Publicado em o O Estado de São Paulo, 21/07/2009.
Empregos de má qualidade
Os números do mercado de trabalho mostram uma estabilidade no emprego formal. De janeiro a maio de 2009, foram criados 180 mil empregos. Em 2008, no mesmo período, foram gerados 1.050 milhão de postos de trabalho.
A diferença é enorme. Para eliminá-la até dezembro de 2009, o Brasil terá de gerar cerca de 800 mil empregos formais. É possível que isso ocorra, mas, o mês de dezembro sempre mostra uma destruição de mais de 300 mil postos de trabalho. Se isso se repetir em 2009, o Brasil terá de gerar cerca de 1,1 milhão de empregos formais daqui até o fim do ano. É pouco provável. E, mesmo assim, estaremos apenas "zerando" os empregos perdidos. Ou seja, uma recuperação mais expressiva do mercado de trabalho deverá ocorrer só no próximo ano.
Será que em 2010 o emprego voltará ao nível em que estava em meados de 2008 quando as vagas eram abundantes e o que faltava eram empregados qualificados?
Tudo indica que não. Para se atingir aquele nível será necessário um tempo mais longo. É verdade que o programa de construção de um milhão de casas e a volta do crédito aos consumidores podem produzir um resultado relativamente rápido em termos de emprego. Mesmo assim será difícil retomar o nível de 2008. Por quê?
Durante a crise, as empresas foram forçadas a introduzir muitas medidas de economia que implicaram em contenção das admissões e até mesmo em demissões. É bem provável que, passada a crise, tais medidas continuem em vigor por vários meses, vindo a ser revogadas depois de um longo período. Por isso, a crise do emprego pode demorar mais tempo do que a crise da produção e das vendas.
Os dados do CAGED mostram ainda que os novos empregos criados em 2009 têm salários muito baixos. Entre janeiro e abril foram fechadas cerca de 221 mil empregos de salários entre 1,5 e 5 salários mínimos. Por sua vez, foram criadas cerca de 332 mil vagas de 0,5 a 1,5 salário mínimo.
Vários fatores explicam esse fenômeno.
1. A indústria, que tem uma elevada taxa de empregos formais de salários mais altos, continua com as contratações deprimidas (em maio de 2009 houve um saldo liquido de apenas 700 empregos industriais). Os empregos abertos na agricultura (52 mil), serviços (44 mil), construção civil (17 mil), comércio (14 mil) e produtos alimentícios (13 mil) são, por natureza, de salários mais baixos.
2. Com uma quantidade grande de pessoas que pretendem se empregar e a persistente escassez de vagas, as empresas estão encontrando facilidade para contratar trabalhadores com mais educação e menos remuneração (oferta e procura).
3. Nesse quadro, pesa ainda o peso das elevadas despesas de contratação (102,43% do salário nominal). Enquanto as empresas não sentirem firmeza na demanda, elas procurarão contratar funcionários com os menores salários possíveis, sobre os quais incidem as referidas despesas.
4. A fiscalização também explica uma parte do fenômeno. Pelos dados do Ministério do Trabalho, em 2007, o trabalho dos auditores fiscais foi responsável por cerca de 46% da formalização alcançada. Essa proporção vem aumentando desde 2003 quando a vigilância se tornou mais intensa. Em 2002 foram alcançados pela fiscalização cerca de 20 mil empregados em todo o Brasil. Em 2007, saltaram para 32 mil – quase o dobro (Anna Rosa Alux Simão, "Sistema de vigilância e fiscalização do trabalho no Brasil: efeitos na expansão do emprego formal no período de 1999-2007", Boletim de Conjuntura do IPEA, maio de 2009). Como funciona a sua ação?
A fiscalização costuma dar um prazo para as empresas regularizarem a situação dos empregados informais. Estas tendem a registrá-los pelo menor salário possível (salário mínimo) porque sobre ele incidirão os 102,43% de despesas. Eram empregos informais existentes que se tornaram formais e, portanto, "novos" nos registros do CAGED.
Isso ocorre com maior freqüência nas empresas de pequeno porte. A fiscalização é imperativa e necessária, mas tem o efeito inicial de induzir a formalização com salários baixos.
Em resumo, a contratação por salários mais baixos e qualificação mais alta decorre do mau comportamento do emprego indústria, do desequilíbrio entre oferta e procura de mão de obra, das elevadas despesas de contratação e do melhor desempenho da fiscalização do trabalho. Todos juntos, tais fatores deprimem os novos salários formais. |