Publicado em O Estado de S. Paulo, 12/07/2006.
O trabalho na nova União Européia
Ausentei-me desta coluna no mês de junho por ter viajado para conhecer mais de perto as condições de trabalho dos países ex-comunistas que entraram na União Européia em 2004: Estônia, Letônia, Lituânia, Polônia, República Checa, Hungria, Eslováquia e Eslovênia.
Os salários da Europa do Leste são, em média, 35% dos da Europa Ocidental. Há casos gritantes. Trabalhadores qualificados das montadoras de automóveis na Polônia ganham, em média, US$ 6 por hora enquanto que na Alemanha, ganham US$ 35.
Com exceção da Inglaterra, Irlanda e Holanda, os demais países da Europa Ocidental proibiram a migração de trabalhadores do leste para o oeste. Resultado: as empresas do oeste estão migrando para o leste. Isso tem ajudado a acelerar o progresso daquelas nações. Em 2005, os países visitados cresceram, em média, 6%. Eles vêm sendo considerados os "linces europeus" para parodiar os tigres asiáticos. Para muitos, o lado leste é a China da Europa. Se, de um lado, os salários são mais altos do que os dos chineses, de outro, o trabalho é de melhor qualidade, todos são da mesma comunidade e a proximidade geográfica é vantajosa.
No agregado, esses países têm um PIB pequeno – cerca de US$ 500 bilhões, mas estão sendo estratégicos para viabilizar a competitividade das empresas da Europa Ocidental.
E o povo, o quê pensa? Os que desfrutam dos novos empregos estão satisfeitos, embora lhes desagrade ganhar menos que seus semelhantes do lado ocidental. Os que estão desempregados questionam fervorosamente a entrada na União Européia. Os poloneses, que amargam 18% de desemprego são os mais críticos. Na Eslováquia, onde há 12% de desemprego, o Presidente Mikulas Dzurinda realizou reformas positivas nos campos econômico e social. Apesar disso, em meados de junho, perdeu as eleições para o socialista Robert Fico que promete revogar todas as reformas.
Os países visitados ainda estão em transição: saíram da economia estatizada, mas, ainda não entraram na economia de mercado. Ouvi de muitos jovens o seguinte: "No comunismo, o governo mandava fazer e fazíamos porque nossos pais e professores nos ensinaram a obedecer. Ademais, tínhamos empregos, moradia, transporte e segurança. Agora, o governo não nos diz o que fazer e tampouco garante o emprego. Não queremos voltar para o comunismo. Mas, não desejamos ser europeus de segunda classe".
O que vai acontecer se a União Européia continuar dividida em dois mundos – um que paga bem e outro que paga mal? Diz a teoria que as diferenças convergirão.
Timidamente, certos sinais desse movimento começam a aparecer. Ao sofrerem a pressão da China, Índia, Sudeste Asiático, Europa Central e Europa do Leste, as condições de trabalho dos países ricos estão mudando: muitos empregos migram para outros países e os salários e benefícios dos que ficam se reduzem.
Será uma trajetória dura. Ninguém gosta de descer na escala social. Os dados mostram, porém, que, nos últimos cinco anos, o salário de quem está no meio da pirâmide social dos Estados Unidos subiu apenas 1%, enquanto que nos cinco anos anteriores, aumentara mais de 6%, sem contar que a produtividade se elevou de forma expressiva nesse período ("Inequality and the American Dream", The Economist, 17/06/2006).
Na Alemanha, muitos contratos de trabalho vêm sendo reformulados, alongando a jornada de trabalho sem aumento de salário, transformando parcelas fixas em bônus variáveis, criando novos turnos e intensificando o trabalho aos sábados e domingos.
O que isso tem a ver com o Brasil? As economias do mundo são interdependentes. A utilização de mão-de-obra qualificada, de baixo custo e de fácil ajuste às novas condições do trabalho no leste europeu pode reduzir o fluxo dos capitais produtivos da Europa para o Brasil.
Além de maiores dificuldades de contratação do trabalho, o Brasil tributa as empresas de modo muito mais forte do que o leste europeu. As reformas trabalhista e tributária precisam ser feitas o mais rápido possível para manter as empresas competindo e os brasileiros trabalhando. A previdenciária é igualmente crucial para evitar a falência do sistema. Ademais, temos de investir pesadamente na melhoria da qualidade da nossa mão-de-obra. Afinal, o Brasil não está isolado no tabuleiro da nova economia |