPA); 2) o Programa do Microempreendedor Individual (MEI); 3) a
modalidade de contribuinte voluntário; e 4) a do contribuinte facultativo. Todos com
aplicação e sustentação limitadas. Uma avaliação será objeto de um próximo artigo.
*PROFESSOR DA FEA-USP E MEMBRO DA ACADEMIA PAULISTA DE LETRAS. É
PRESIDENTE DO CONSELHO DE EMPREGO E RELAÇÕES DO TRABALHO DA
FECOMERCIO-