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Publicado em O Jornal da Tarde, 12/10/1994

FHC e Itamar, amanhã

Para quem o conhece como professor e parlamentar, a entrevista coletiva de Fernando Henrique Cardoso na semana passada não foi surpresa. Como de hábito, suas colocações foram densas, precisas e moderadas.

Decepcionei-me, porém com o tom exageradamente cauteloso no campo das reformas estruturais. FHC disse não acreditar na possibilidade de se aprovar tais reformas este ano, devido à falta de tempo e ao fato de não ser ainda o presidente da república, a quem cabe propor mudanças.

Penso que os dois óbices são perfeitamente superáveis. Quanto ao tempo, é preciso lembrar que o mandato dos atuais parlamentares vai até fevereiro de 1995. Temos assim quatro meses preciosos para finalizar os estudos já avançados e votar as reformas tributária, fiscal, previdenciária e trabalhista. O congresso sempre mostrou que, quando quer, vota qualquer coisa em 48 horas. Por isso, para realizar as reformas bastaria convocar os parlamentares em regime de urgência, cumprir rigorosamente os prazos regimentais e aprovar de uma vez por todas o que o Brasil precisa. Ao deixá-las para o próximo ano, muitas reformas (tributária, por exemplo) só entrarão em vigor em 1996 ou meados de 1995, se a Casa conseguir mudar o ano fiscal.

Quanto aos compreensíveis cuidados de Fernando Henrique em relação ao Presidente Itamar, convém mencionar que ele está numa situação excepcional: é Senador da República, arquiteto do Plano Real, ex-ministro da fazenda e "vendedor" do plano ao povo, à imprensa, aos parlamentares e ao próprio Presidente da República.

O CONGRESSO SEMPRE MOSTROU QUE QUANDO QUER, VOTA QUALQUER COISA EM 48 HORAS.

Convenhamos: neste momento, FHC e Itamar são grandes vitoriosos. Eles estão com a bola toda para propor e demandar do Congresso um trabalho intenso, rápido e sério para, com isso, ganharmos os 10 anos que perdemos na década passada.

Espero que esse tema polarize a conversa de amanhã entre os dois presidentes. Que Deus os ilumine nesse encontro histórico e os faça chegar a agendas convergentes que nos permitam chegar, com segurança, à estabilidade da moeda.

O professor Samuel Huntington, da Universidade de Harvard, que Fernando Henrique conhece tão bem, tem uma tese segundo a qual, nos países em desenvolvimento, é muito mais fácil realizar eleições do que reformar a economia. Seria pretencioso pretender derrubar a tese de Huntington. Mas os ingredientes disponíveis são tão favoráveis que colocam o Brasil a um passo de realizar eleições e consolidar a reforma econômica quase que simultaneamente.

é isso que poderá acontecer se o senador Fernando Henrique, da sua cadeira no Senado, liderar as discussões sobre as reformas do presidente Itamar. Para tanto, FHC teria de mudar, de mala e cuia, para o Congresso Nacional, para ali dar o seu exemplo e exigir dos parlamentares atuais – perdedores e reeleitos – um gesto de alto patriotismo: a aprovação das reformas para consolidar o Plano Real.

Um esforço desse tipo, é óbvio, transformar-se-ia num grande foco de atenção no País e no mundo. A imprensa seria fortemente mobilizada, abrindo espaços, microfones e câmeras, no plenário, para que o povo pudesse ver claramente quem é a favor e quem é contra o desenvolvimento do Brasil. Os candidatos do segundo turno, igualmente, teriam os palanques e a TV como oprtunidade de mostrar aos eleitores de que lado estão.

Tudo isso é mais fácil de ser feito no calor da vitória, quando os riscos de derrota são menores. A força de um presidente eleito em primeiro turno é enorme tornando-se gigantesca quando somada à de um presidente que sai com uma imagem esplendorosa. Afinal, Itamar devolveu ao povo a esperança de uma economia estável, deu-lhe a alegria do tetracampeonato e fez o seu sucessor.

A oportunidade é de ouro. Vai aqui o meu modesto recado para a conversa de amanhã. Prezados presidentes: Não percam tempo. Seus filhos e netos dependem de um Brasil dinâmico que pode sair de suas mãos. Como eles, milhões de brasileiros estão na mesma condição – e a maioria na pior. Não deixem passar o entusiasmo da vitória. Mantenham o pique. Ajam. Cada um no seu lugar, é claro, mas ajam!