Publicado em O Jornal da Tarde,26/04/1995
A povo quer as reformas?
De tanto que se fala em reformas da Constituição, é bem possível que o povo já tenha uma visão formada sobre o assunto. Qual é essa visão? O que o povo deseja?
Examinando os dados de uma pesquisa realizada pelo IBOPE, há cerca de dois anos, desanimei inicialmente ao verificar que quase 50% dos brasileiros jamais ouviram falar na reforma da previdência e 51% ignoravam por completo as reformas fiscal e tributária. Dentre os que disseram ter ouvido falar sobre tais assuntos, apenas 12% se consideravam bem informados.
O que determina um nível tão baixo de informação? Desinteresse? Certamente que não. A mesma pesquisa indicou que 85% dos brasileiros têm uma visão dramática e realista do seu próprio destino. Eles acham que os trabalhadores, ao se aposentarem, ficarão bem pior do que estão hoje - o que precisa mudar. Cerca de 72% acham que os brasileiros, em especial, os trabalhadores pagam muito imposto - e isso não pode continuar.
Ao indagar por que esses problemas não são resolvidos, para 54%, os maiores perturbadores são os governantes, inclusive parlamentares; 18%, atribuem a culpa aos empresários; e 11%, aos sindicatos - os demais não opinaram. Portanto, o povo parece ter uma boa intuição sobre a necessidade de mudar a situação atual e do porque não muda.
Entre essa intuição e a compreensão das reformas, poréais de 60 anos - 5 milhões de homens e 7 de mulheres. As mulheres vivem mais. Chegam perto dos 68 anos; os homens, 62. Os velhos estão pesando.
A velhice nem sempre é problema. Em muitos países, ela está se tornando uma solução. A cidade de Fort Collins, no Colorado (Estados Unidos) está recebendo legiões de migrantes velhos. Em 1994, cerca de 25% dos recém-chegados naquela cidade tinham mais de 55 anos e para ali eles mudaram para poder esquiar, jogar tenis, golf, e baralho além de fazer pic-nics e e dia-a-dia e revela uma razoável percepção sobre a necessidade das mudanças. O baixo nível de informação sobre as reformas decorre não da falta de interesse, mas da complexidade e tecnicalidades que envolvem esses assuntos e ainda de uma eficiente contra-informação dos conservadores.
Neste campo, é interessante observar que os baluartes do novo conservadorismo são os defensores das grandes mudanças no passado - Lula, Brizola, PT, PDT, PCB, PC do B, OAB, etc. Esses grupos não têm a menor inibição para defender, hoje em dia, a manutenção do "status quo" dos monopólios estatais, da estabilidade do funcionalismo, do sistema previdenciário, dos encargos sociais, etc. Mas, há que se reconhecer que isso é feito com inegável competência nos terrenos da pedagogia e das técnicas de mobilização.
Os que desejam mudar, ao contrário, têm se revelado jejunos nesses dois terrenos, desperdiçando um caldo de cultura bastante favorável em favor das reformas. Muitos reformistas parecem estar esperando por "alguma coisa..." ou por "algum despachante" que se encarregue de toda a chateação, cobrando uma taxa módica pelo seu trabalho... Isso é puro ilusionismo nos dias atuais. Ademais, qual seria o custo de sair quebrando a louça e partindo para a repressão?
Temos de lembrar que a liberdade é como a saúde. Nós só a valorizamos quando a perdemos. O regime democrático é um regime trabalhoso, demorado e imperfeito. Mas, é o menos pior. Os reformistas terão de agir da mesma forma que agem os conservadores tendo, a favor de si, uma grande vantagem: tudo indica que o povo, quando bem informado, se dispõe a aceitar as mudanças.
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