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Publicado em O Jornal da Tarde,20/03/1997

Sindicatos e desregulamentação

Passei a semana santa de 1997 na biblioteca da Organização Internacional do Trabalho, em Genebra. Em 1985 assisti ali mesmo o lançamento de um pequeno livro no qual o autor, depois de documentar o forte declínio do movimento sindical dos Estados Unidos no período de 1950-85, lançou a hipótese de que aquele país, que já teve quase 40% dos seus trabalhadores sindicalizados, chegaria no fim do século com menos de 15% (Charles Rehmus, The Future of Industrial Relations in the United States, 1985).

Não deu outra. Em 1997, eram apenas 14%. Do total da força de trabalho (130 milhões), apenas 20 milhões tinham carteirinha de sindicato. Cerca de 110 milhões não eram sindicalizados, não negociavam coletivamente e não eram cobertos por contratos coletivos de trabalho.

Como os americanos são contratados? Na base do contrato individual. Os que endeusam o contrato coletivo de trabalho terão um susto ao verificar que essa modalidade de contratação está desaparecendo. Na Europa, a sobrevida será mais longa mas, ali também, a contratação individual avança.

A crise do sindicalismo é mundial. As suas causas estão presentes também no Brasil: o desemprego industrial, a revolução tecnológica, a globalização, a feminização da mão de obra e a expansão dos funcionários de "colarinho branco".

O professor Rehmus acrescentou mais um fator. Nas décadas de 60-70, os Estados Unidos aprovaram novas leis trabalhistas que passaram a dar aos trabalhadores a segurança que antes era conseguida através dos contratos coletivos com a ajuda dos sindicatos.

Isso representou uma grande guinada na tradição negocial daquele país. Os estados também aprovaram leis trabalhistas. Mas, alguns tornaram-se mais legalistas do que outros.

Surgiu, assim, um bom laboratório para se testar o impacto da regulamentação nas condições de trabalho. Uma primeira avaliação, revelou que os salários mais altos e a maior capacidade de geração de empregos estão nos estados menos regulamentados (Lazarus Lang, A Libertarian View of Trade Unions, 1996).

Um laboratório semelhante existe na Oceania. A Austrália e a Nova Zelândia têm forte tradição legalista. A Austrália se manteve assim. Mas, a Nova Zelândia promoveu, em 1991, uma extensa desregulamentação trabalhista.

A avaliação dos primeiros cinco anos na Nova Zelândia mostrou que trabalhadores e empresários gostaram da liberdade conquistada. As partes estão negociando das mais variadas maneiras, inclusive através de sindicatos e associações.

Mas, em lugar de negociações nacionais e sujeitas à arbitragem compulsória, como ocorre na Austrália, os empregados e empregadores neo-zelandeses optaram por negociações descentralizadas ao nível das empresas. Resultado: o emprego cresceu, o desemprego diminuiu, o salário subiu e a economia retomou sua posição de forte exportadora e geradora de divisas.

No Brasil, não se pode querer copiar este ou aquele modelo. Mas, convém não ignorá-los. Os relatos acima São lições práticas que podem nos ajudar a encontrar o nosso caminho, especialmente nesta hora em que os sindicatos brasileiros perdem filiados, receita e prestígio.

A recuperação de tudo isso será certamente mais fácil dentro de um quadro legal flexível. Os sindicatos que sobreviverem serão os que se preparam desde já para perder o monopólio da negociação e a das receitas compulsórias. As condições econômicas e sociais dos últimos 30 anos mudaram mais do que nos 300 anos anteriores. Velhas instituições não sobrevivem nos novos tempos. é preciso mudar. Mudar e viver.