Publicado no O Estado de S. Paulo, 30/09/2008.
Os empregos e a turbulência financeira
Se está difícil saber quem sobreviverá ao cataclisma financeiro, é muita ousadia querer antecipar os seus reflexos no mercado de trabalho. Ainda assim, ouso fazer algumas especulações.
Nos Estados Unidos, a crise já chegou na economia real. O crédito para as empresas secou. Os consumidores estão assustados. O mercado imobiliário parou. Em Michigan uma casa foi vendida por um dólar. O comércio de bens duráveis também despencou. O clima de negócios virou no avesso. Os projetos foram para o banho-maria. O desemprego bateu os 6,1% no mês de agosto e deve piorar em setembro.
Bem diferente é o quadro do Brasil onde ainda se ouvem os festejos dos 6% do PIB do primeiro semestre. Os grandes projetos prosseguem e o que falta é mão-de-obra. O desemprego caiu para 7,6%. A cada dia se descobrem novos tesouros no fundo do mar. Só para o petróleo, o país precisará de um exercito de trabalhadores. O mesmo vale para os bio-combustíveis, siderurgia, e infra-estrutura em geral. O emprego vive céus de brigadeiro. O país está gerando cerca de 2 milhões de postos de trabalho por ano.
O que dizer do futuro?
A visão pessimista concentra-se na falta de crédito para tocar a produção. De fato, os sinais atuais são preocupantes. Os financiamentos do exterior fecharam. O crédito interno vai pelo mesmo caminho. Os banqueiros sentaram no caixa à espera do desfecho da crise. O Ministro da Agricultura não esconde a sua aflição. O setor depende muito de financiamento. Há outros na mesma situação. Os juros que já eram altos, tornaram-se impraticáveis. Os varejistas já os repassam para os preços. Agravado pela taxa de cambio, o perigo de inflação aumentou.
As exportações em volume estão estagnadas. Está difícil obter-se um ACC (Antecipação de Contrato de Câmbio). O quadro futuro é preocupante quando se pensa que 50% das nossas vendas externas se destinam para países que se debatem com a recessão – Estados Unidos, União Européia e Japão. A outra metade vai para a América Latina, África e países do Oriente Médio que também dependem do mundo desenvolvido. A China sozinha não tem condições de eletrificar a economia mundial.
Não só o volume estagnou mas os preços das commodities caíram, agravando o déficit comercial. O clima de negócios mudou. Até o leilão de rodovias foi adiado. O dinheiro, então abundante, desapareceu. A incerteza leva todos a agir com frieza.
Se esse for o quadro para 2009, o mercado de trabalho será fortemente afetado com menos emprego e mais desemprego.
A visão otimista, porém, vê saídas honrosas. As recentes injeções de recursos governamentais no mercado financeiro e no BNDES vão restaurar o crédito, fazendo o dinheiro voltar a circular em toda a rede de bancos privados. As exportações de alimentos continuarão fortes, pois os povos têm de comer. As descobertas de gigantescas reservas de petróleo seduzirão os investidores que, depois de tamanha refrega, devem estar mais interessados em investir na produção do que em papéis envenenados. Finalmente, a ascensão das classes D e E ao mercado de consumo em decorrência da melhoria do emprego, da renda e dos programas sociais, garantirão um mercado doméstico aquecido, com muitos empregos. Ou seja, o Brasil tem uma bela margem de manobra, podendo sair – no médio prazo - como um dos ganhadores da grave crise.
Estou mais do lado otimista. O quadro do emprego é preocupante, sem dúvida, mas não é um doente desenganado. O Brasil deve ter uma leve retração em 2009, mas ficará bem aquém do que vai acontecer nas economias recessivas do mundo rico.
O meu otimismo, entretanto, supõe que o governo reverta a trajetoria de contratar gigantescas despesas futuras, contando com o mesmo vigor de crescimento do PIB e da arrecadação – o que pode não acontecer em 2009. Nunca foi tão urgente tapar os grandes ralos de dispendio como, por exemplo, a proposta que pretende eliminar o fator previdenciário. O mesmo pode ser dito em relação a outros ralos que exigem as benditas reformas tributária e trabalhista que poderiam ser trabalhadas em um ano não eleitoral, como 2009.
Em resumo, o Brasil tem enormes oportunidades para aproveitar a boa conjugação dos astros que se aproxima. Mas, para ganhar na loteria, é preciso comprar o bilhete. |