Artigos 

Publicado em O Estado de S. Paulo, 28/11/2006.

O medo das China

Os dados sobre produtividade física da industria de manufatura do Brasil não ficam nada a dever para os da China. Por exemplo, o Brasil produz mais de 30 veículos por trabalhador. A China produz 20.

É uma bela diferença a nosso favor. Mas, quando se leva em conta os custos, verifica-se que, para o mesmo dólar, a China produz muito mais veículos que o Brasil. Enquanto que o salário médio de um profissional qualificado nas montadoras chinesas é de US$ 2 por hora, o do Brasil é de US$ 10 (com encargos sociais). O gráfico abaixo apresenta a evolução da produtividade em termos econômicos ao longo do tempo e mostra que a diferença não pára de crescer.

Brasil-China: Produtividade do trabalho na indústria – 1990 = 100

Fonte: Maurício Mesquita Moreira, "Fear of China: Is there a future for manufacturing in Latin América"?, Buenos Aires: BID, 2006.

A terrível "boca de jacaré" do gráfico se abre cada vez mais não só porque a China continua com salários baixos (ou crescendo lentamente), mas também porque o país vem investindo pesadamente em educação e formação profissional, o melhora a produtividade física.

Mais. As grandes desigualdades salariais das várias regiões da China (muito maiores do que as do Brasil) representam um rico potencial para a migração de empresas para onde os custos são mais favoráveis. Para citar um caso extremo, a renda per capita de Shanghai é de US$ 5,600 enquanto que a de Gizhou é de US$ 435. Aliás, o oeste da China já recebeu inúmeras empresas que fugiram dos aumentos salariais do lado leste. Entre 1999 e 2003, o PIB daquela região cresceu quase 50%!

O fato da China receber capitais externos em um volume muito superior ao do Brasil implica na entrada em grande escala de novas tecnologias que, somadas à melhor educação, elevam os atuais padrões de produtividade para níveis muito altos.

Essas constatações fazem parte do artigo de Maurício Mesquita Moreira, citado na fonte do gráfico. Sua conclusão é pessimista, a menos que os países da América Latina passem a agir seriamente, mesmo porque a inércia será a certeza do seu fracasso.

Ninguém vai querer "asianizar" os salários e as condições de trabalho dos brasileiros. Mas, podemos muito bem reduzir as despesas de contratação sem reduzir salários, assim como aliviar o déficit público por meio de uma boa reforma da Previdência Social e diminuir a carga de impostos via um firme combate à informalidade e simplificação da estrutura tributária. Além disso, há aquele rol de medidas rotuladas de reformas estruturais e que todos conhecem.

É uma senhora agenda de trabalho – inescapável para uma sociedade que é parte da economia mundial.