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Publicado no Diário do Povo, Campinas, 19/10/1998

Tempo parcial simplificado

O trabalho em tempo parcial vem sendo considerado um atenuador do desemprego. O tema é controvertido. Para os defensores desse expediente, argumenta-se que como não há trabalho para todos, é preciso fazer as pessoas trabalharem menos, para todas trabalharem. Para os cépticos, o trabalho em tempo parcial estimula muita gente que não trabalha a se apresentar como pretendente a empregos, o que aumenta a oferta de candidatos, fazendo aumentar a taxa de desemprego.

Em todos os países onde o tempo parcial tem apoio legal, a maioria dos seus usuários é composta de mulheres. Nas nações da OECD, elas respondem por mais de 70% do emprego feminino. Mas o tempo parcial é utilizado também pelos jovens que estudam e trabalham e pelas pessoas mais velhas, como estratégia de aposentadoria gradual (Jacqueline O´Reilly e Colette Fegan, Part Time Prospects, 1998). Do lado das empresas, é crescente o uso do tempo parcial combinado com a utilização mais racional dos turnos de trabalho para o pessoal de tempo integral. Inexiste, portanto, uma dicotomia entre tempo integral e tempo parcial.

Hoje em dia, a grande atenção das empresas é colocada no uso eficiente do seu capital físico (espaço, máquinas e equipamentos). No processo de maximização do tempo, a semana tradicional do trabalho está praticamente superada. As jornadas estão se tornando cada vez mais atípicas, nas quais as empresas trabalham dia e noite, com turmas diferentes, avançando nos fins de semana, quando necessário, fazendo hora extra nos picos de demanda, modulando turnos de trabalho e usando o tempo parcial (L. Delsen, Atypical Employment: Causes, Consequences and Policy, 1995). Pratica-se, portanto, um complexo pacote de medidas flexíveis.

O tempo parcial é produto da reestruturação da economia. Nos últimos anos, o crescimento do emprego deu-se essencialmente no setor terciário. Na Europa, Estados Unidos e Japão, mais de 80% dos "temps" (trabalhadores em tempo parcial) estão no comércio, serviços e no setor público. Mas essa não é a história completa. O tempo parcial cresce também na indústria, por meio da combinação das estratégias acima indicadas.

O tempo parcial sempre foi inversamente relacionado à qualificação das pessoas e o tamanho das empresas. Recentemente, porém, cresce a participação dos mais qualificados em empresas menores. Os trabalhadores em tempo parcial tendem a apresentar uma relação mais estreita entre tempo pago e tempo trabalhado, além de proporcionar trabalho em horas não padronizadas (noites, feriados, fins de semana, etc.), o que hoje é essencial. Tudo isso tem impacto positivo na produtividade do fator trabalho.

A regulamentação do tempo parcial, desde que executada de maneira simples e direta, pode evitar demissões. Muitas empresas preferirão mudar os atuais trabalhadores de regime para continuar contando com quem conhece o trabalho e a organização.

No caso do Brasil, a simplificação da Medida Provisória 1.709, que trata da matéria, pode ter os três efeitos observados nas pesquisas indicadas, a saber: 1) reduzir demissões; 2) ampliar o número de vagas; 3) aumentar a oferta de trabalho.

O efeito mais importante será o da legalização de uma larga parcela da mão-de-obra que hoje trabalha na informalidade. Mas a regulamentação precisa ser simples evitando-se intermediários e excesso de restrições.