Sexta feira 07 de setembro de 2018
Quando a Justiça cria despesas
José Pastore
Um grave caso de ativismo judicial foi divulgado pela
grande imprensa recentemente. Trata-se da decisão da
Justiça do Trabalho em utilizar um índice de correção dos
débitos trabalhistas diferente do que consta em lei.
O que é o débito trabalhista? Toda vez que uma parte
recorre de uma sentença judicial, ela fica sujeita a pagar o
que deve mais na frente com o valor corrigido pela inflação.
Nada mais justo. Afinal, o reclamante não pode ser
prejudicado pela decisão do reclamado.
Isso sempre foi assim: os juízes corrigiam o débito
aplicando a Taxa Referencial Diária (TRD), acrescidos de
1% ao mês ou 12% ao ano. Entretanto, muitos juízes,
passaram a aplicar outro índice o Índice de Preços ao
Consumidor Amplo-Especial (IPCA-E),
também acrescido de 1% ao mês de juros ou 12% ao ano.
Para evitar que isso ocorresse, a Lei 13.467/2017 (reforma
trabalhista) reafirmou que os débitos trabalhistas devem ser
corrigidos pela Taxa Referencial (TR), acrescidos de 1% ao
mês ou 12% ao ano por conta dos juros de mora. Porém,
muitos juízes continuam aplicando o IPCA-E.
Esse tipo de indexação, além de arbitrário, coloca o valor
dos débitos trabalhistas na estratosfera. Por exemplo, uma
condenação no valor de R$ 30.000,00 na primeira
instancia, depois do recurso tramitar seis anos nos três
níveis do Poder Judiciário, passa a ter um valor de
R$ 74.575,44 quando corrigidos pelo IPCA-E mais 12% de
juros ao ano. Se aplicada a nova lei com o devido rigor, o
referido valor seria de R$ 54.470,44.
Ou seja, a aplicação do índice escolhido pelos juízes
provoca um acréscimo de R$ 44.575,44 sobre o valor da
condenação contra R$ 24.470,44 previstos na Lei
13.467/2017, criando arbitrariamente uma enorme despesa
de R$ 20.105,00 para quem recorre à Justiça do Trabalho.
A referida oneração tem impactos importantes, primeiro,
sobre as empresas e, segundo, sobre os trabalhadores. As
empresas serão obrigadas a fazer provisão de valores
altíssimos na sua contabilidade, o que comprometerá o seu
balanço, afetará a sua imagem e o seu valor na Bolsa de
Valores. Em decorrência disso, perdem os trabalhadores
porque as empresas terão reduzida a sua capacidade de
investir, expandir e criar novos postos de trabalho.
Pela magnitude da oneração, fica claro concluir não haver
aplicação financeira no Brasil que renda em seis anos o
montante indicado. Por exemplo: os títulos do Tesouro
Nacional (NTN-B) com vencimento em 2045 são ofertados
aos investidores pela taxa composta pelo IPCA mais um
juro real de 5,86% ao ano.
A vingar o critério dos juízes (IPCA-E + 12%), os credores
teriam na Justiça do Trabalho um rendimento real que é
mais do que o dobro do obtido em um título do Tesouro
Nacional. Um absurdo!
É claro que os reclamantes precisam que os valores em
disputa sejam protegidos contra a inflação. Mas, nada
justifica transformar essa correção no investimento mais
lucrativo do país. Sim porque, muitos credores e seus
advogados procurariam postergar a solução dos conflitos
agravando ainda mais o crônico congestionamento de
processos na Justiça do Trabalho.
Assim procedendo, esses juízes estão engrossando o
gigantesco Custo Brasil. Não tem o menor cabimento que
uma lei defina um indexador e a Justiça do Trabalho
aplique outro. Ademais, a definição de critérios de correção
monetária é da competência dos legisladores e não dos
magistrados. A estes compete aplicar as leis.
É urgente, portanto, a sustação da aplicação do IPCA-E
mais 12% de juros às dívidas trabalhistas. Afinal, o que
vale nesse caso: a lei ou o arbítrio de alguns juízes?
José Pastore é professor da Universidade de São Paulo, Presidente do Conselho de Emprego e Relações
do Trabalho da Fecomercio-SP e membro da Academia Paulista de Letras.