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Publicado em O Estado de S. Paulo, 28/08/2001

Exportar, empregar ou morrer

"Exportar ou morrer". "Exportar é o que importa". "Choque de exportação". "Tenho obsessão por exportar".

A depender de slogans, o Brasil está muito bem em matéria de exportação. Será que agora com o impactante grito de guerra o Presidente Fernando Henrique, o País conseguirá aumentar suas vendas externas?

Isso seria muito importante para o emprego. Nos países desenvolvidos, predominam as exportações que são intensivas em capital, enquanto que nos países em desenvolvimento predominam as que são intensivas em trabalho. Por isso, o potencial de emprego das exportações entre nós é bem mais alto do que nas nações altamente industrializadas. Há estimativas que chegam a antever a criação de 80 mil novos postos de trabalho para cada US$ 1 bilhão exportado.

Embora o Brasil venha crescendo na exportação de produtos intensivos em capital - como é o caso dos aviões da Embraer - a nossa pauta está ainda bastante concentrada nos setores que usam muita mão-de-obra (soja, calçados, suco de laranja, mobiliário, celulose, papel, gráfica, vestuário, autopeças, metalúrgicos em geral, etc.). É isso que torna o multiplicador de emprego maior do que as nações mais avançadas.

É claro que para exportar, o Brasil precisa importar. Mas, conduzidas com o devido cuidado, as importações não diminuem o emprego. Um estudo já clássico mostrou que a abertura da economia brasileira - apesar da forma tumultuada e indiscriminada como foi feita - mais contribuiu do que prejudicou o nível geral de emprego (Maurício Mesquita e Sheila Najberg, "Abertura comercial: criando ou exportando empregos?", BNDES, 1997).

Ademais, é importante notar que os efeitos da expansão das exportações no nível de emprego tendem a ser cumulativos e em cascata. Na medida em que o país vai vendendo para o exterior, vão sendo ampliadas as atividades de apoio às exportações, em especial no setores de comércio e serviços. Tais impactos produzem um grande efeito final sobre o nível de emprego, como ocorre, aliás, com a própria produção industrial.

Quando se examina o resultado do aumento de 1% na produção industrial sobre o emprego, num único mês, o efeito é muito pequeno (0,03%). Mas, ao longo do tempo, a história é outra - mesmo quando se considera a forte introdução de tecnologia nas indústrias modernas. Depois de 5 ou 6 anos, para cada 1% de crescimento do produto industrial há um aumento de 0,65% no emprego (Gustavo Gonzaga, "Determinação do emprego industrial no Brasil", CIET/SENAI, 1996).

Como cada país tende a exportar os fatores que têm em abundância e, no caso do Brasil um desses fatores é a mão-de-obra, os entraves às exportações têm conspirado seriamente contra a criação de empregos.

O Ministro Sérgio Amaral, pela larga experiência internacional que possui, conhece muito bem os constrangimentos existentes. Se, de um lado, ele reconheceu, na sua posse, o ajuste do câmbio e o alívio do PIS/COFINS como duas medidas estimuladoras, de outro, ele indicou o protecionismo externo, a anacrônica estrutura tributária interna e a precária infra-estrutura como importantes constrangimentos às nossas exportações.

Além disso, há inúmeros outros aprimoramentos que exigem a maior urgência para "o Brasil não morrer..." e dar um salto nas exportações e no emprego. Um deles diz respeito à capacitação das pequenas e médias empresas nesse campo. No Sudeste Asiático e na China, a participação dessas empresas no comércio internacional é enorme. Em média, elas respondem por 20% das exportações e, por serem de menor porte, tendem a ser trabalho intensivas, dando uma grande contribuição ao emprego. Na Coréia, elas respondem por 40% do total das exportações. No Brasil, são menos de 2% do total.

Para dar um salto nesse terreno e criar entre as pequenas e médias empresas uma cultura sadia de exportação contínua e não episódica, uma política industrial baseada em treinamento de empreendedores, qualificação de mão-de-obra e facilitação de crédito é absolutamente essencial. É uma tarefa para vários governos que poderia ser muito bem iniciada nos 16 meses que faltam para o término do mandato de Fernando Henrique Cardoso.

A luta contra o protecionismo externo tem de ser intensificada. Quando até os países-irmãos do Mercosul criam barreiras não tarifárias para os produtos brasileiros, não há como dispensar a ação do governo nesse tipo de problema.

No tempo imediato conspiram contra as exportações a falta de energia, os altos juros e a crise argentina. Mas isso haverá de ser resolvido. Uma cultura de exportação precisa ser construída independentemente das atribulações de curto prazo para, com ela, plantar-se com raízes fundas das árvores que vão sustentar o emprego de várias gerações.

O efeito multiplicador das exportações sobre o emprego é muito grande e não pode ser desprezado. Oxalá o Ministro Sérgio Amaral que diz ter uma verdadeira obsessão por exportar, consiga inaugurar uma política irreversível e que transforme o Brasil em um País sério no cumprimento de prazos, na qualidade dos produtos, na competitividade de preços e na luta contra os protecionismos de quem é liberal para fins externos e paroquiano para fins internos.