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Publicado em O Estado de S. Paulo, 29/11/2005.

Contratação como Pessoa Jurídica

Finalmente, o Congresso Nacional disciplinou a situação dos profissionais que prestam serviços em caráter personalíssimo. Essa disciplina veio com a aprovação pela Câmara dos Deputados do artigo 129 da Medida Provisória 255.

Essa regulamentação era necessária. Muitos agentes fiscais viam tais empresas como manobras para pagarem menos impostos, quando comparadas com os empregados celetistas. Por isso, queriam tratar os prestadores de serviços como empregados. Com o propósito de equipará-los aos empregados celetistas, a abortada Medida Provisória 232 tentou elevar de forma expressiva a tributação desses profissionais.

Ao aprovar a MP 255, agora convertida na Lei 11.196, a Câmara dos Deputados se alinhou às tendências modernas do mercado de trabalho. Como se sabe, os profissionais que hoje atuam por meio de empresas, na maioria dos casos, foram empregados ontem. Com as mudanças nos modos de produzir e vender, os empregadores continuam interessados em seu talento, mas não na condição de empregados. Preferem contratá-los para atividades específicas ou por projetos que têm começo, meio e fim.

Com isso, os profissionais em tela foram levados a criar empresas, como é o caso dos arquitetos, dos engenheiros, dos consultores, dos anestesistas, dos artistas e tantos outros. Dessa forma, eles deixaram de ser empregados, sem se transformar em empregadores.

Muitos se assustaram com os dados do IBGE segundo os quais cerca de 66% das empresas brasileiras são desse tipo (IBGE, "Estatísticas do Cadastro Geral das Empresas do Brasil", 2003). Mas, não há razão para isso, pois essa é uma tendência mundial. Nos EUA, a proporção dessas empresas é de 77% e incide nas mesmas atividades onde estão as empresas do Brasil (ver quadro).

Empresas sem empregados nos Estados Unidos – 2003

Setores de atividade

No. de estabelecimentos

%

Profissionais liberais, técnicos e cientistas

2.647.711

14,3

Serviços gerais (exceto administração pública)

2.660.480

14,3

Construção civil

2.239.310

12,0

Imobiliárias

2.045.524

11,0

Comércio varejista

1.880.342

10,1

Serviços de saúde

1.542.907

8,2

Serviços administrativos e de reparação

1.293.822

6,9

Artes, entretenimento e recreação

888.146

4,7

Serviços educacionais

373.910

2,0

Outros

3.076.962

16,5

Total

18.649.114

100,0

Fonte: US Census Bureau, Nonemployer Statistics, 2003.

Os EUA têm cerca de 18,5 milhões de empresas sem empregados e 5,5 milhões de empresas com empregados. As primeiras crescem na base de 3% ao ano e refletem a revolução por que passa a produção e o trabalho.

Estas empresas, sem empregados, operam em estreita relação com empresas que têm empregados, formando "redes de produção". No mundo moderno, quem compete não são as empresas e sim as redes, compostas de vários tipos de empresas e profissionais. É um outro mundo.

Os que trabalham em tais empresas têm situação bem diferente do que a dos empregados. Por serem pessoas jurídicas, eles não usufruem os benefícios dos empregados como férias, aviso prévio, FGTS, indenização de dispensa, licenças, abono de férias, 13º salário, descanso semanal remunerado, hora extra, adicional de hora noturna, etc.

Por outro lado, eles têm custos inexistentes para os empregados, como é o caso das despesas de aluguel, contador, secretária, office-boy, e, ademais, recolhem vários impostos e contribuições não incidentes nos contratos de celetistas (PIS, COFINS, CSLL, etc). Em muitos casos, os gastos operacionais e tributários ultrapassam as contribuições dos celetistas – e com menos benefícios.

Por isso, em boa hora a inovação introduzida pela Câmara dos Deputados afastou um desentendimento infundado, pois, do contrário, muitos profissionais legalizados passariam para a informalidade que, aliás, já abriga mais de 10 milhões de "empreendedores" informais – o dobro dos formais. Foi uma boa medida. Vamos ver de que forma a Justiça entenderá essa lei.