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Publicado em O Estado de S. Paulo, 17/10/2006.

O emprego no debate eleitoral

No debate entre os presidenciáveis realizado no dia 8 de outubro de 2006, o Presidente Lula afirmou que, nos oito anos do Presidente Fernando Henrique Cardoso, o Brasil gerou a insignificância de 1 milhão de empregos contra 7 do seu mandato de 4 anos.

Não sei de onde saiu esse número. O IPEA, organismo de alta reputação técnico-cientifica acaba de publicar um extraordinário estudo onde se lê que os empregos criados no período de 1992 a 2004 - que engloba uma grande parte do mandato do governo anterior - somaram 17,5 milhões de novos postos de trabalho (IPEA, Brasil o estado de uma nação 2006, p. 327). O que pode explicar tamanha discrepância?

A resposta a essa questão é incômoda porque admite duas alternativas: falta de informações adequadas sobre o que ocorre no mercado de trabalho ou uso indevido de dados técnicos.

A taxa de desemprego continuou alta no mandato do Presidente Lula. Em janeiro de 2003, quando assumiu, o desemprego era de 11,2%. Hoje, é de 10,5%. São dados oficiais, coletados pelo do IBGE.

A informalidade geral (contando os que trabalham como empregados, empregadores e por conta própria) manteve-se no mesmo patamar ao longo de todo o mandato do Presidente Lula, sofrendo pequenas quedas esporádicas, mas ficando sempre acima de 50%.

O leve aumento do emprego formal verificado em 2005 teve grande relação à melhoria da fiscalização e, mesmo assim, perdeu força em 2006. O próprio Ministério do Trabalho e Emprego reconhece que cerca de 45% dos postos de trabalho formalizados em 2005 foram devidos à ação fiscalizatória.

Fiscalização é importante e deve ser exercida com todo rigor, mas, sozinha, é impotente para gerar os bons empregos que o Brasil precisa. Veja este dado. Cerca de 75% dos empregos formais surgidos em 2005 tinham remuneração inferior a 1,5 salário mínimo. Ou seja, forçado a regularizar a situação dos empregados, o empregador o faz pelo salário mais baixo possível.

Além disso, a rotatividade aumentou, o que sugere que muitos empregadores regularizaram a situação de seus empregados por força da fiscalização, mas os despediram em seguida, para voltar a contratá-los na informalidade.

Nesse campo não há milagres. Bons empregos depende de bons investimentos, boa educação e boa legislação. Nada disso mudou nos últimos anos, o que explica o marasmo do mercado de trabalho.

Os investimentos continuam abaixo de 20% do PIB. A escolarização média da força de trabalho continua baixa e em torno de seis anos de escola – e má escola. A legislação trabalhista – criada em 1943 – perdeu atualidade, deixando de se ajustar às novas formas de trabalhar.

Ou seja, os dados oficiais sobre emprego e salário (com exceção do mínimo) não sustentam o otimismo das autoridades do governo. O rigoroso trabalho do IPEA, acima citado, mostra que o crescimento do emprego tem sido tímido e que a informalidade tornou-se um problema estrutural no Brasil, uma espécie de doença crônica.

É claro que em tempos de eleição, o que domina é o vale-tudo nos programas de rádio e televisão, mesmo porque os votos são conquistados mais pelo caminho da emoção do que pela razão. Mas, há que se render um mínimo de respeito às estatísticas. Não se pode iludir o eleitor com manipulações de dados o tempo todo e em todos os veículos de comunicação.

Isso é propaganda enganosa que, aliás, deveria ser parte de um "Código de Defesa do Eleitor". Você já pensou nisso?

Vejo inúmeros dispositivos no Código de Defesa ao Consumidor que se encaixam sob medida para a proteção dos eleitores. Por exemplo, o Inciso III do art. 5º. prevê a criação de delegacias especializadas e PROCONs para proteger as pessoas contra vários tipos de infrações dos produtores, dentre elas, a propaganda enganosa. Onde está o PROCON do eleitor?

O próprio TSE poderia criar mecanismos segundo os quais, constatada a desinformação de um candidato, o seu tempo no rádio e televisão passaria automaticamente para seu adversário. Penso que isso reduziria bastante a prática da demagogia nas campanhas eleitorais.

Emprego é coisa séria, e não deveria ser usado para enganar o eleitor.