Publicado em O Estado de S. Paulo, 13/12/2005.
O custo do trabalho na microempresa
O peso da legislação trabalhista na determinação das despesas de contratação de empregados é bastante conhecido. O Brasil é o campeão mundial. Uma contratação legal gera despesas de 103,46% do salário nominal. Na França, país altamente regulamentado, essas despesas são de 80%; na Inglaterra, 59%; na Itália, 51%; no Japão, 12%; nos Tigres Asiáticos, 11% (média); e nos Estados Unidos, pouco mais de 9%.
Nos países citados o legislador optou por mais salários diretos e menos despesas indiretas. No Brasil, o fez o inverso. Na hora de negociar, há tantas despesas indiretas, que os empregadores, na maioria dos casos, acabam aviltando os salários.
Para contornar esse problema, muitos empregadores e empregados optam pela informalidade que já atinge 60% dos brasileiros que trabalham. Na hora de contratar, tudo são flores, mas na hora de despedir tudo se transforma em ações trabalhistas que somam 2,5 milhões e que, para serem examinadas e julgadas pela Justiça do Trabalho, custam à sociedade cerca de R$ 6 bilhões por ano.
As despesas acima indicadas são as mesmas para empresas de todos os tipos e portes, desde a fabricante de aviões até o salão de barbeiro. Trata-se de uma legislação tamanho único para realidades muito diferentes. O legislador ignorou que 95% das unidades produtivas do país são microempresas.
Ao lado dos 103,46% que devem ser respeitados por todos os empregadores, as microempresas têm peculiaridades que geram custos adicionais de grande monta. Por exemplo, o piso salarial é objeto de negociações nas datas base. O seu valor é fixado em convenções coletivas da categoria que envolve empresas de todos os portes. Na maioria das vezes, os negociadores fazem parte das empresas de maior porte e que podem pagar mais. Raramente os microempresários participam dessas negociações e, quando o fazem, não têm força suficiente para impor valores realistas. Uma vez assinada a convenção, todas as empresas da categoria ficam obrigadas a respeitar o piso negociado. Para as empresas do topo, isso é aceitável; para as microempresas, e intolerável.
A lei é assim. Mesmo que os empregados queiram, os empregadores não têm liberdade para firmar um acordo em separado com cláusulas menos favoráveis do que as da convenção respectiva, a menos que os sindicatos que a negociaram garantam aquele expediente. Isso é raro. Há resistências óbvias do lado laboral e surpreendentes do lado patronal. Os grandes empregadores resistem em conceder "regalias" para os microempresários sob o argumento que estariam criando uma concorrência desleal para si mesmos.
O mesmo acontece com o valor da hora extra e do adicional de trabalho noturno. A legislação fixa valores mínimos, 50% e 20%, respectivamente. Mas, as convenções coletivas realizadas com grandes empresas vão além disso e acabam impondo às microempresas valores bem superiores à sua capacidade de pagar.
Esse tema é conhecido dos que labutam na área trabalhista. Em recente trabalho, Abreu aponta que muitas das pequenas e microempresas, por motivo financeiro, não se associam aos sindicatos patronais e, portanto, não participam das assembléias que aprovam as convenções coletivas. Apesar disso, têm de arcar com os custos dessas convenções, geralmente, decididas por empresas de maior fôlego (Osmani Teixeira de Abreu, As Relações de Trabalho no Brasil a partir de 1824, São Paulo: Editora LTR, 2005).
Não é a toa que os microempresários têm medo de empregar formalmente. As despesas correntes são elevadas e as extraordinárias são ainda mais altas. Se a empresa é envolvida em uma ação trabalhista que implica em peritagem, por exemplo, o custo desse serviço é enorme e deve ser bancado pela empresa. Na interposição de um recurso judicial, a lei obriga o microempresário a fazer um depósito prévio no valor da causa.
Tudo isso assusta o microempresário, mostrando que uma legislação que pretende proteger empregados precisa levar em conta a realidade das empresas. Do contrário, as boas intenções do legislador se voltam contra os trabalhadores que são contratados na informalidade ou ficam no desemprego.
A exemplo do que fazem inúmeros países, a legislação trabalhista brasileira precisa ser adaptada às microempresas, por meio de uma espécie de "simples trabalhista" a exemplo do programa do Simples que teve tanto sucesso. Afinal, as pequenas e microempresas respondem por mais de 50% dos empregos do Brasil. Elas necessitam de uma simplificação administrativa e de estímulos para continuar empregando.
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