Artigos 

Publicado em O Estado de S. Paulo, 11/02/2003.

O Conselho Econômico e Social

Instala-se nos próximos dias o Conselho Econômico e Social (CES), composto por agentes econômicos, parceiros sociais, membros da sociedade civil, ministros de estado e o próprio Presidente da República – 93 pessoas.

O órgão terá caráter consultivo, com o objetivo de ajudar a criar, amadurecer e formular propostas a serem encaminhadas ao Presidente Luis Inácio Lula da Silva nos campos econômico e social.

Tais conselhos existem há tempos em países da Europa Continental. Eles foram criados por constituição, lei ou acordo voluntário. Como indica a tabela abaixo, o menor conselho é o da Áustria com 21 integrantes, e o maior é o da França com 231 componentes.

A interface entre os Conselhos e o governo varia bastante. No papel, são todos parecidos, pois visam aconselhar os governos. Na prática, poucos conseguem ser ouvidos e influenciar, de fato, as políticas públicas.

Conselhos econômico e social por data de criação

País

Criação

No. de membros

Atribuições nos campos econômico e social

Bélgica

Lei de 1948

50

Apresenta opiniões e propostas aos poderes públicos.

Faz um relatório anual sobre emprego, custo do trabalho e competitividade.

Holanda

Lei de 1950

33

Principal corpo consultivo do governo. Sistematiza informações sobre empregados e empregadores. Colabora na implementação de certas leis.

Itália

Leis de 1957, 1986, 2000

121

Realiza estudos e formula propostas.

Possui banco de dados sobre mercado de trabalho e contratos coletivos.

França

Constituição de 1958

231

Auxilia o governo na formulação de políticas.

Deve ser consultado nos projetos de lei e programas.

Realiza estudos e divulga amplamente.

Áustria

Acordo voluntário de 1963

21

Realiza estudos e faz propostas ao governo.

Examina projetos de leis e programas

Irlanda

Lei de 1973

26

Faz estudos técnicos e aconselha o governo no desenvolvimento de políticas e programas que redundem em justiça social.

Espanha

Lei de 1991

61

Emite opiniões sobre projetos de lei e programas.

Faz propostas e apresenta um memorando anual sobre a situação de trabalho.

Portugal

Lei de 1991

64

Promove o diálogo entre parceiros sociais e sociedade civil. Emite opiniões sobre projetos de lei e programas nos campos econômico e social

Fonte: Association Internationale des Conseils Economiques et Sociaux, Paris, 2002.

Por exemplo, o Conselho Econômico Social da França tem amplos poderes. O artigo 70 da Constituição Francesa de 1958 diz que o governo deve submeter àquele colegiado todos os projetos de lei de caráter econômico e social. Na prática, foram raras as consultas efetuadas, assim como foi pequeno o impacto dos excelentes trabalhos do CES nas decisões governamentais.

Quando os temas se mostram demasiadamente controvertidos entre os membros dos CESs, estes tendem a evitar as discussões. O CES da França, por exemplo, preferiu omitir-se em relação à redução da jornada de trabalho semanal para 35 horas, aprovada em 1997 e colocada em vigor no ano 2000 (EIRO, "Renouvellement du Conseil économique et social", Dublin: Fondation Européenne por l´amélioration des conditions de vie et de travail, 2003).

Em suma, os conselhos econômico e sociais tornaram-se grandes usinas de idéias, documentos e, sobretudo, longas reuniões. No caso dos países em desenvolvimento, é ilustrativo o caso do CES de Burkina Faso, (república africana, com 13 milhões de habitantes, a maioria na pobreza, que fica ao norte de Ghana, Togo e Benin). Em 2002, o conselho realizou uma reunião que durou 23 dias (31 de outubro a 22 de novembro), para concluir que aquele país não está fora dos impactos da globalização (Conseil Economique et Social du Burkina Faso, 2ème session de 2002).

Mas há honrosas exceções. Nos países em que a prática do diálogo é parte da tradição cultural e o desejo coletivo prevalece sobre o individual como, por exemplo, Áustria e Holanda, importantes reformas nas leis trabalhista e previdenciária tiveram origem em pactos sociais cunhados nos CESs. Mas nos países em que predomina a cultura do individualismo, o "diálogo social" é mais falado do que praticado, como ocorre, por exemplo, na Itália e na França.

O Brasil vai começar essa experiência agora. Carregamos há séculos as marcas do individualismo e da confrontação. Os integrantes do CES precisarão de tempo para superar essa dura herança histórica. Os próprios parlamentares necessitarão de tempo para concluir que o CES será uma ajuda ao Congresso Nacional e não um competidor.

Tenhamos fé. Lembremos que o Brasil é um país que surpreende. Vejam a velocidade meteórica com que os integrantes do governo se convenceram sobre a inviabilidade de revogar certas leis da natureza...

As reformas estruturais poderão ser facilitadas se os pontos básicos forem acertados no âmbito do novo Conselho Econômico e Social. Todos os brasileiros têm o dever de ajudar a isso acontecer.