CORREIO BRAZILIENSE
05 de outubro de 2018.
O funcionalismo e a reforma do Estado
Jose Pastore
O governo propôs adiar o aumento dos funcionários federais para 2020. Estes
acionaram o Supremo Tribunal Federal, argumentando que eles ganham pouco e que a
Constituição Federal proíbe a redução de salários. É preciso entender bem o significado
do adiamento proposto e da reclamação judicial. Quanto ao primeiro argumento,
pesquisas do Banco Mundial revelam que os salários médios dos servidores públicos
brasileiros estão acima do equivalente em 53 países pesquisados por aquela instituição.
Quando comparados com os profissionais de igual educação e experiência dentro do
Brasil, os servidores recebem 67% a mais do que seus colegas do setor privado, sem
contar o grande número de benefícios, em especial, nas empresas estatais.
Convém lembrar que 55% dos funcionários públicos brasileiros estão no grupo dos 20%
mais ricos e 77% estão no grupo dos 40% mais ricos. Grande parte tem estabilidade de
emprego e aposentadoria pelo último salário — que são prêmios valiosos. Dados
recentes indicam que o governo federal gastou R$ 260 milhões em agosto último para
cobrir licenças remuneradas e garantidas por lei. Só com licença-prêmio foram R$ 29
milhões; com pós-graduação, mais de R$ 90 milhões. Estabilidade e regalias desse tipo
inexistem no setor privado. Enfim, é difícil justificar o reajuste imediato no momento
em que todos os brasileiros apertam o cinto. O Banco Mundial propôs um alinhamento
gradual dos salários do setor público com os do setor privado. Um congelamento dos
salários dos servidores federais reduziria a diferença em relação ao setor privado para
36%, em 2021, e 16% em 2024.
Quanto ao segundo argumento (ilegalidade), de fato, a Constituição de 1988 prevê que
os salários só podem ser reduzidos por negociação coletiva. O Poder Executivo não está
reduzindo os salários, mas, sim, adiando um aumento. Os funcionários interpretam que
sem reajuste, há uma redução salarial devido à inflação. Com exceção do Inciso V do
art. 7º que prevê a manutenção do poder de compra do salário mínimo, os demais
dispositivos da Constituição tratam de salário, e não de “salário real”. Repetindo, o
governo não propôs reduzir os salários. Ao contrário, eles serão mantidos até 2020.
Vejo muitos presidenciáveis apoiando a pretensão dos funcionários para conquistar seus
votos em lugar de propor uma efetiva reforma do Estado. Não vi nenhuma proposta que
trate da melhoria da produtividade do setor público.