Artigos 

Publicado em O Estado de S. Paulo, 06/07/1999

Benefícios sociais: grande reversão

Segundo as pesquisas da CNI, o auxílio medicamento já é pago em 23% dos acordos e convenções do setor industrial; o plano de saúde, em 24%; e o seguro de vida, em 31%; o auxílio transporte, em 38%; o auxílio creche, em 46%; e o auxílio ali-mentação é pago em 70% dos casos.

A agregação do salário monetário aos benefícios não monetários redunda em uma elevação significativa do poder de compra dos trabalhadores que têm a felicida-de de continuar empregados.

Apesar disso, a sensação generalizada é de profunda perda de poder aqui-sitivo. Os dirigentes sindicais não se conformam de sentarem dias e dias em uma mesa de negociação para, no final, obter 0,5% ou 1% de aumento salarial.

Eles argumentam que percentuais tão ridículos não motivam ninguém a se mobilizar ou até mesmo partir para a greve durante as campanhas salariais. O seu traba-lho parecia ter melhor receptividade quando a inflação era alta.

De fato, quando a inflação era de 900% ao ano, as pessoas se sentiam fe-lizes quando obtinham um aumento salarial de 900%. Nos anos mais difíceis, elas se contentavam até mesmo com 800%. Atualmente, elas se sentem profundamente decepci-onadas quando, por exemplo, num ano como o de 1998, onde a inflação foi praticamente zero, os aumentos de salário raramente ultrapassaram a casa dos 2% ou 3%.

É o efeito da chamada ilusão monetária. Isso tem um profundo impacto no movimento sindical. Ninguém sai de casa numa noite de chuva para ir à assembléia do seu sindicato que vai propor um aumento de 2% na sua pauta de reivindicações. No en-tanto, muita gente se movimentava para fechar um acordo na base de 800% quando a inflação era de 900%.

É verdade que num ambiente de competição acirrada, as empresas buscam atrelar os salários à produtividade e ao lucro, adotando as mais variadas estratégias e procurando fugir de despesas desnecessárias, razão pela qual se dispõem a negociar be-nefícios que estão livres de encargos sociais.

Neste ano, a inflação será bem mais alta do que no ano passado. Mas a combinação de competição crescente e atividade econômica cadente impede muitas em-presas repassar aumentos de custos a preços.

Além do mais, o Ministério da Previdência Social, através de Portarias re-petitivas, vem gravando vários benefícios com encargos sociais, o que afeta bastante a estratégia empresarial de ampliar mais os benefícios do que os salários.

A última novidade é o caso do seguro de vida. As empresas que concedi-am esse seguro tenderão a rever sua posição em vista das verbas previdenciárias que terão de recolher sobre aquele benefício.

Tudo isso provoca muitas modificações no campo do salário e faz antever uma temporada de negociações bastante difíceis para o segundo semestre de 1999. O jogo será duro. Os trabalhadores querem emprego e salário. A compe-tição exige produtividade. E a previdência demanda contribuição. Para atender a produ-tividade, tudo indica que as empresas elevarão suas demandas em termos de qualidade do trabalho. Para atender à previdência social, tudo indica que as empresas cortarão be-nefícios tributáveis.

Os grandes perdedores serão o trabalhador e o Estado. O primeiro porque vai perder poder de compra; o segundo porque ficará com a responsabilidade de prover o benefício até então concedido pelas empresas. Isso não tem nenhuma lógica. Mas, es-tamos no Brasil...onde a lógica raramente prevalece sobre os desatinos.