Publicado em O Estado de S. Paulo, 18/08/1998
Trabalho em tempo parcial
A Medida Provisória 1.709, de 6 de agosto de 1998, disciplinou a prática do tempo parcial, desbravando um pouco mais o terreno da flexibilização do trabalho no Brasil.
Os que são contra a flexibilização haverão de encontrar vários argumentos contra o tempo parcial. Muitos dirão que tal medida não criará vagas, servindo apenas para ampliar a oferta de pessoas à procura do trabalho, o que pode fazer aumentar a taxa de desemprego. Outros argumentarão que o tempo parcial será uma "formalização" da precariedade dos que já trabalham no mercado informal.
O que dizem as pesquisas? A maioria dos estudos disponíveis revela que o tempo parcial tem sido uma boa solução para empregados e empregadores. Do lado dos empregados, o tempo parcial atende as mulheres casadas que desejam trabalhar e cuidar do lar e dos filhos; os jovens que precisam trabalhar e estudar; e os idosos que dispõem de algumas horas por dia para se ocupar e gerar renda adicional.
Do lado dos empregadores, o tempo parcial atende às exigências das novas tecnologias usadas na indústria, comércio e serviços que demandam horários flexíveis e intermitentes. Esse expediente permite ampliar o tempo de trabalho para além da jornada normal e praticar horários irregulares e ajustados às variações da demanda. Sobretudo, o tempo parcial facilita um melhor ajuste entre o tempo trabalhado e o tempo remunerado, o que significa ganhos de produtividade.
O trabalho em tempo parcial vem aumentando na maior parte dos países avançados, em especial entre as mulheres, conforme indicam os dados da tabela abaixo.
Proporção de pessoas que trabalham em tempo parcial (%)
Países |
1986 |
1995 |
|
Total |
Homens |
Mulheres |
Total |
Homens |
Mulheres |
Alemanha |
12,9 |
2,1 |
29,8 |
16,3 |
3,6 |
33,8 |
Austrália |
20,0 |
7,4 |
39,2 |
24,8 |
11,1 |
42,7 |
Bélgica |
9,4 |
2,1 |
22,6 |
13,6 |
2,8 |
29,8 |
Canadá |
15,2 |
7,6 |
25,3 |
18,6 |
10,6 |
28,2 |
Dinamarca |
23,7 |
8,7 |
41,9 |
21,6 |
10,4 |
35,5 |
E.U.A |
17,3 |
10,2 |
26,1 |
18,6 |
11,0 |
74,4 |
França |
11,8 |
3,4 |
23,2 |
15,6 |
5,0 |
28,9 |
Grécia |
5,8 |
3,4 |
11,4 |
4,8 |
2,8 |
8,4 |
Holanda |
25,3 |
10,1 |
55,2 |
37,4 |
16,8 |
89,0 |
Inglaterra |
21,6 |
4,6 |
45,0 |
24,1 |
7,7 |
44,3 |
Irlanda |
6,2 |
2,5 |
14,2 |
11,3 |
5,1 |
21,7 |
Itália |
5,0 |
2,8 |
9,5 |
6,4 |
2,9 |
12,7 |
Japão |
16,6 |
7,3 |
30,5 |
20,1 |
10,1 |
34,9 |
Luxemburgo |
6,6 |
1,8 |
15,4 |
7,9 |
1,1 |
20,3 |
Noruega |
23,1 |
7,9 |
45,0 |
21,2 |
9,4 |
46,6 |
Portugal |
6,0 |
3,4 |
10,0 |
7,5 |
4,3 |
11,6 |
Suécia |
25,2 |
6,7 |
45,1 |
24,3 |
9,4 |
73,3 |
Fonte: Jacqueline O´Reilly e Collete Fagan, Part-Time Prospects, London: Routledge, 1998
Nesses países, a facilidade de contratação em tempo parcial é muito grande. No Brasil, ao contrário, os avanços no terreno da flexibilização têm se caracterizado por meias-medidas, como ilustram os casos abaixo.
1. A Lei 9.601, por exemplo, só permite a admissão de um novo empregado se o sindicato concordar.
2. Para os atuais empregados, o governo cogita fazer o mesmo com a contratação em tempo parcial.
3. Uma inversão de palavras no artigo 8º da MP 1.709 (convenção e acordo coletivo) condicionou o uso do banco de horas à vontade sindical.
4. No caso do tempo parcial, a MP 1.709 exige pagar o mesmo salário-hora dos que trabalham em tempo integral, como se isso pudesse ser regulado por lei.
Ou seja, o Brasil está na direção certa no campo da modernização trabalhista. Mas, o método seguido tem sido o do "stop-and-go". Os obstáculos criados dentro das próprias medidas modernizantes anulam grande parte de seu objetivo e constituem verdadeiros absurdos no mundo moderno onde tudo é feito para facilitar as contratações e não dificultar. Isso precisa mudar.
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