Artigos 

Publicado em O Estado de S. Paulo, 16/09/2008.

Reajuste do funcionalismo teto ou piso

O Ministro Paulo Bernardo mostrou-se muito satisfeito pelo fato de ter negociado com os funcionários públicos aumentos de vencimentos escalonados entre 2008 e 2011. Essa, segundo o Ministro, seria uma estratégia para abafar as reivindicações dos sindicalistas.

Os aumentos concedidos variarão de 11% a 137%, dependendo da função e do cargo dos servidores. Uma tabela preparada pelo Ministério do Planejamento prevê a composição dos vencimentos para cada função dentro da "nova estrutura remuneratória". Tudo muito bem detalhado.

Tais aumentos são aplicados a cerca de 1,75 milhão de servidores, inclusive aposentados e pensionistas, acarretando uma despesa adicional de cerca de R$ 32 bilhões no período. Já em 2008, haverá um gasto de R$ 8 bilhões. Em 2009 e em 2010, serão cerca de R$ 11 bilhões em cada ano; e, em 2011, R$ 5 bilhões.

Essas despesas e percentuais estariam pré-estabelecidos de 2008 até 2011. Os acordos firmados entre governo e as categorias específicas seriam sacrossantos e "imexíveis".

Qual é a garantia de que os novos valores venham a ser tetos e não pisos? O que impedirá aos servidores apresentarem novas reivindicações ao longo dos próximos anos?

Até hoje não foi aprovada uma lei de greve para os servidores públicos – pois o Poder Executivo não enviou ao Congresso Nacional o prometido projeto nesse campo – as pressões sindicais podem ser exercidas sem limites, forçando o governo a conceder novos aumentos, sem falar o enorme prejuízo que as paralisações de funcionários públicos causam à população.

A estratégia adotada não garante tampouco um alivio do peso do funcionalismo nas contas nacionais. Ao contrário, entre 2008 e 2011, as despesas com pessoal aumentarão 16,5%, passando de 4,6% para quase 5% do PIB.

Além disso, a puxada nos vencimentos de valor mais alto deverá funcionar como um convite para elevar os tetos atuais. Os membros do Poder Judiciário – que sempre saem na frente - podem se sentir injustiçados ao verificar que certas carreiras do Poder Executivo chegaram a vencimentos quase iguais aos seus. Os auditores fiscais da Receita Federal, por exemplo, ganharão R$ 16.680 em 2008; R$ 18.260 em 2009; e R$ 19.451 em 2010. A disparada do lobby em favor de um novo teto para os magistrados é questão de dias, se é que já não tenha entrado em campo para pressionar por aumentos especiais para os juizes.

Engana-se o Ministro do Planejamento que os acordos assinados representam uma clausula de paz. O próprio relator das medidas que aprovaram os aumentos, deputado Gilmar Machado, diz que, uma vez consolidados os novos valores, o governo pode voltar à formula proposta em 2007, segundo a qual o crescimento da folha de salários seria limitado por um reajuste pela inflação passada mais um fixo de aumento real. Ele vai mais longe ao dizer que em lugar de 1,5% de aumento real, como proposto em 2007, o percentual seria o equivalente a 50% do crescimento do PIB do ano anterior. Ou seja, os aumentos dos servidores públicos em 2009 seriam de 8,5% - 6% de inflação e 2,5% do PIB que são as previsões para 2008. É uma pressão salarial de grande potência.

Várias bombas relógio estão montadas para mostrar que os aumentos escalonados recém aprovados serão atropelados por ações de greves e de lobbies para se chegar a acréscimos ainda maiores.

O ônus, evidentemente, ficará com os contribuintes enquanto que o bônus ficará para o governo. Sim, porque os aumentos concedidos terão um forte efeito eleitoral não só nas eleições municipais deste ano, mas, sobretudo, nas eleições gerais de 2010. A isso se soma o forte aumento (12%) que terá o salário mínimo no início de 2009, com todos os reflexos nas aposentadorias e pensões.

Esse é o quadro. As despesas do governo continuarão crescendo mais depressa do que a meteórica arrecadação, pouco sobrando (2%) para investimentos estratégicos em infra-estrutura, educação, saúde e segurança. Como sustentar os bons números do PIB dessa maneira?

Esse é o Brasil. Parodiando o excelente artigo de Rolf Kuntz neste espaço (Estado 21/08/08), diria que o governo é bom de receita, generoso nas despesas e ruim de investimento. E viva o populismo!