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Publicado em Jornal da Tarde, 11/08/1999

Convite para trabalhar mais

O Ministério da Previdência Social enviou ao Congresso Nacional um projeto de lei que, se aprovado, estimulará as pessoas a retardarem a sua aposentadoria.

Visa-se com isso contornar a lei atual que está permitindo muitas aposentadorias precoces - a média é de 53 anos de idade - o que transfere para a Previdência Social a responsabilidade de manter os benefícios por um longo período - 25 anos, em média.

Essa estratégia não é nova. Na Europa os rombos nas contas da Previdência Social são gigantescos. A razão é a mesma: o número dos consumidores da seguridade social aumenta numa progressão geométrica, enquanto que o dos contribuintes, mal e mal, seguem uma progressão aritmética (Sveinbjorn Blondal e Stefano Scarpetta, Retire Early, Stay Work? Paris: OECD, 1998).

Por concederem benefícios extraordinariamente generosos e, em face do medo do desemprego, os europeus estão adiando a aposentadoria para a idade limite que, aliás, é bem mais alta do que a do Brasil - 62 anos em média.

Para que serve o prêmio para aposentar mais tarde? A lógica é simples. Ao permanecer trabalhando por mais dois ou três anos, as pessoas evitam desembolsos imediatos por parte da Previdência Social e reduzem desembolsos futuros na medida em que encurtam o período de sobrevida depois de aposentadas.

O projeto de lei do Ministério da Previdência Social vai pelo mesmo caminho: quem ficar mais tempo trabalhando, na hora de aposentar, receberá um benefício maior. Para tanto, a aposentadoria será calculada, levando em conta três elementos: (1) o tempo de contribuição; as alíquotas de recolhimento; e (3) a expectativa de vida no momento da aposentadoria.

Com base nisso, o Ministério da Previdência concederá um prêmio para quem retardar a aposentadoria. Ou seja, se a pessoa de aposentar na época própria, receberá o benefício atual; mas, se adiar a aposentadoria, receberá benefícios bem maiores por ocasião da aposentadoria.

Trata-se, sem dúvida, de um bom remendo no sistema atual pois, o problema da Previdência Social se agrava a cada dia, por razões demográficas e institucionais. Em 1970, para cada oito jovens havia um idoso; no ano 2020, essa proporção deverá ser de dois para um (Kaizô Iwakami Beltrão, Dependência da População Idosa: Uma Visão Previdenciária, Brasília: IPEA, Coleção População Brasileira, Ano IV, no. 1, 1999). Como o idoso gera despesas não só de aposentadoria mas também de saúde e assistência social, as despesas serão crescentes e as receitas continuaram cadentes. Essa equação não fecha.

Além disso, o Brasil assiste o encolhimento do mercado formal e a explosão da informalidade. Dados recentes do próprio Ministério da Previdência Social revelaram uma situação dramática. Do total de 78 milhões de brasileiros que constituem a População Economicamente Ativa, apenas 18 milhões têm vínculos com o INSS e FGTS. Ou seja, 60 milhões são apenas consumidores da previdência.

O projeto de lei tem o seu valor. Mas tudo poderia ser simplificado se o Brasil viesse a adotar o sistema de capitalização, onde cada um receberia o que poupou durante a sua vida de trabalho, com exceção, é claro, das pessoas de renda muito baixa, para as quais teria de haver um fundo público.

Essa é a mudança de profundidade que o Congresso Nacional está sendo desafiado a fazer ainda na atual legislatura. Pense bem na sua situação e, sobretudo, na situação dos seus filhos e netos para, em seguida, perguntar ao seu representante no Congresso Nacional o que ele tem feito nessa direção.