Artigos 

Publicado em O Estado de S. Paulo, 15/03/2011.

A real prioridade na terceirização.

Inúmeras empresas estatais vêm sendo condenadas pela Justiça do Trabalho por terem terceirizado atividades fim e não atividades meio. Assim diz o Enunciado 331 do Tribunal Superior do Trabalho. Mas, não está na hora de se rever isso?

A produção moderna é realizada por meio de constelações de empresas e de pessoas nas quais há a mais variada teia de relações de trabalho. Alguns dos protagonistas são empregados fixos da empresa principal; outros são empregados de empresas contratadas (como pessoas jurídicas) para realizar determinados serviços (terceirizados). Há ainda os autônomos que trabalham junto à empresa principal ou nos seus redutos, inclusive em casa.

O que é mais importante nessa teia de relações? Seguramente, que todos tenham suas proteções trabalhistas e previdenciárias plenamente garantidas. Assegurada essa condição pouco interessa se atividade realizada é definida como meio ou como fim.

No dia a dia, porém, sabe-se que há contratantes que desrespeitam os direitos dos trabalhadores. Isso é grave e intolerável.

Para mudar esse quadro, o Brasil precisa de uma lei que promova o respeito e puna o desrespeito. Isso nada tem a ver com atividade meio ou fim, mesmo porque na prática, é impossível fazer essa distinção. Mesmo que fosse, essa diferenciação não tem o menor interesse para a proteção dos trabalhadores.

Apesar disso, centenas de empresas vêm sendo processadas por esse motivo como é o caso da Petrobrás, BNDES, Eletrosul, Instituto de Resseguros do Brasil e outras. Todas elas estão sendo acionadas por terem cometido o "pecado" de contratar serviços ditos como relacionados à sua atividade fim.

O mais importante ficou de lado. Alguém foi verificar se os direitos dos empregados das contratadas estão sendo obedecidos ou violados? É isso que interessa. Se há direitos estabelecidos, eles têm de ser respeitados custe o que custar.

Entendo a posição dos magistrados que têm de se guiar pelo Enunciado 331 que, na falta de lei especifica, tem de ser obedecido. Muitos dos próprios magistrados reconhecem que isso precisa mudar. O Brasil moderno exige uma legislação que se concentre em assegurar as proteções de todos os que trabalham nos processos terceirizados.

Mas, como evitar a burla e a precarização daquelas empresas que desrespeitam os direitos dos trabalhadores? Apresento aqui uma sugestão: criar um mecanismo que estimule fortemente a obediência e penalize com mais força a desobediência. Como fazer isso?

Um dos modos é responsabilizar as empresas contratantes pelo acompanhamento da conduta das empresas contratadas antes e ao longo do contrato de terceirização. Como assegurar o seu cumprimento?

Para a empresa contratante que seguir as regras do monitoramento, a lei deveria estabelecer que a sua responsabilidade é subsidiária. Para a que não quiser fazer o monitoramento, a responsabilidade é solidária. No primeiro caso, a contratante responde pelo eventual desrespeito da contratada, depois desta se explicar perante a Justiça. Afinal, é ela que tem toda a documentação para se justificar e defender. No segundo caso, a contratante é diretamente acionada pelos trabalhadores e sindicatos, respondendo assim por seus atos e pelos atos da contratada. Já que decidiu ser comodista ou negligente, ela que se arrume para conseguir as provas de que a contratada agiu bem. Do contrario, terá de cumprir a sentença determinada pela Justiça do Trabalho que terá todas as justificativas para ser rigorosa, afinal, trata-se de violações de direitos básicos dos trabalhadores.

Com essa elevação do risco da punição, as empresas contratantes seriam induzidas a fazer o necessário monitoramento como regra, transformando-se em verdadeiros fiscais na supervisão do cumprimento das proteções dos trabalhadores. É o caminho de uma terceirização realista e decente. Há dois projetos de lei no Congresso Nacional que fazem isso – o PL 6832 na Câmara dos Deputados e o PL 87 no Senado Federal. É hora de aprová-los.