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Publicado em O Estado de S. Paulo, 23/01/2007.

Salários dos parlamentares

Apesar da pequena produção de leis no período de 2005-2006, os deputados federais aprovaram para si mesmos (em 14/12/2006) um aumento de salários superior a 90%, elevando o teto para R$ 24.500.

O STF anulou o ato, mas o assunto continua em pauta e tem sido sutilmente usado como bandeira eleitoral na disputa à presidência da Câmara dos Deputados.

Com o aumento aprovado, os deputados brasileiros passariam a ganhar cerca de R$ 318.000 por ano, incluindo-se o 13o. salário, o que daria R$ 26.500 por mês, ou seja, aproximadamente US$ 12,400.

Os deputados e senadores dos Estados Unidos ganham cerca de US$ 13,750 por mês e não dá para comparar a economia brasileira com a americana. O PIB do Brasil está em torno de US$ 650 bilhões enquanto que o dos Estados Unidos ultrapassa os US$ 12 trilhões! Nosso nível de pobreza é infinitamente maior. A desigualdade social é brutal: 70% dos brasileiros ganham pouco mais de R$ 1.000 por mês.

A Constituição brasileira atribui aos parlamentares a tarefa de aumentar seus salários e estabelecer tetos. A Constituição americana também faz isso. Mas, entre 1789 e 1968 (179 anos), o Congresso aumentou os salários apenas 22 vezes, com base nesse critério. Depois disso, dois outros critérios foram introduzidos.

Em 1967, o Congresso estabeleceu uma Comissão de Salários para os Três Poderes que passou a fazer recomendações de aumentos com base (1) na inflação passada, (2) nos salários de mercado e (3) nos vencimentos dos demais servidores públicos. Tais recomendações eram encaminhadas ao Presidente dos Estados Unidos que, a partir de 1969, passou a enviá-las ao Congresso. Durante 20 anos, as sugestões do Presidente foram acatadas, com raras exceções.

Em 1989, o Congresso aprovou a "Lei da Ética do Setor Público", e o assunto foi atribuído a uma nova comissão – "Comissão de Cidadãos" -, que continuou usando os mesmos critérios e sistemática, mas com base em estudos mais rigorosos, fornecidos por técnicos do governo. O sistema funciona assim até hoje.

Para o ano de 2007, a recomendação do Presidente George W. Bush é de um aumento de 2%, sabendo-se que a inflação americana em 2006 foi cerca de 3,5%. No Brasil, para um IPCA de 3,14%, os deputados federais aprovaram um aumento superior a 90%.

Deliberadamente, estou excluindo desta análise os benefícios não salariais de que dispõem os parlamentares brasileiros para exercerem seus mandatos, mesmo porque, isso também ocorre (embora em menor escala) com os parlamentares americanos. A comparação é de salário contra salário e os disparates são escandalosos quando se leva em conta a fragilidade da economia brasileira em face da americana.

Não seria o caso dos candidatos à presidência da Câmara dos Deputados e do Senado Federal incluírem em suas "plataformas de campanha" algumas propostas de aperfeiçoamento do sistema atual? Salários de R$ 24.500 por mês são injustificáveis em um país pobre como o Brasil e em um órgão governamental cuja produção de leis tem sido baixíssima por vários motivos, dentre eles, o trabalho em atividades policialescas nos escândalos surgidos nos Três Poderes. Estas, para muitos, foram motivo de grande atração, tudo fazendo para apresentar o seu "heroísmo" em rede nacional de rádio e televisão.

Já que se fala em debate entre os três concorrentes à presidência da Câmara dos Deputados, como cidadão e pagador dos seus salários, gostaria que eles me respondessem às seguintes perguntas:

  1. Quanto do aumento aprovado pelos deputados tem a ver com a taxa de inflação dos últimos anos no Brasil?
  2. Em que medida esse aumento encontra correspondência no setor privado para profissões que exigem o conhecimento e o empenho requeridos dos paramentares?
  3. Até que ponto o aumento aprovado se ajusta aos aumentos do funcionalismo e à capacidade dos governos – União, Estados e Municípios-, que sofrerão vários impactos em cascata?
  4. Qual é a garantia que os parlamentares podem dar aos brasileiros de que um aumento de 90% redunde em um aumento de 90% em termos de análise e aprovação de projetos de lei, em especial, das reformas estruturais das quais o Brasil tanto precisa?

Acredito que você leitor também esteja interessado nas respectivas respostas.