Publicado em O Jornal da Tarde, 31/07/1994
Itamar e Tafarel
Tenho um amigo que acompanhou bem de perto a gestão de Itamar Franco como Prefeito de Juiz de Fora. Ele costumava definir aquele governo como pobre em idéias e rico em resultados. As medidas de Itamar Franco eram quase sempre improvisadas. Todos apostavam no seu fracasso. Mas o final era sempre feliz. Tudo dava certo. Itamar sempre se revelou como um homem de sorte.
Com a vitória da Copa do Mundo em 1994 ficou claro que o nosso Presidente era, realmente, um grande pé-quente. Quando começou o certame, ninguém acreditava na seleção. O Parreira montou um time para não perder - como Itamar organizou seu Ministério - enquanto toda a nação queria um time para ganhar. A seleção mostrou-se firme na defesa e tímida no ataque. E acabou chegando lá. Não há dúvida, foi o pé quente de Itamar...
A sorte do Presidente não se resume à Copa. Há pouco tempo as meninas do basquete haviam realizado um feito sensacional ao conquistar o título máximo num esporte em que o Brasil, ao contrário do futebol, nunca teve tanta tradição. Itamar teve a chance de ser o ofertante da Ordem do Mérito Esportivo. Brilhou a sua estrela - outra vez.
O destino reservou a Itamar Franco a tarefa de lançar um programa de estabilização econômica num fim de mandato. Jamais alguém de bom-senso imaginou ser possível uma façanha desse tipo no ocaso do poder. Mais ainda: nenhum economista de experiência acreditou ser viável negociar e implementar um plano dessa natureza num ano eleitoral.
Pois bem. Desafiando o bom-senso e a ciência econômica, Itamar arranjou um senador (Fernando Henrique Cardoso) para convencer o Congresso Nacional - e convenceu - e um embaixador (Rubens Ricupero) para administrar os conflitos da execução do plano - e está administrando. Tudo num fim de mandato e nas vésperas de eleições! Não há outra explicação: só pode ser a sorte de Itamar...
Essa lista poderia ser muito alongada. Nos quase dois anos de Itamar, o Brasil não teve graves enchentes. Ou grandes greves. Não teve nem mesmo uma boa marcha de donas de casa para reclamar da carestia.
Houve o caso do "massacre" de índios, é verdade. Mas, tudo se revelou uma grande farsa em poucos dias. Houve também a ameaça de rompimento entre Brasil e Argentina por causa do nosso salário mínimo mas o entrevero acabou em pizza. O próprio episódio Lilian Ramos (garota que apareceu sem calcinhas e foi fotografada ao lado de Itamar no palanque da Marques do Sapucaí, no Carnaval de 1994, levou muitos analistas a prever um novo impeachment mas, em pouco tempo, desapareceu do noticiário mostrando que o brasileiro preferiu levar a coisa de maneira jocosa. Ao ver as fotos da modelo, muitos disseram: que sorte é essa do Itamar...
Nessa lista, não pode faltar o fato de um vice-presidente de pouca expressão política virar, da noite para o dia, Presidente da maior nação do Hemisfério Sul, sem ter sido eleito para tal. Mais uma vez brilhou a estrela de Itamar Franco.
Não sou dos que acreditam em destino ou fatalidade. Nem daqueles que super-estimam o papel da sorte. Mas, diante da Copa do Mundo, do título do basquete, da ausência de catástrofes, do avanço do Plano Real, da insignificância do caso da modelo e da ascensão ocasional do nosso Presidente só me resta concordar com o meu amigo mineiro que avaliou Itamar Franco como o prefeito mais pé-quente que passou por Juiz de Fora - apesar de todas as suas trapalhadas. Governante é como goleiro. Precisa ter sorte. Tafarel - goleiro da seleção vencedora do tetra-campeonato e que defendeu bolas impossívels - que o diga.
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