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Pulicado em O Estado de São Paulo, 29/12/2015

O trabalho no Tratado Transpacífico

Estados Unidos, Canadá, México, Peru, Chile, Japão, Brunei, Malásia, Vietnã, Cingapura, Austrália e Nova Zelândia assinaram o Tratado Transpacífico (TPP) cujo escopo incorpora regras inexistentes nos acordos da OMC. Dentre elas, estão as trabalhistas.

Este sempre foi um assunto polemico no seio da Organização Mundial de Comercio. Os países avançados tentaram inúmeras vezes fixar regras que, se descumpridas, impediriam um país de exportar para outro. A França e os Estados Unidos, por exemplo, propuseram incluir nessas regras, o pagamento de "salário condigno", usando argumentos de natureza humanitária. Mas, no fundo, eles visavam erguer barreiras de exportação nos países em desenvolvimento que sempre reagiram e impediram a implantação de cláusulas sociais no comercio internacional.

Para equacionar o problema, a OMC delegou à OIT (1998) a definição de regras trabalhistas básicas a serem seguidas no comercio internacional. Mas, contrariando a pretensão dos países avançados, a OIT não recomendou a inclusão de cláusulas sociais como mecanismo de punição nas transações comerciais.

Ao incluir normas de trabalho de cumprimento obrigatório, o TPP deu um passo importante. O capítulo trabalhista requer que os 12 países adotem o salário mínimo, jornada de trabalho e medidas de segurança no trabalho além de cumprirem com os direitos fundamentais preconizados pela OIT: liberdade de associação, direito à negociação coletiva, eliminação de trabalho forçado; abolição de trabalho de crianças, de discriminação e das piores formas de trabalho infantil. O mais importante vem agora.

Os países signatários do TPP se comprometeram a jamais revogar essas regras com o intuito de estimular as suas exportações. Comprometeram-se também a não importar de países cuja produção se baseia em trabalho forçado ou infantil.

Foi um enorme avanço que a OMC nunca conseguiu materializar. O grande problema, como sempre, é o do compliance. Um país como o Vietnã, por exemplo, terá um longo caminho pela frente antes de adotar a formação de sindicatos livres e a prática da negociação coletiva. No mesmo trilho, Peru, Brunei e Malásia precisarão de um bom tempo para abolir o trabalho infantil.

É isso que tem levado muitas entidades sindicais dos Estados Unidos e Canadá a reclamarem contra a vagueza dos princípios adotados no TPP. Eles desejam mecanismos mais claros para garantir a sua implementação. Do contrário, acham que o papel do capítulo trabalhista do TPP será apenas simbólico.

Para responder a essa crítica, os formuladores do TPP apontam para os mecanismos de resolução de disputas que constam daquele Tratado para solucionar os casos de desvios. Argumentam ainda que o TPP contará com rodadas de avaliação periódica para registrar o progresso realizado pelos países na área trabalhista.

O Brasil não faz parte do TPP, mas nem por isso está imune às suas influencias. Os nossos parceiros latino-americanos (Chile, Peru e México) entraram em uma órbita de mais liberdade para comercializar. Isso poderá afetar o comercio das nossas commodities. A entrada de países asiáticos no TPP (Vietnã, Malásia e Cingapura) afastará as possibilidades de negócios no campo da tecnologia da informação. Austrália pode tomar mercados brasileiros nos campos dos minérios, agricultura e pecuária. E assim por diante.

É pena que o Brasil tem se mantido tão isolado, fazendo poucos acordos comerciais com os países que têm um bom poder de compra dos nossos bens e serviços. E, no campo trabalhista não estamos mal. É crescente o número de empresas brasileiras que evitam transações quando há indícios de trabalho infantil ou forçado em qualquer parte da cadeia produtiva. Por essa e outras razões, perdemos a rica oportunidade de participar de um bloco de países que respondem por 40% do PIB mundial, como é o TPP.

José Pastore é professor da FEA-USP, Presidente do Conselho de Emprego e Relações do Trabalho da Fecomercio-SP e membro da Academia Paulista de Letras.