O ESTADO DE S. PAULO
30 de agosto de 2018
Remuneração e desempenho do Judiciário
José Pastore
A proposta de 16,38% de aumento para os salários dos ministros do
Supremo Tribunal Federal (STF) criará uma despesa fantástica para
todo o funcionalismo. Como avaliar a proposta? Qual tem sido o
desempenho daquele Poder?
Nas páginas do excelente relatório Justiça em Números 2017,
publicado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), encontrei o
seguinte:
- o quadro de pessoal do Poder Judiciário brasileiro é um dos maiores
do mundo: 442.365 profissionais (pág. 182);
- a despesa total em 2016 chegou a quase R$ 85 bilhões (pág. 37);
- entre 2009-2016, o estoque de processos não solucionados aumentou
31%, ou seja, 4,5% ao ano (pág. 182);
- em 2016, a taxa de congestionamento de processos não solucionados
chegou a 73%. Só 27% foram solucionados (pág. 182);
- o tempo médio das sentenças de primeiro grau na fase de execução foi
de 4 anos e 6 meses (pág. 133);
- apenas 12% dos conflitos foram resolvidos por meio de acordo entre
as partes (pág. 125).
Como se vê, o Poder Judiciário do Brasil se caracteriza por muitos
funcionários, grandes despesas, enorme lentidão e baixo poder de
conciliação dos conflitos. Será que os magistrados que desejam o
referido aumento salarial garantem para 2019 uma elevação da
eficiência de 16,38%?
Para a sociedade, o recurso à Justiça custa muito. Além dos R$ 85
bilhões do orçamento, as empresas gastam cerca de R$ 124 bilhões
com advogados, prepostos, viagens, etc. (dado de 2015), sem falar nos
gastos das pessoas físicas (não tenho dados). Isso torna a solução dos
conflitos pela via judicial demorada, cara e incerta.
Os magistrados proponentes do referido aumento consideraram a sua
remuneração incipiente, esquecendo-se de que os brasileiros que
ganham salários de R$ 33.700,00 por mês estão entre o 1% mais rico
do País, sem contar os generosos benefícios que recebem
gratificações, adicionais, prêmios, abonos, verbas de representação e
vantagens pecuniárias não contabilizadas pelos tribunais como
salários, das quais as mais conhecidas são o auxílio-moradia, o auxílio-
creche, o auxílio-refeição, o auxílio-paletó, o auxílio-livro, auxílio-voto,
auxílio-educação e auxílio-transporte. Esse emaranhado de regalias
impede saber qual é o custo real da Justiça no Brasil.
A remuneração atual dos ministros do STF é das mais altas do mundo.
Considerando apenas os 13 salários mensais, eles receberam em 2016
cerca de R$ 438 mil, ou seja, 122 mil (cotação em 2016 1 = R$
3,60), enquanto os magistrados das Supremas Cortes da União
Europeia receberam, em média, 65 mil. Essa comparação é
conservadora porque a despesa mensal real com cada magistrado
brasileiro indicada no citado relatório foi de R$ 47.700,00 (pág. 58).
O quadro se agrava quando se leva em conta que os magistrados
brasileiros têm 195 dias de folga, entre recesso, férias, feriados, pontes
e fins de semana. Eles trabalham 170 dias por ano, enquanto seus
colegas europeus trabalham 219 dias.
A boa Justiça é a que tem previsibilidade, rapidez e retorno positivo.
Isso é fundamental para o bom funcionamento da economia e da
sociedade.
É urgente criar condições para elevar a eficiência do Poder Judiciário.
Poderíamos começar com um aumento substancial dos dias
trabalhados e uma redução do excesso de benefícios. Ao mesmo tempo,
que fortalecer os mecanismos de mediação, conciliação e
arbitragem. E, finalmente, criar desestímulos à exagerada
judicialização, como fez a lei da reforma trabalhista, que em um ano
reduziu em 40% o número de ações na Justiça do Trabalho. Algum
presidenciável apoia essas ideias?
PROFESSOR DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO, É PRESIDENTE DO
CONSELHO DE EMPREGO E RELAÇÕES DO TRABALHO DA
FECOMERCIO-SP E MEMBRO DA ACADEMIA PAULISTA DE LETRAS