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Publicado em O Estado de S. Paulo, 13/10/1991

Um estímulo à negociação

Ao mesmo tempo em que se fala em estimular a negociação direta entre empregados e empregadores no Brasil, o trabalho dos tribunais de Justiça aumenta a cada dia. Só no ano passado, a Justiça do Trabalho recebeu 1,2 milhão de casos para conciliação ou para julgamento. Isso é, de longe, o mais retumbante recorde mundial.

No campo dos dissídios coletivos, o fracasso na negociação direta transfere para os juízes dos TRTs e ministros do TST uma responsabilidade gigantesca que, muitas vezes, as próprias diretorias das empresas evitam enfrentar – especialmente as estatais. Não são raros os casos em que os dirigentes fazem o papel de bonzinhos – deixando o desempenho de algoz para o Poder Judiciário. Como reverter esse quadro? Como forçar as partes a negociar com todo o empenho? Penso que o "método da oferta final" pode ajudar. Em consiste ele?

Por esse método, o julgador só pode optar por uma das duas propostas finais das partes. Digamos que uma pede 100% de aumento e a outra insiste em conceder apenas 10%. O juiz só pode escolher 100% ou 10%, estando impedido de escolher qualquer valor intermediário.

Esse é um exemplo pouco realista e aqui usado simplesmente para acentuar que a restrição aludida constitui uma poderosíssima pressão para as partes negociarem à exaustão. Ela eleva extraordinariamente o risco para as partes. Se o julgador decidir pelos 100%, ele arrasa a empresa. Se escolher 10%, arrasa os trabalhadores.

O risco na decisão é função da discrepância entre as ofertas finais. Mas esse risco é regulado pelas próprias partes. É ele que empurra empregados e empregadores para a conciliação voluntária e para a solução salomônica – hoje praticada pelo Judiciário.

No exemplo citado, a situação é tão desesperadora que dificilmente as partes vão querer um julgamento. Ao contrário, elas tudo farão para convergir e acertar suas diferenças em bases realistas e toleráveis para os dois lados.

Apesar de ser um mecanismo localizado no fim de linha do processo negocial, esse método exerce uma salutar influência no início da linha, ou seja, na negociação voluntária. Ele torna o risco de negociar bem menor do que o risco de julgar. O próprio juiz tudo fará para os contendores chegarem a um acordo. Em suma: o método da oferta final estimula a negociação, valoriza o Poder Judiciário e se ajusta à nossa tradição legalista.

As modificações legais são simples. Bastará uma nova lei mudando a atual sistemática de julgamento dos tribunais e, na pior das hipóteses, um aperfeiçoamento constitucional no campo do poder normativo da Justiça do Trabalho. Mas, antes da lei, é indispensável que empregados e empregadores desejem substituir a salomonologia atual. É bem provável que isso se acelere daqui para frente, na medida em que a competição aumentar para as empresas privadas e a proteção governamental diminuir para as estatais. Nesse novo contexto, vingará a livre negociação no Brasil. Com ela, ganharão empregados, empregadores, magistrados e, sobretudo, os consumidores.