Sexta feira 05 de setembro de 2016
Alto preço de tributar o trabalho
José Pastore e Emerson Casali
Segundo o Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT), em 2013, para
distribuir um lucro de R$ 322 bilhões, as empresas recolheram em tributos um total de
R$1,46 trilhões. Esse é o Brasil. De todas as atividades realizadas pelo setor privado, o
“sócio Estado" fica com 354% a mais que os empreendedores. E faz isso com
tranquilidade e sem a menor preocupação em melhorar o ambiente de negócios do país.
No campo das relações trabalhistas, poucos anos atrás, três medidas eram
consideradas essenciais para a melhoria da produtividade e viabilização de negócios:
desoneração do emprego formal, valorização das negociações coletivas e permissão
para terceirizar qualquer atividade.
De para cá, o único avanço se deu no campo da desoneração do emprego formal para
as empresas do SIMPLES e de setores intensivos em mão de obra.
Mais recentemente, a Receita Federal passou a ser mais um órgão público para interferir
nas relações de trabalho, tendo, é claro, uma visão puramente arrecadatória. Ali se
examina cada vírgula das leis com olho em aumentar a coleta de contribuições e
impostos. Isso elevou ainda mais o prejudicial clima de litigiosidade e judicialização
que reina na área trabalhista. Para ilustrar, citaremos três exemplos.
1. Em decisão recente, o CARF, alinhando-se com a visão arrecadatória da Receita
Federal, mudou seu entendimento e julgou que se deve tributar como salário os gastos
das empresas com planos de saúde destinados a chefes, gerentes diretores e demais
executivos. A base legal para essa decisão é, no mínimo, duvidosa, pois, a CLT exige
que os planos de saúde comprados pelas empresas devem cobrir todos os seus
empregados. A referida lei o diz que a empresa tem de oferecer a mesma cobertura a
todos empregados. Por isso, soa como estranha e forçada a interpretação daquele
Conselho.
Tudo nos leva a concluir que, em busca de novos recursos, com a tecnocracia mudou de
ideia, dizendo: pensei melhor e acho que as empresas terão de recolher os 20% do INSS
no caso daqueles planos de saúde das chefias. E, mais do que isso, cobrarei multa e
juros sobre o passado, quando a contribuição (devida) não foi recolhida ao INSS.
A decisão foi absurda e, por isso, vai levar muitas empresas a desistir de planos de
saúde, prejudicando todos os trabalhadores. Outras recorrerão à Justiça, engrossando a
judicialização atual.
Ao mudar um entendimento pacificado como esse, a Receita Federal desorienta as
empresas e se une à Justiça do Trabalho para garantir que, no Brasil, nem o passado é
previsível, agravando, assim, a brutal e perniciosa insegurança jurídica que conspira
abertamente contra os investimentos e empregos.
2. Outro caso emblemático foi a mudança de interpretação sobre Participações de
Lucros e Resultados que deixou todo mundo no limbo. Por um voto, o CARF inverteu
sua visão, passando a considerar como isentos de contribuições previdenciárias apenas
os planos assinados antes do período de avaliação, o que é muito raro pela própria
dinâmica dos processos de negociação. Com isso, o “sócio Estado” passou inibir o uso
de um importante instrumento de produtividade, como previsto na Constituição Federal.
3. Por fim, citamos o caso das escolas que sempre deram bolsas para filhos de
empregados que, em muitos casos, jamais teriam acesso a uma educação de boa
qualidade. Por força da Lei 12.513/2011 (do PRONATEC), as despesas destinadas às
bolsas de estudo de empregados e dependentes passaram a ser tributadas. É tudo o que a
Receita Federal queria mais arrecadação. que isso gerou um passivo tributário
brutal para milhares de escolas que não sabem o que fazer. Muitas desistiram de
oferecer as referidas bolsas de estudo.
Nos três casos, os trabalhadores foram os maiores prejudicados. Há os que perderam os
planos de saúde; outros perderam os adicionais de PLR e, milhares, ficaram sem as
bolsas de estudo para seus filhos.
No momento em que o governo do Presidente Temer busca criar um ambiente mais
favorável para os negócios e os investimentos, é chegada a hora de se buscar modelos
que afastem a interferência tributária na área do trabalho que, de resto, está eivada de
reconhecida complexidade.
O “sócio Estado” precisa conter a sua gula e evitar reonerar de forma direta e indireta a
folha de salário e penalizar o desempenho das empresas. Precisamos criar condições
para que o "sócio empreendedor", que investe e trabalha, tenha boas condições para
produzir, gerar empregos, arrecadar e promover ganhos para toda a sociedade.
José Pastore é professor da Universidade de São Paulo, Presidente do CERT - Conselho
de Emprego e Relações do Trabalho da FECOMERCIO-SP e membro da Academia
Paulista de Letras. Emerson Casali é consultor em relações do trabalho e membro do
CERT.